Bote falso em mar comprido.

Certa vez, posto ao mundo,

quiseram-me andarilhar

por aí, de mar em mar,

de terra em terra.

Caso é que carimbaram-me,

mediram-me, examinaram-me,

calcularam-me, receberam-me

e quase, quase enviaram-me.

Preparei-me até, desavisado.

Os papéis cruzeirísticos,

fronteirísticos e academísticos

todos, revirados de revira-volta.

A caminho de vário caminho

botariam-me já certos corações.

Lamento-os e rio-os, inocentemente;

tenho deles o mesmo gelo na espinha.

E mandaram-me, quando cá fixei-me.

Viajaram-me nos mares mornos e frios,

gelados fora do caminho, ou em terra,

onde os fundiários plantaram língua.

Coisa de admirar-se e espantar-se essa,

que se fez em tão magistral passeata,

e que não pica-me no âmago um remoer,

um relembrar, escrever, querida memória.

Gozado, não há nostalgia nos cheiros,

cores, ruelinhas fininhas espremidas

entre casarotes velhos, varinas,

vinhedos de vinhas de vinho – que coisa!

Que não aplaudira-me a claque,

está correcto e muito do acertado.

A nau nem tocara o mar, que dirá,

pois, os ondolejos do famoso porto!

Vinicius de Andrade
Enviado por Vinicius de Andrade em 08/05/2012
Código do texto: T3656655
Copyright © 2012. Todos os direitos reservados.
Você não pode copiar, exibir, distribuir, executar, criar obras derivadas nem fazer uso comercial desta obra sem a devida permissão do autor.