morangos chineses *

nesta mesa, gelados, misturam-se odores diferentes. no centro, há desunião e incenso, mirra, alfazema, escorpião, canela, menta e aqueles morangos chineses. adoro morangos chineses.

lembram-me amoras. não leio mais o big brother. já vejo 1984 na rua. agride. atravesso as pontes do tejo, gaivota senil, só, assim. decadente. é um passe de mágica a rasgar o salão. dói o olhar, sim, dói, porra! quando fito a tal mesa e observo o meu escorpião na sopa: tem sal. entre

a glória e o prazer, uigui prazer, acompanho o vulto

da beata. na estrada entre os dois pólos da mesa, norte sem morangos.

e como eu adoro morangos. chineses. lembram-me a pensão,

o fazer as malas e partir, whisky e fado. lembram-me amoras. amoras, escorpião, canela, menta, ferrugem, sal

do mar, grosso céu. olha para mim a olhar para ti. tira

a cesta. leva os morangos. leva os morangos, que me fazem lembrar amoras. e eu adoro ver-te. comer a fruta desse tal pomar, silenciosa, no ponto cardeal. uma mesa sem centro (sem cardeal), morangos sem cesta, gelados. observo

bolachas e cerveja e whisky e revistas e donuts e leite

e mil frutas.

adoro ver-te comer morangos, lembras-me as amoras

que eu comia. quando vagueava pelo centro da mesa.

a olhar morangos

chineses.

aroma de amora.

no silêncio.

são marcos (novembro de 2000)

* musicado pelo professor rui de matos

Nuno Trinta de Sá
Enviado por Nuno Trinta de Sá em 28/12/2005
Código do texto: T91490