RAFAEL. UMA HISTORIA DE AMOR À MUSICA

Nasci um pouco mais de sessenta anos atrás no dia 24 de outubro de 1949 lá em Ponte Nova-Mg. Fui batizado como José Rafael Marcilio e como acontecia nos tempos antigos com alguns cidadãos brasileiros meu pai foi fazer o meu registro no cartório e lá disse que meu nome era José Marcilio Filho a assim fiquei registrado. Anos mais tarde quando fui me casar não o conseguiu porque tinha dois nomes, um no batistério e outro na Certidão de Nascimento e devido à grande dificuldade de resolver aquele pequeno grande problema só vim a realizá-lo alguns anos mais tarde. O trabalho na roça é bem pesado e fez com que meu pai ficasse bastante doente. Quando cresci um bocado por volta dos meus dez ou onze anos da idade resolveu vir com a tia na casa do irmão dela e meu tio que era ferroviário e morava no Carlos Prates numa grande casa alugada. Tinha umas criações lá na roça, um potro bom de sela, uma leitoa com três leitõezinhos bem criada na base da abóbora de porco e farelo. Um dos meus vizinhos era doido para adquirir aquele animal e quando eu, o pequeno Rafael disse que o venderia por trezentos cruzeiros nem pensou duas vezes. Vamos lá em casa que te dou o dinheiro – naquele tempo o dinheiro ficava em casa mesmo, não tinha nada de banco – montei num velho cavalo do meu pai e fui lá receber meu dinherinho até assim meio com dó pois gostava do potro mas precisava do dinheiro. Vendi a leitoa tambem por duzentos e cinquenta cruzeiros, dei cem cruzeiros para meu pai que nunca tinha visto tanto dinheiro, e fui na venda lá da cidade comprar roupa.

Comprei uma alpargatas roda daquela azul com o solado de corda de bacalhau, uma calça de brim coringa amarela e uma camisa verde pedi a benção pro meu pai e minha mãe, agarrei na sais da minha tia e viemos para Belo Horizonte. Aqui comecei andar por ali, fui aumentando a ditancia afinal tinha muita novidade pra ver. Eu estava na cidade grande e vinha beirando o Rio Arrudas até na Contorno, andava mais um pouquinho e vinha até no mercado e ficava por ali observando as coisas depois voltava para casa do tio Bento que era viuvo e tinha casado de novo. Tinha três filhos do primeiro casamento e mais sete do segundo e “levava a vida como Deus queria”. Quando a tia, uns vinte dias depois resolveu voltar para Ponte Nova pois já tinha feito seu tratamento na Santa Casa, o “nenem” que era meu apelido não quis voltar, embora o tio preocupado com o irmão doente lá na roça, “quisesse que eu fosse pra cuidar do meu pai, mas eu com um bom dinherinho ainda na capanguinha enfiada perto da virilha não quis voltar pois ia trabalhar, ganhar dinheiro pra quem sabe trazer o pai pra cidade, aqui era mais fácil porque tinha os médicos perto”.

Assim um vizinho que carregava verdura no mercado com seu carrinho - abrimos aqui um parênteses já que um tal de Tenente Garcia fabricava carrinhos de mão, numerava e alugava. Vemos ai o capitalista atuando e já explorando os menos favorecidos - Esse vizinho se dirigiu a ele dizendo: ô menino, o que você está fazendo?

Nada, eu disse.

Quer me ajudar a empurrar o carrinho, depois te dou uns trocados.

Vou sim.

Fui lá tirei a “precata” avisei pro tio e fui descalço mesmo ajudar o moço. E assim comecei a ganhar o meu dinherinho. Levantava cedo ia pro Mercado Velho e empurrava o carrinho até lá na Feira dos Produtores que era em frente a rodoviária.

Meu dinherinho sempre bem dobradinho numa bolsinha e guardado no lugar seguro de sempre, bem pertinho da minha virilha; meu tio sempre falando pra mim ir embora pra cuidar do pai, “eu acho que é porque ele já tinha muitos filhos e eu era uma boca a mais” mas eu insistia em ficar por aqui mesmo.

Percebi que já estava bem grande e mais forte e dava conta de puxar o carinho agora já estava com meus quinze pra dezesseis anos empurrava o carrinho de dia e aluguei um para transportar verdura e legumes a noite e da mesma forma pagava alguém que ajudava a empurrar. Todo mês colocava dinheiro num envelope de carta com umas palavrinhas para o meu pai, dizendo que “estava tudo bem comigo, que ele não precisava preocupar” e assim sempre mandava um bom dinherinho pra o eles lá na roça. “De vez em quando estava cansado demais para ir pra casa, encostava o carrinho debaixo de uma marquise ali na região da Praça da Estação Ferroviária, perto do famoso Café Palhares que ficava exatamente na esquina da Av. Amazonas e Rua da Bahia e por ali dormia dentro do carrinho com meu dinheirinho bem guardado no lugar de sempre e nunca aconteceu nada de ruim comigo”.

Um dia fui no armazém do Grilo fiz uma boa compra, comprei muita carne chamei um taxi e levei até na casa do meu tio. Eu nunca tinha dado nada pra ele que nem queria aceitar dizendo que eu devia levar aquilo era pro meu pai, mas acabou bem gostando e comemos muita carne por aqueles dias. Eu fiquei por ali mais uns tempos e continuei trabalhando no mercado. Por essa época trabalhei também

como ajudante de padeiro; fui aprendendo a profissão, me tornei um bom padeiro e confeiteiro, mas exerci por pouco tempo essa profissão. Fui para Juatuba trabalhei numa horta por uns tempos já que fábrica da Cervejaria Brahma começou a ser erguida ali porque compraram aquele terreno e como estava por ali fiz amizade com o mestre de obras e comecei a trabalhar então de ajudante na empreiteira Hofermann Busvortt responsável pela obra. Da construtora passei a trabalhar na fabrica depois saí e abri um pequeno comércio e nesta época conheci minha hoje esposa e quando eu fiz “dezenove anos nos casamos” e comprei uma casinha na região do Bairro Vista Alegre. Trouxe meus pais para a cidade e a esposa ainda novinha me ajudou a cuidar deles por uns dez anos, ate que morreram primeiro ele que sofreu um derrame depois ela. Durante esse tempo eu comecei a trabalhar num sitio em Igarapé e ficava a semana lá trabalhando e no fim de semana os donos do sitio que moravam na cidade iam pra lá e eu vinha pra casa. Só tinha três viagens da única jardineira que fazia linha para aqueles lados, uma de manhã, outra meio dia e outra a tarde e a gente andava mais a pé que de condução mas fazia tudo que precisava. Pra ir em Belo Horizonte era mais fácil porque tinha o subúrbio que saia aqui de Betim, tinha tambem o onibus mesmo que poucos horários, mas aqui mais para os lados de Igarapé era mais difícil. Vendi meu terreninho lá e comprei um aqui no Bairro Cachoeira, tinha já comprado um cavalo e uma carroça , mas depois aprendi a construir carroças de peça em peça. Eu ia olhando a carroça que tinha e com habilidade fui copiando ate montar minha primeira carroça daí por diante construía e vendia minhas próprias carroças.. Mas continuei trabalhando depois como ajudante nas obras da Fiat Automóveis mas sempre que tinha um tempo livre fazia uns carretinhos com minha carroça, carregando material de construção, mudanças, tudo que me fosse possível transportar. Comecei trabalhar na Construtora Mascarenhas Barbosa também mas fiquei por lá um ano só por ai, não me lembro bem, porque machuquei e fui pro seguro onde fiquei mais de mês, quando voltei me mandaram embora. Ai vendi a casinha lá no Cacheira e comprei essa aqui que já a uns vinte anos moro e onde criei meus sete filhos.

É interessante abrir aqui um parênteses. Gosto muito do meu cantinho que pode ser um rancho na beira do rio que passa nos fundos, onde sento e vou riscar os dedos no meu acordeon e tocar as velhas musicas de meu tempo de criança. Meu rancho está protegido por um arrimo de cimento muito denso já que neste local nos anos cinquenta existia uma metalúrgica que construiu esse paredão na beira do Rio Betim que ainda hoje fornece água para resfriamento de material na Metalsider, metalúrgica vizinha com seus barulhos dia e noite. Assim minha casa ficou protegida dos tradicionais assoreamentos que colocam muitas residências em risco, inclusive uma casa que tinha abaixo da minha, o barranco se moveu e ela caiu embora sem vitimas fatais. Tem uma bela cachoeira que era um lugar de lazer para os turistas e moradores da cidade que com o crescimento e o chamado progresso, que trouxe novos moradores para Betim e consequentemente o esgoto que hoje deixa i rio com cheiros que fica impossível comparar com algum bom ou agradável ao nariz. Posso tambem dizer que tenho uma casa no meio da estrada, onde está previsto a abertura de uma grande avenida de duas pistas que irá ocupar todos os terrenos vizinhos e teremos aqui a continuidade da ligação entre a Via Expressa e a Rodovia 262.

Onde esta construída a minha casa a Rua rio Doce é afunilada passando apenas um carro em qualquer sentido e mesmo assim o transito em nossa região é bem pesado com caminhões de grande porte que aqui transitam transportando areia, argila, tijolos e caminhões que transportam minério de ferro para a metalúrgica e usam esta passagem como atalho quando vazios para a citada rodovia.

Hoje eu tenho uma mula que tem 17 anos de vida e me acompanha a 14 anos. Uma vez minha mula enfiou a pata numa grelha do rede ferroviária – ralo para escoamento da água de chuva – que lhe causou uma grande ferida perto do joelho que durou um ano e seis meses para cicatrizar e mesmo assim ela heroicamente continuou a puxar a carroça cumprindo uma jornada de trabalho um pouco menor, mesmo com a ferida, que eu, como um médico veterinário cuidei, protegi das moscas e outras bactérias e finalmente a cicatrização ficou perfeita.

Como é possível produzir um animal grande e forte como um cavalo e, ao mesmo tempo, resistente, trabalhador e dócil como um asno? A resposta é cruzar o jumento com a égua para obter um híbrido (animal que se origina do cruzamento de espécies diferentes). Os produtos dessa hibridação são conhecidos vulgarmente pelos nomes de burro, mulo e mula. A prole, que herda o tamanho e a constituição da mãe, é mais parecida com o cavalo do que com o asno. Cruzando uma jumenta com um cavalo obtém-se o bardoto. Este é mais difícil de criar e tem a desvantagem de ser menor e de herdar o temperamento birrento da mãe. Além da força, a mula tem uma capacidade de equíbrio admirável, que lhe possibilita andar pelos caminhos mais íngremes. Ela freqüentemente aparece como heroína nos filmes de carga na Europa e nas Américas, principalmente nos campos de cana e algodão e nas minas.

O burro não consegue produzir espermatozóides por isso é estéril. A mula também é estéril porque não pode produzir óvulos. Outra explicação é que tanto o macho quanto a fêmea não têm os órgãos genitais bem desenvolvidos, o que dificulta o acasalamento. Estas são informações que tiramos na internet para que todos possam conhecer melhor esse bravo animal que puxa nossas carroças. Aqui vão mais algumas informações:

Nome cientifico

FILO: Chordata

CLASSE: Mammalia

ORDEM: Perissodactyla

FAMÍLIA: Equidae

Características:

Comprimento: cerca de 2,70m

Altura: 1, 70m

Peso: até 400 kg

Tempo de vida: 40 anos

(saudeanimal.com.br/burro.htm)

Em trinta anos de profissão este não foi meu único animal. Um outro cavalo que me foi roubado, representa a perda do meu mais importante instrumento de trabalho. A procura do animal foi longa mas sem sucesso. Um amigo que eu nem esperava que tivesse tanta confiança em mim me vendeu um cavalo porque viu minha dificuldade sem um animal para trabalhar. Fui pagando aos poucos tirando do trabalho e do suor até o ultimo centavo. Algum tempo depois me roubaram a carroça e felizmente apenas fui conseguindo o material e construi outra o que ficou muito mais barato que comprar uma nova. Hoje eu deixo a carroça trancada com cadeado e corrente para evitar que outro passe pela tentação de me roubar de novo..

Tenho muitos amigos e conhecidos. Todos que passam me cumprimentam e sempre meus velhos clientes marcam um dia da semana para eu ver algum serviço de desaterro e fazer um orçamento já que o entulho será retirado por mim.

O primeiro ponto dos carroceiros era na esquina da Rua Pará de Minas com Governador Valadares e este local onde se encontra o Ceabe hoje era um brejo com muitas minas d’água e do outro lado do rio onde é hoje a Igreja de São Francisco foi o Matadouro Municipal que ocupava um lado e outro do rio e vinha até a Estação Ferroviária onde sempre existiu a tradicional Cooperativa Agropecuária de Betim que possui um armazém de suprimentos em geral para atender ao publico agropecuário e associados.

No dia 3 de março de 1980 quando o então Prefeito Osvaldo Franco construiu e inaugurou o Ceabe – Centro de Abastecimento de Betim os comerciantes saíram do velho mercado que era onde hoje se ergue a Farmacia e a agencia da Receita Federal na Alameda Maria Turíbia quando tambem o ponto dos carroceiros foi também transferido para a beira do rio onde a Administração Municipal construiu uma cobertura de amianto oferecendo algum conforto a nós onde ficávamos todos os dias a espera de seus clientes. Mais tarde na administração da Maria do Carmo ganhamos um telefone que foi afixado numa parede lateral do Ceabe e hoje embora sem o aparelho telefônico já a muitos anos desativado e nada preservada ainda se encontra fixada no mesmo local e ainda tem colado alguns panfletos e pus aqui umas fotos onde podemos ver e confirmar, com os seguintes dizeres:

PONTO DOS CARROCEIROS

Fretes diversos em carroças com preços populares. Material de construção, pequenas mudanças e outros. Tel. 531-3744

As recordações continuam e começo a lembrar os nomes dos carroceiros que faziam parte desse primeiro grupo que utilizava o ponto do Ceabe. Domingo, Dominguinho, Zé Padre, Ze Raimundo que faleceu recentemente, Joaquim, Dé e Miguel Baiano. O que afasta os carroceiros do trabalho geralmente é o AVC já que o trabalho de prevenção no serviço publico de saúde é muito recente e estes homens fora do lar não buscam um posto medico para cuidar quando sentem algum mal estar, preferindo utilizar os costumes dos antigos tomando chás e outras formas culturais e tradicionais mineiras.

Nossa cidade foi construída e a maior parte do material transportado pelas carroça. A olaria ficava onde hoje é o Shopping Betim e assim nós carroceiros levávamos tijolos e telhas ate os imóveis onde um caminhão não passava ou em tempo de chuva no barro, pelas ruas que ainda não eram nem mesmo calçadas. Em minha carroça tinha uma placa com os seguintes dizeres: “sou carroceiro e respeito a lei. Porque você não me respeita?”.

Uma coisa que aconteceu sempre no período eleitoral é a procura dos candidatos para que o carroceiro veicule sua propaganda eleitoral nas carroças, já que estão bem próximos do eleitor. Na ultima eleição aconteceu uma “carroceata” onde uns oitenta carroceiros participaram, levando o nome de um candidato a prefeito na cidade mas após serem eleitos não ajudam em nada aos carroceiros e pelo contrario ficam criando leis para prejudicar a classe.

Gosto de afirmar sempre que com minha carroça já criei sete filhos que hoje me deram 25 netos. Dois de meus filhos morreram um com um ano e oito meses que era portador da sindrome de Dawn e uma filha que foi assassinada com dezessete anos.

Com a realização da canalização do rio e extensão da Av. Bias Fortes foram os carroceiros mais uma vez desabrigados e a prefeitura decidiu usar uma parte do terreno onde se localiza a Arca – Associação de Reintegração da Criança e do Adolescente que tem como objetivo principal entre outros diversas oficinas lúdico-culturais (Arte, Construção de Brinquedos, Esporte, Hip Hop, Kung Fu, Capoeira, Violão, Oficina do Saber , Teatro e Circo) com o objetivo de contribuir para o desenvolvimento de crianças e adolescentes, de 7 a 18 anos, nos âmbitos físico, intelectual e emocional. Utilizando um pequeno espaço de frente para a nova avenida foi erguida uma coberta oferecendo um bom conforto aos carroceiros, entretanto moradores de rua e usuários de droga começaram a utilizar o espaço a noite e ali faziam suas necessidades tornando as vezes impossível utilizar o espaço e assim além de estarmos distantes de nossos clientes e com esse impasse de difícil solução decidimos devolver e deixar de utilizar aquele local - hoje cercado – passando a utilizar o ponto atual nos fundos do Ceabe onde era o antigo ponto embora a proteção do sol seja apenas através das árvores lá existentes.

Estamos bem organizados e possuímos um sindicato onde existe um espaço e caçambas para levarmos para lá os entulhos que retiramos das residências mas s exige um grande deslocamento e sacrifício do animal, e nada compensador embora tenha um bom objetivo que é contribuir para a reciclagem do material ms precisamos de outros locais que irão ser utilizados de acordo com a região onde estivermos tirando o respectivo material.

Hoje as caçambas tem tirado parte do ganha pão dos carroceiros pois pelo valor de R$ 80,00 deixam a caçamba três dias no imóvel para retirada do entulho que é grande se bem acondicionado, entretanto quando a quantidade é menor o carroceiro é solicitado.

Para tornar conhecido o meu negocio e ampliar o campo de trabalho, eu utilizo um cartão de visitas que coloco na caixa de correio ou entrego ao pedreiro em alguma obra oferecendo o meu serviço, e acompanhando a tecnologia tenho o meu telefone celular cujo numero encontra-se impresso no referido cartão.

Um fato bem importante tambem é a alimentação da mula, e com muito cuidado busco todos os dias o capim que é utilizado para a alimentação da mesma, conhecido como capim anapinhe nome comum da graminea cuja pesquisa feita na Internet traz o seguinte resultado.

Capim agulha (Brachiaria humidícola) - Das brachiarias, talvez a mais consumida pelos equinos é o capim agulha, pois este possui maior palatabilidade para os equinos, Tem hábito de crescimento prostrado; é uma planta rizomatosa, que cobre totalmente o solo quando adulta, protegendo-o da erosão com bastante sucesso. É resistente ao pisoteio e aparentemente pouco atacada pelas "cigarrinhas das pastagens". O desenvolvimento da Brachiaria Humidícola, inicialmente lento, em aproximadamente um ano dará cobertura total ao terreno.

Aqui o Rafael esta ao lado da caixa onde foi colocado o telefone para utilização dos carroceiros que utilizavam este ponto do Ceabe realizado na administração da Prefeita Maria do Carmo Lara Perpetuo.

Sente saudades deste tempo já que a administração municipal se importava com esta classe trabalhadora e pela primeira vez o chefe do executivo como agradecimento pelo apoio deles no período pre eleitoral lhes deu o retorno através de um telefone publico e muitos entre nós ainda somos gratos à prefeita por este pequeno ato. Também afirma que a utilização das carroças era bem maior nesta época de ouro, mas ainda hoje dificilmente vai para casa, apesar de muito cansado sem um bocado de dinheiro no bolso e assim o leite, o pão, uma boa verdurinha e um pedacinho de carne nunca falta em sua mesa para a alegria das crianças isto sem contar que os donos de sacolões nos oferece parte da mercadoria que vai para fazendas e que se encontram em perfeitas condições de uso embora impróprias para comercialização.

A VIDA SOCIAL

Um detalhe interessante é que utilizo a carroça tambem em meu momento social quando saio para passear com a esposa ou meus netos para visitar os filhos e outros familiares em locais não muito distantes, entretanto não gosto muito de faze-lo porque estou tirando tempo do descanso do meu animal. E tem também o velho acordeon que me acompanha a muitos anos e ajuda a escrever a minha historia. A musica veio do berço. Minha familia era composta de muitos tocadores principalmente sanfoneiros, e eu acompanhava meu pai e meus tios pelas estradas empoeiradas na maioria das vezes no lombo do cavalo, para realizar as festas de casamento e os festejos das quadrilhas de São João e São Pedro onde o povo participava alegremente dos arrasta-pés e “haja poeira pra levantar”. Meu primeiro instrumento na verdade foi um cavaquinho e com ele já acompanhava o meu pai nestas festanças participando com ritmo, auxiliando e participando da alegria causada pela musica nos fins de semana na roça. Já em Belo Horizonte e já “de maior” comprei um violão e junto com meus velhos companheiros fazia minhas serestas pelas noites mineiras. Alem disso na casa do Tio Bento tinha uma sanfoninha e embora meio acanhado com medo de estragar o instrumento que não era meu, fui acostumando a tirar um sonzinho nos dias de folga. Depois comprei meu próprio acordeon e aí não me comparando com os grandes sanfoneiros que tem por esse Brasil afora, mas sempre estive presente onde se precisasse de um bom sanfoneiro. Cheguei a prestar serviço na Casa da Cultura de Betim, quando tinha umas apresentações festivas da cidade e vinham convidados de fora. Eu era responsável por abrir os festejos e recebia uma cota financeira por isso. Hoje faço apresentações pela cidade e gosto de tocar na Apromiv – Associação de Proteção à Maternidade Infância e Velhice, que oferece aos “jovens” da terceira idade um bom forró onde eles se divertem para valer e aí, como a musica está incrustada em meu coração, nem me importo se estou recebendo ou não, pois só a alegria de ver aqueles velhos dançando e farreando, pedindo musicas e agradecendo por eu tocar meu acordeon paga o prazer de estar ali”. Alem disso junto com o meu vizinho que tem um bom equipamento de som, um teclado que faz o acompanhamento do instrumental e a camioneta para transportar facilitando a ida e a volta para o lar, fazemos casamentos, aniversários e forrós por toda a região incluindo Esmeraldas, Juatuba, Mateus Leme, Pará de Minas, Mário Campos, Bom Jardim local este que tem um tradicional forró e sinceramente quando em algum fim de semana não tem uma apresentação para fazer, fica faltando alguma coisa e as vezes ate inventamos um ensaio só para não ficar sem tocar. Participo sempre de uma roda de viola que acontece as quinta feiras na Casa da Cultura Josephina Bento em Betim e demonstro que realmente os diferentes são diversos e que a diversidade cultural transforma o mais rude dos seres humanos no mais doce e ágil tocador de seu instrumento. Desde jovem sempre toquei um instrumento mas faço isto com tanto prazer que nem me lembra às vezes que tocar a minha sanfoninha nos forrós por ai tambem fazem parte da minha existência e contribuem para minha alegria e felicidade. E tanto quanto sou conhecido como o carroceiro sou tambem conhecido e requisitado para shows como sanfoneiro.

É interessante registrar que numa roda de viola o espaço para a sanfona é pequeno pois os ponteados são feitos apenas com as cordas, mas junto com os violeiros dentre os quais destaco o Lázaro Mariano que é responsável e realizador de grandes encontros de viola na região de Betim por intermédio da Funarbe – Fundação de Arte de Betim me descobriu e meu talento musical participamos juntos das atividades populares na Casa da Cultura Josephina Bento e agora em todos os encontros tenho o meu lugar reservado onde vemos a sabedoria em agregar numa cultura pre concebida o diferente quebrando os paradigmas. Naquele grupo cada um tem o seu momento distinto e juntos todos contribuimos para a valorização da musica regional não permitindo que se percam as raízes da musica tradicional mineira. Vejo-me como parte da diversidade, um diferente na via urbana com minha mula, minha carroça, minha disposição e coragem para trabalhar sou tambem contado entre os músicos que fazem parte da tradição das raízes musicais da cidade. Fico triste com alguns políticos da cidade que exploram em momentos específicos o nosso talento como musico e muitas vezes já fiz isto sem nada em troca e às vezes nem me reconhecem quando estou fantasiado de trabalhador e a gente se encontra pelas ruas da cidade.

Foi muito bom esta oportunidade de recordar estes momentos tão especiais que vivi nestes meus anos de vida e saber que sou parte da historia de Betim uma cidade tão conhecida no Brasil e por que não dizer no mundo já que aqui temos a montadora da Fiat. Hoje os veículos atuais não se comparam aos do inicio dos tempos, na fundação do Arraial de Capela Nova onde tudo era feito no lombo do burro, os caminhões eram os Ford Bigode, os Chevrolet Brasil e sem as ruas asfaltadas ocupávamos com cortesia os mesmos espaços. Hoje pensar em estar na Av. Amazonas no horário de movimento me dá tristeza por que não existe mais aquela velha paz dos tempos antigos.

RAFAEL

MAIO 2011

ederbrasil
Enviado por ederbrasil em 27/08/2011
Reeditado em 30/04/2012
Código do texto: T3185634
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