AMOR CARTESIANO

Deus sabe que eu não sou cartesiana, todavia, há quem diga que meu amor é cartesiano, que eu tenho um jeito cartesiano de amar. Eu digo que o amor real parece ser ideal em um mundo onde tudo acaba por ser tão banal. É verdade, há um tanto de idealidade no meu amar, por isso, talvez, mas só talvez, no amor eu haja de fracassar. Se for isso, que seja, mas eu ei de deixar alguns pensamentos e, em pensamento, é impossível eu errar, na prática? É provável que eu ei de falhar, talvez um gênio maligno venha me atrapalhar. Eu percorro o caminho e o vivo, eu não sou de meditar! Só costumo desconfiar de um amor que não seja tudo, de um amor que não seja absoluto, de um amor que não seja, porque o não-ser não cabe no amor. Os amores parciais parecem-me irreais, por vezes, estes não amores enganaram-me. Mas eu sei que o talvez não fundamenta o amar, só um lado é incapaz de o completar e metade do amar é um não-amar, um não-amor. Esqueça, eu não postulo um gênio maligno a nos enganar sobre o amor, sobre o que é amar, não preciso ir tão longe, aqui a observar, eu posso afirmar que o regime em que vivemos é uma escola do desamar, não sei, mas digo, que do amor este sistema ousou nos afastar. Contudo, eu não deixei, eu nunca deixei, de buscar para além das sombras que ele costuma projetar. Então, deste caminho o que eu posso afirmar? Eu sou uma coisa que ama a buscar outro ser que ama, um ser que eu ame, um ser que me ame. Sem vacilar, eu afirmo, a reciprocidade é o alicerce a levantar qualquer conceito de amor que se queira firmar. E na completude do buscar eu sei que irei experimentar o amor que nunca deixei de acreditar, o amor absoluto, que não sei onde está, mas no qual eu ouso confiar, porque, sem ele, não vale a pena o amar, sem ele, o amor é um sentimento vulgar. Eu sei que pode demorar, mas eu sigo meu percurso alvoroçado, sem método, eu me permito errar e viver as delícias que os desamores da vida podem me dar.