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Passei o dia em casa, não lendo, não ouvindo, não sendo. Só pensando neles, em como poderia ajudá-los. Tentei, mas a luz havia se apagado, num longo corredor tridimensional atrás de mim. Um deles lá de longe me acenava em gestos curtos, comedidos. O que via além? Não muito, tudo muito turvo. Mais tarde a paisagem urbana me furaria os olhos, numa segunda feira qualquer, em qualquer lugarejo de fim de mundo. Nos bastidores, meus personagens lutam para sobreviver mediante a escassez de argumento e diálogos. Eu sigo lutando com eles. Por mim e por eles, que andam roucos, sem voz quase, pedem alguns minutos de paz, alguma alegria além do simples fato de ser primavera e as flores estarem estourando tantas cores, em matizes várias. Eles não querem muito, nem precisa ser uma grande história, pode ser um enredo de uma vida simples, um proletário na luta pelo dia, um dia de cada vez. Ou apenas uma moça, que caiba dentro da esperança por um amor que não provoque rugas, um amor que seja leve,uma vez na vida essa ventura, um amor que seja leve, mas não tão leve que a deixe vazia para se preocupar só com esse amor. Pode ser o desejo de uma criança que só quer descobrir porque a barata precisa de tantas patas ou porque o sol não é verde como o mar, e as estrelas, caso fossem vermelhas, pareceriam o sangue do céu. E seria mais bonito. Só. Significados, é disso que os personagens perdidos precisam. Reivindicam seu direito de sonhar, de tentar mais uma vez, com chances ilimitadas de seu desejo dar certo, ou horizontes para simplesmente desejar. Desejar com tranquila e variadamente, uma gama de possibilidades. Só querem um pouco de céu, sorrir de novo, apenas aguardar o futuro com calma, com a calma que perderam em alguma estrada do caminho.

Jan Morais
Enviado por Jan Morais em 06/01/2006
Reeditado em 18/07/2006
Código do texto: T95183