Algumas Palavras Sobre Um Parágrafo de Schopenhauer, e outras palavras ...

Uma grande biblioteca desordenada não é tão útil quanto uma pequena biblioteca e bem ordenada. Do mesmo modo, um homem pode possuir uma grande quantidade de conhecimento, mas se não o tiver trabalhado em sua mente por si, tem muito menos valor que uma quantidade muito menor que foi cuidadosamente considerada. Pois é somente quando um homem analisa aquilo que sabe em todos os aspectos, comparando uma verdade com outra, que se dá conta por completo de seu próprio conhecimento e adquire seu poder. Um homem só pode ponderar a respeito daquilo que sabe – portanto, deveria aprender algo; todavia, um homem só sabe aquilo sobre o que ponderou.

(Schopenhauer)

As pessoas lêem! Sim, ao contrário do que a maioria pensa, as pessoas lêem; e isto é bom. Mas as pessoas não sabem escolher o que ler. Não sabem o que querem da leitura em si. Lêem por ler; e isto é mau.

Maior valor se tem em ler um único bom livro a vida inteira a ler centenas de maus livros.

Quando adolescente, caiu em minhas mãos um texto de Schopenhauer “Do Pensar Por Si”. Texto este, aliás, do qual eu extraí a epígrafe deste emaranhado de letras mal traçadas. Eu estava devorando livros e mais livros sem nenhum critério.

O referido texto norteou-me de maneira tal, que, se tornou uma espécie de manual para mim. Schopenhauer ensinou-me a arte de não ler.

Todos sabem quem deve ser lido, mas preferem ler sobre eles a lê-los. Eu me refiro, por exemplo, as pessoas que adoram Nietzsche; falam de boca cheia sobre Nietzsche; e quando você pergunta que livros de Nietzsche leram, respondem, “Quando Nietzsche Chorou”. Quando muito, dizem ter folheado o “Zaratustra”.

Ao invés de lerem o próprio autor e tirarem suas conclusões, optam por comprar conclusões de outrem.

É como se um botânico para entender a fisiologia de uma árvore fosse estudar os fósseis da mesma incrustados numa rocha, ao invés de vê-la viva em todo seu esplendor numa floresta. Se pararmos para pensar isto é falta de inteligência e não comodismo.

Quando vou começar uma nova leitura eu me pergunto: o que eu quero deste livro? O autor vive para escrever ou escreve para viver? O assunto que ele aborda já foi percorrido o bastante por mim? Quais são as maiores autoridades no assunto? Será útil para mim? Estas perguntas já me salvaram de ler muita bobagem; de contaminar meu espírito. É isto mesmo! A má literatura envenena o espírito!

Tem muito lixo literário nas livrarias. Existem algumas formas para se saber se um autor deve ou não ser lido. “O autor vive da literatura, ou vive para literatura? “ Respondida esta pergunta já se elimina uma boa parte do lixo. Se eu pudesse dar alguns conselhos, eu diria, de maneira geral, para evitarem os best sellers, e darem preferência aos autores que durante anos ficaram fechados - os antigos. Eu disse “de maneira geral”, pois mesmo entre os best sellers alguns se salvam, e entre os antigos alguns devem permanecer fechados.

Muitas vezes acontece de você pensar sobre um assunto durante muito tempo, tirar resultantes até esgotar o tema; aí você abre um livro que trata do assunto e nele você encontra as mesmas conclusões que você tirou. Você poderia muito bem ter recorrido ao livro antes, já estava tudo lá, mas o prazer de você ter chegado por si mesmo é inigualável. E este conhecimento adquirido por esforço próprio torna-se parte integrante de você.

Por vezes, acontece de você percorrer uma questão ao máximo, esgotar todas as suas possibilidades, e não chegar a uma conclusão razoável. Aí cabe uma pergunta: é imprescindível que eu saiba isto? Se sim, é preciso adquirir novos elementos de raciocínio; é preciso ler.

Certa vez, eu estava com uma questão que não conseguia fechar. Pensava, pensava... e não chegava a nenhum lugar. Pensei, vou ler alguma coisa sobre o assunto; mas quem poderia me dar elementos para eu chegar a resposta? Neste caso decidi por Sartre. Abri “O Ser e O Nada”, fui ao índice e comecei a procurar alguma coisa que se relacionasse com minha questão. De repente lá estava “Fazer e Ter: a Posse”. Apenas a nomenclatura do tema já me deu os elementos e eu fechei a questão. Nem precisava ler o que dizia sobre, o li para ter mais elementos de raciocínio, mas não precisava. Compreende? Não é ler para obter respostas; é ler para obter elementos para se chegar as respostas. Mesmo por que existem perguntas, e são muitas, que nenhum livro responde.

Há um perigo em ler descriteriosamente. Sair lendo tudo que lhe cai às mãos lhe dará muitas peças de quebra cabeças diferentes; e você não conseguirá montar nenhum! E se insistir em tentar montar, poderá, facilmente, acabar babando num manicômio qualquer o resto da vida. Ou ainda, não tão drástico, mas igualmente triste, você poderá perder a possibilidade de vir a saber quem você realmente é. Em outras palavras, você poderá perder sua identidade, e acabar achando que você é aquilo que leu.

Se você é do tipo que só lê romances cor-de-rosa, fique tranqüilo, você não corre este risco. Mas saiba que, está enchendo de sujeira sua mente, esta sujeira com o tempo sedimentará e ficará difícil a limpeza. E se você um dia quiser se dedicar a algo mais profundo, esta sujeira o atrapalhará. Você tentará limpar e não conseguirá.

R Reinert
Enviado por R Reinert em 30/08/2010
Reeditado em 07/11/2010
Código do texto: T2469178
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