Lágrimas de um fuzil

Desde pequeno ficava deslumbrado com exposições militares: meus olhos brilhavam ao ver tanques, caças, veículos blindados e equipamentos; o que me deixava entusiasmado para ingressar no serviço militar.

Contraditoriamente, estar numa guerra não me vinha à cabeça, e mesmo assim, nem imaginava como era estar num campo de batalha. O mundo vivia uma grande instabilidade política, porém notícias de guerras não chegavam ao meu conhecimento, algo de se esperar, pois eu tinha apenas 8 anos.

Três anos depois espalhava-se pelo mundo uma frase: "A Terra é azul", dita por Yuri Gagarin ao ter feito a órbita ao redor do planeta, e isso me fez olhar para o céu e querer chegar até ele, algo que me fazia duvidar, pois o exército não me levaria até lá.

Finalmente completados 18 anos, pude realizar meu sonho: o alistamento militar...a partir daí começava o pesadelo.

Passei meses em treinamento e fui mandado à guerra. Era então 16 de Março de 1970, a minha primeira experiência, que parecia ser a pior da minha vida: vi civis sendo execultados e eu sentado, assustado, jogado em algum lugar do Vietnã.

Como condenados lançados ao acaso, como peões kamikazes de um tabuleiro sangrento, meus companheiros e eu lutávamos por nossa "pátria que tanto nos amava" e pela nossa sobrevivência.

Dia após dia, projétil após projétil, crescia em mim uma vontade de sair daquele lugar, pois não suportava mais estar em acampamentos inseguros, rezando e chorando, correndo e matando; aquilo era como o hall do inferno.

Minhas mãos a cada dia que passava tornavam-se geladas, meus olhos estavam roxos e meu suor parecia com lágrimas, caídas em cima do meu fuzil; o som dos disparos soava como uma amarga e dolorosa sinfonia aos meus ouvidos.

Até que um dia, acordei diferente, sentindo algo que parecia me dizer que o fim estava próximo.

Em um conflito, entrincherado, senti um raio partir meu peito: o tiro me atravessou, eu caí no chão...olhava para o céu, surdo ao mundo exterior, concentrado nas nuvens e no infinito: o fim então chegava. Não sentia meu corpo, meus olhos fechavam-se e sentia apenas uma leveza, como se voasse...

O fim daquele sofrimento e aquele dia me fizeram lembrar o passado e tudo o que vivi até o momento: o exército, enfim, me levou ao céu.

Pablo Nunes
Enviado por Pablo Nunes em 16/12/2008
Código do texto: T1337694
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