Janela do Ônibus

Embalado pelo trotar do ônibus

imaginei como seria bom revê-la,

segurá-la suavemente pelo rosto

e dançar o tango das coisas não ditas.

Me prostraria até que nossas faces

orbitassem o mesmo centro gravitacional

e, ao ouvir o tambor em nossos peitos,

suspiraria em seu ouvido: o tempo passou.

Agora, os postes da avenida noturna

são faróis que nos guiam à memória

de uma miragem bruxuleante, nada mais.

Seus lábios, que eu nunca beijei,

tornaram-se as luzes do semáforo

quebrado daquela esquina vazia.

Esquina de luzes ignoradas. Plena ignorância.

Talvez por medo de parar e perceber

que a estrada do passado dissolveu-se,

assim como nós. Assim como as manhãs

em que acolhi a alvorada sem recear o mundo,

pois o mundo acolhia sua beleza e isso já bastava.

Mas, hoje o mundo não mora em sua imagem.

Mudou-se para os aposentos da retina

com a qual encaro o banco vazio

e as mãos que afagam o inexistente.

Eduardo Becher
Enviado por Eduardo Becher em 11/08/2023
Código do texto: T7859448
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