para bordar a razão

Hoje me pus a desembaraçar meus novelos de linha. Troquei as tintas pelas linhas, acreditando que com essas, seria mais fácil a minha alma bagunçeira se entender. Bom, pelo menos já não há manchas pelo chão, pelas paredes, e (céus!) na roupa de todo mundo, mas como embaraçam(se) as linhas! e que trabalho dá separar o azul do amarelo, o verde musgo do verde-limão, o vermelho-sangue do vermelho-tinto, o vinho da água, o joio do trigo, pronto! me embaralhei toda...

Mas não perdi nenhum um dos novilhos, digo, nenhum novelo, com exceção de um furta-cor, isso porque pedi para alguém desembaraçar para mim, e a piedosa alma constatou que era melhor cortar o nó pela raiz, pois - dizia ela "que o que está feito está feito e não adianta chorar sobre o li(cor) derramado". Provei a ela que estava enganada, e que, com paciência, com muita paciência e fé (em si mesma, e na boa vontade da linhas, claro) era possível desatar os nós, encontrar a ponta, a ponte, e quem sabe até ler nas entrelinhas.

E enquanto desembaraçava as linhas, ia pensando nas muitas situações em que me vi toda embaraçada, enrolada, sem vislumbrar uma saída, volteando sobre o mesmo tema. Como na vida, alguns novelos foram bem mais fáceis de ajeitar, outros, pareciam mesmo fadados a virar um bolo de confusão. E havia aquele que já considerava perdido e adiei até o ultimo momento para tentar desembaralhar e que, no entanto, como num passe de mágica foi-se soltando todo na minha mão, e ficou tão bonito, tão cheio de cor.

Consegui, enfim. Depois de uma eternidade, consegui. Ei-los ali na caixeta, cuidadosamente arrumados lado a lado, um arco-íris sobre a mesa... Enrolados sim, como muitas coisas na vida, mas prontos para se transformar em um belo bordado nas mão de quem assim os quiser.

Agora só me resta descobrir como se borda a razão, se com os fios do pensamento ou com as linhas da mão.

Lia de Oliveira
Enviado por Lia de Oliveira em 24/12/2007
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