Uma tragédia contemporânea

Natal: Uma tragédia contemporânea

Um casal conversa sob o luar dos enamorados, num beco, bandidos , jovens, fervorosos de amor, borbulhante, de todos os encantos, do medo, da tensão, do calor dos corpos, tudo misturado, e por outro lado, algo dialoga com a razão, o temor, a coragem, a virtude, o heroísmo, e a luta com a vontade em vias de ter que decidir, quais práticas serão aplicadas. Nesse embate entre o ficar pelo prazer de se satisfazer por um lado, e por outro, evitar os riscos de ser caçado, a melhor saída naquela noite parecia ser mesmo o desespero, sem medida, vacilante e atrapalhado.

Eis que em meio a troca de amores, ouve-se de súbito uma voz estridente. Eram gritos, dizia a moça: "-Não Thi!" , e com um suspirar horripilante e dramático, saí correndo e gritando num tocar desesperado. Logo em seguida ouve-se: (Pow, pow, pow, pow, pow, e mais pows, e pows, paa, pa, pa pppppppppp aaaaaaaaaaaaaaaa). Por outro lado, ao longe cerca de cinquenta metros, num boteco, a comemoração era da rua, do povo, que ao luar, pós natal, festejavam com os seus, fazendo o que de costume se fazem nas favelas do Brasil no século XXI em festas, a saber, beber com seus familiares e também, dialogar sobre os mais variados assuntos. A bebedeira na favela, potencializa o ser, que vive como se fosse o último momento, da fantasia, da felicidade aparente, da potencialização do prazer nos sentidos, entorpecidos. Muitos gostam tanto da sensação de tontura que sobremaneira, desejam até sentir todos os dias. Mas o fato é que, numa favela, num bar, num dia pós natal, é comum encontrar todo tipo de gente, dentre eles muitos pais e mães de família, em certa medida, responsáveis, que comemoram fervorosos o seu dia de alforria.

Entre os gritos da moça e os estampidos que se ouve, dum momento, a farra para, como se pudéssemos congelar o tempo e não mais propagar o som. Segue-se que o cachorro para de latir, os vizinhos param de falar, o som eletrônico pelo que se ouvia, de imediato, não atreveu-se a se manifestar em hipótese alguma. Tudo, absolutamente tudo, inclusive o vento ficou mudo, o silêncio parecia perpétuo, e se estendeu. Após algum tempo, com o tempo congelado, eis que houve-se a voz de homens, como se tivessem vindo de outro universo, senhores, que só eles podiam falar. Era um pelotão do estado (policiais), gritando vulgos, dados para incursão de batalhas, afim de esconder suas identidades.

As vozes se davam de dois lugares: Primeiro a do público do bar, horrorizado e exigindo informações do que estava acontecendo, e, por outro lado, soldados do estado, que se alinhavam como numa guerra, reagrupando-se e redefinindo táticas: - filho da puta! desgraçado! diziam eles se reagrupamento.

A moça, que se enamorava, perdeu-se do Thi, semanalmente ouve-se dizer que agiu com bravura. Por outro lado, os soldados do estado avançaram, como de costume, taticamente, encurralando os pseudo-adversários. Enquanto que os civis, estes tentaram se defender como puderam, jogando-se no chão de qualquer maneira, tentando salvar os menores, invadindo casas, tudo para se defender da ameaça inesperada. Dado um tempo, ao passar o vendaval ou a saraivada de tiros como dizem, tudo parecia incerto. Eis que de súbito, num repente não programado alguém grita novamente;

- Ei! vocês não vão dar socorro? Grita o povo, indignando-se com uma senhora nas mãos, aparentemente ensanguentada.

...É quando o Porta voz dos soldados esbraveja! - Que nada! Vou dar socorro ao meu parceiro, e inconformado com o avanço da população para de recuar, mostrando força e postura de ataque. Querendo demonstrar atitude, eis que o preposto militar coloca a mão no gatilho, e não era qualquer gatilho, era metralhadora imensa, daquelas que só se via em filmes de guerra, brilhosa, cheirando a vida dos outros ainda, em seu cano de saída, e diante do avanço do povo diz: - Pode vir! Estou esperando. Estabelecesse uma tensão novamente, o preposto levanta sua artilharia, o povo olha estupefato, um rapaz se desespera, pede justiça, avança! O soldado freia novamente, esboça a mão no gatilho, a comunidade o contém, e sob gritos de paciência, o rapaz se acalma. Entrementes, sabe-se que rapazes, em idade jovem, dificilmente vê a real justiça de perto tomar prática, mas só idealmente.

Contido os ânimos, a guarda real do estado, que chegou como um rato na surdina se dispersa, retornando ao seu veículo de comando, de onde saiu na tocaia, sem sirene, para imprimir a força. Segue-se que, sob o clamor de injustiça do povo, despedem-se os soldados da favela pós natal, deixando um saldo de vários tiros nos carros, casas, com dois baleados humanos, e, por competência, uma mãe de família alvejada no peito.

Enquanto o amor que era o colorido naquele luar, o saldo foi de emoção, afinal, ter a vida sob o disparar de torpedos mortais, com a intromissão do herói não é para qualquer moça, isso porque, já conta como sorte no currículo de sobrevivência de um favelado, sobreviver a atentados e passar pela experiência de terror, vivo. Enquanto que de outro lado, o pacote racional da relatividade, do anti-herói, seja caçando, seja se defendendo continua atuando, certamente sob o conflito da caça e do caçador, exatamente como um leão, que ao pular sob a presa, em terrenos acidentados, machucam o pé, mas, por outro lado, fazem estrago nas mentes e nas vidas daqueles que são vítima das circunstâncias.

Pingado
Enviado por Pingado em 01/01/2016
Reeditado em 11/01/2016
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