O novo

Existe, em mim, certa ansiedade pelo novo. Quem serei, aonde vou? Não sei mesmo. Há muita coisa que não sei. É assim desde o princípio. E tudo bem. Mas às vezes eu não me sinto a par do mundo, como se eu fosse uma peça solta e deslocada de onde deveria ter sido o seu lugar-de-ser-o-que-deve-ser. Vejo as pessoas passarem por mim, cada qual com um mundo inteiro dentro de si, sonhos incontáveis, substâncias intocáveis, e um modo de agir. Superanaliso as variações tonais e os gestos naturais, nada me diz muito mais do que minha incerteza inata. Conspiro contra mim mesmo toda vez que estou prestes a conquistar um novo horizonte. Bloqueio a visão e me condeno no caminho. Eu quero ir ao mesmo tempo que desejo permanecer imóvel, essa falha nossa. Impossível. A Terra gira e gira, o tempo desenrola o fio da vida, as cabeças repousam nos travesseiros, as verdades evaporam nos sonhos febris de cada ser humano. O que ser? Humano. Como? Problematizamos até mesmo o ato de respirar. Matamos uns aos outros, real ou metaforicamente, porque não queremos lidar com a diferença e, mais ainda, com a própria incapacidade de se permitir o novo. Patético.

Quanto ao meu futuro particular, tenho um quê de medo. O medo e o novo. O medo do novo. O medo do novo tornar-se o rotineiro e então, num piscar de olhos, o velho. Mas tenho de ser forte, eis a chave: ser forte apesar de tudo. É sobre mostrar os dentes mesmo quando a maré dos olhos está muito alta. Gostaria de ser melhor, verdade, escrever melhor, cantar melhor, desenhar melhor; o que me resta é o que eu tenho. É isto. São 22:27. É segunda-feira. O Natal bate à porta, mas não se pode recusá-lo. Nem o Ano Novo. Nem o novo que se apodera em mim. Não me controlo tanto, só respondo ao que me acontece. Tem sido assim desde que nasci.