retalho de mulher

e então foi isso que me restou. tudo o que eu vejo agora é poesia. você teve a coragem de chegar bem perto de mim, de ver o que não devia e de ficar insanamente desajustado ao meu lado, de correr contra minha luz. pois é. e todo mundo vê agora essa porcaria que eu fiz, esparramada pelo chão que piso. todo mundo vê, entende? todo mundo espia pelos buracos das fechaduras alheias. todo mundo sente na pele. no pelo. ou no pêlo. você foi embora dizendo que me amava, que me adorava, que agora sabe quem sou. então me diz quem sou eu. me diz porque perambulo entre o querer e o não querer? ontem, antes de dormir, chorei pensando nisso tudo. no que fui incapaz de fazer, de perceber que me tragou pra tão longe. tão longe que só consigo pensar em oceanos de distância, em filmes, em livros, em histórias sem fim. em peixes grandes nadando e correndo de gente como eu, que só penso em alcançar o inalcançável. meu querido, eu cansei. quero uma cama muito quentinha para descansar meus ossos de moça largada, exaurida, ridiularizada, divina. e eu estou aqui, às sete horas dessa manhã no começo de uma semana de vida, antes do meu dia, diante de você. e ainda pergunto: quem sou eu? esse retalho de mulher...

Alice Salles
Enviado por Alice Salles em 23/11/2005
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