Voz
"Quis morar no meu vazio - planeta distante da terra, fundo e repleto de mim, com a minha pessoalidade, meu silêncio, meu entardecer no cansaço dos pássaros.
- um lugar frio e acalentador, onde a minha existência tornou-se tudo o que existe e pela primeira vez nada me impediu de ser. "
O cordão umbilical entre eu e a terra foi cortado, então desconfinei-me das circunstâncias e flutuei nas possibilidades em meio a um choro frio de separação e liberdade.
Desde então não tenho irmandade com as coisas e a minha genealogia jaz extinta entre várias outras.
Para decifrarem os primórdios da minha origem teriam de escavar arquipélagos perdidos nos oceanos.
Teriam de ouvir o silêncio por longos dias até que a alma das coisas começasse a falar.
E ainda sim, sendo a sombra da vida vista a olho nu, não poderia ser enxergada, pois reflito o que os sentidos não alcançam.
Ah, o ponto azul fora de mim é grande o suficiente, mas prefiro quando nele não consigo caber.
Fora dele plagiei horizontes e forjei a compreensão para aqueles que jamais foram entendidos.
No espaço, todas as convicções flutuavam minúsculas, então vivi fora do tempo - turva, não-linear, sem idade e sem arrependimentos.
"A minha voz jazia costurada nas entranhas da minha alma e de mim nem um som podia ser emitido ao mundo.
Minha expressão engendrava-se num silêncio poético embalsamado em literatura
E na garganta do abismo perdi-me nos espaços que engoli ansiando me encontrar - mas nada me falava, nada me saia.
De vez em quando subia-me o hálito de quem fui em forma de epifania, mas em um rastro rouco logo se esmaecia."
- Letícia Sales
Perfil literário: @hecate533