OLHOS NEGROS

Essa noite tive um sonho estranho.

No meu sonho havia um homem que caminhava pelas estradas empoeiradas de seus domínios.

E, a certa altura interrompe seu caminhar

pois avistara ao longe um menino, sentado ao largo do caminho.

Habituado aos afagos permanentes de seus comandados,

o grande senhor indignou-se com a indiferença do menino

que distraido, dispensava toda sua atenção a uma ave minúscula

que trazia junto ao peito.

Calada, a ave aceitava os carinhos que recebia e aninhava-se procurando maior conforto e segurança.

Aproximou-se o homem de enorme estatura; que seus domínios lhe conferiam; e quando a sombra de sua presença projetou-se cobrindo a cabeça dos tais desavisados os seus olhares se encontraram.

Antes mesmo de qualquer palavra ser falada, o gigante sentiu o fogo da vaidade a lhe queimar as palpebras. Viu naqueles olhos a si próprio e nesse fulgor momentaneo sentiu toda a tristeza que trazia, lembrou-se quando ele era menino e seu coração repleto de sonhos e de emoção e uma voz rouca; quase calada; ecoou no peito de aço do grande senhor

-Esse menino sou eu! Quando foi que perdi a inocencia e o amor que trazia no coração?

Quieta a ave minúscula procurava em vão uma chama de paixão nos olhos destes que eram criança e criatura.

O amor se consumira com o tempo e quando o dia se encaminhava para o anoitecer, percebeu então, o grande homem , que havia sido derrotado pelos olhos negros de uma simples ave.

Derrotado em seus domínios, na sua estrada de pedras e pó.

Perdeu o folego, apeou de sua soberba assim que a réstia de luz da humildade a muito esquecida brilhou, enfraquecida diga-se mas brilhou revelando o embrutecimento de sua alma, a ganancia e a insensatez. Quis chorar e não chorou, as lagrimas a muito, muito tempo haviam secado.

O gigante, senhor de muitos domínios que nesta vida já abatera tantas

aves maiores, foi vencido pela menor delas, que queimou-lhe a alma escura e então abriu as asas e voou para longe daquelas cercanias onde a maldade era senhora e o perdão uma quimera.

Os olhos negros era o amor.