Travessia

Tive alguns momentos ruins, mas agora eles passaram. Não foram dias ruins - foram momentos.

Escrevi bastante em meu diário de bordo sobre o que estava sentindo e pensando e isso me ajudou. Mas agora não faz tanto sentido compartilhar os escritos.

Não que eu me envergonhe deles ou porque eles tenham deixado de fazer sentido. Mas simplesmente porque é como lembrar de uma noite de tempestade quando se está observando o mar sereno em um dia ensolarado enquanto o barco navega calmamente: parece perda de tempo.

A paisagem está boa demais e o céu está azul agora.

Durante a tempestade eu fiz o que tinha que fazer: segurei o leme com força e até machuquei os braços para não deixar o barco naufragar. Algumas velas ficaram rasgadas e a embarcação ficou danificada. Precisei gritar para mim mesma até ficar rouca: hora me dando ordens e hora me acalmando. Foi exaustivo.

Até que em algum momento a chuva acalmou. E depois pude finalmente, exausta, dormir. No dia seguinte, ainda encharcada e com as mãos cortadas contemplei o mar calmo e suspirei aliviada. Passou.

Eu sei que durante a minha travessia por essas águas irei me deparar com outros momentos em que o mar ficará tumultuado. Sei que acontecerão outras tempestades e provavelmente sairei com cortes, cicatrizes e machucados em algumas situações… mas acho que de tanto enfrentar partes sombrias do meu oceano, de colocar meu barco à prova e depois precisar consertá-lo com minhas próprias mãos calejadas já estou começando a entender como funciona a lógica de ser comandante e tripulação de mim mesma.

Entendo que sou meu próprio barco. E também tenho em mim o poder de controlar a força das águas que me atormentam, me ameaçam e me movem. Seja em noites escuras de tempestade ou em dias azuis e claros, eu tenho a força da água que me move.