Poética - Quando Eros chorou

"O tempo é capaz de ceifar até mesmo a mais sublime das criaturas e o mais elevado dos sentimentos."

Por entre os becos do vazio, eu podia sentir o bater de asas sinuoso da pequena criatura alojada em meus anseios.

Teus movimentos eram como sátiras à minha independência

frágil e humana.

Já a tua flecha fulminava o meu coração e debilitava a minha alma (...)

Das chagas geradas por sua seta,

nasciam as rosas infecciosas do amor, cujo aroma insuportável da esperança penetrava os meus sentidos.

Eis que as pulsões humanas voltavam a eclipsar o

arguto ar da solidão.

Eis que a privacidade da alma

era-me roubada com o perdão de restaurar as asas que há muito me foram podadas.

"Na noite em que Eros chorou,

cupidos suicidavam-se ao injetarem

o amor nas veias do tempo.

Ponteiros colapsavam sob a overdose dos meus pensamentos

E a primavera das cicatrizes implodia por sobre os abismos deixados em minha alma."

O segredo químico rastejava

em minhas veias, e ao pungir-me, tu veria-me escorrer em uma acre fragrância incorpórea.

"- Ah, como na poética de Medusa,

eu poderia evitar aqueles olhos para fugir do meu próprio reflexo,

Mas esculpir-me em teus encantos, fazia-me serpentear em novas formas de mim."

Quando Eros chorou, o tempo, embora embriagado pelos devaneios do amor, já o enfraquecia com doses de realismo e reclusão forçada.

Do céu caiam arcanjos petrificados e plumas manchadas com o sangue da solidão.

No dia em que Eros se foi, teus ígneos resíduos já excediam a vida e impeliam-me a escrever as poesias mais desconexas da terra.

- Letícia Sales

Instagram literário: @hecate533

Letícia Sales
Enviado por Letícia Sales em 26/12/2021
Reeditado em 22/07/2023
Código do texto: T7415559
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