MEA CULPA

Preciso confessar: matei um homem sem dar-lhe a mínima chance de se defender. Agora estou numa prisão cinco estrelas, um verdadeiro paraíso onde nada me falta. Aqui desfruto do avesso daquela tal liberdade que vocês tanto apregoam. Antes de decidir por este delito, esperei por anos a fio que aquele traste mudasse de ideia, porém o insólito sujeito queria que eu o matasse, pedia, implorava para que eu puxasse o gatilho. Então, como abomino os covardes, como não suporto tais tipinhos de gente, matei-o sem o mínimo receio de ser apenado. Agora, na plenitude da minha satisfação, é-me impossível saber se me arrependi. Sinto que mesmo se houvesse arrependimento, este seria duvidoso e ainda assim eu o mataria outras mil vezes. Matei um homem que na verdade nem era homem, era um não sei quê rastejante, qual um verme, indubitavelmente o menor de todos os vermes e eu odeio vermes na forma humana ou homens disfarçados de vermes. Não, ele não era homem, era um parasita, por isto não hesitei ao puxar o gatilho e dar cabo da sua mediocridade. No exato instante do tiro invadiu-me um indizível deleite, um inusitado entusiasmo, um prazer quente e viscoso, um bem-estar incomparável a qualquer outro, um júbilo que abriu-me num átimo as portas do paraíso. Confesso apenas por confessar, por mera formalidade, como satisfação pelo dever cumprido, pois nunca me exultei tanto por ter matado uma coisa. Só confesso para provar como sou destemido, como sou corajoso, e que não me detenho diante da covarde apatia de um ser que mereceria morrer mil vezes. Só mesmo estando cem por cento recompensado pelo crime cometido para ainda conseguir lhes falar depois deste ato fatídico. Talvez vocês jurados e juízes não entendam, mas isso não importa, pois alcancei o meu Destino. Eis porque inverti a posição da arma, encostei o cano na testa do sujeito e puxei o gatilho.