Lápis de cor

Outro dia desses, numa escola primária, havia dois meninos do segundo ano sentados, lado a lado, fazendo a tarefa que a professora pediu. O trabalho era fazer um desenho sobre as férias de cada um com a família.

Havia muitos desenhos caprichosos, coloridos, feitos com tinta guache, lápis de cor, giz de cera e outras diversas de coisas. Havia crianças que preferiam sentar-se no chão. Estes dois amigos, sentavam-se em cadeirinhas de frente para a mesa. Estavam usando os lápis. Um dos garotos, agora querendo colorir o desenho, pediu ao do lado:

_ Por favor, me dá o lápis cor-de-pele?

O outro respondeu com uma pergunta:

_ Qual deles?

_ Como assim qual deles? – intrigou-se o primeiro – Só tem um que ta aí do seu lado.

_ Ah, este? – ergueu o lápis que era marrom canela.

_ Não, seu burro, aquele ali ó – e indicou com o dedo.

_ Ah, sim. Toma. Estranho, a pele da minha mãe é dessa cor aí que você pegou. Mas a do meu pai é assim olha – e mostrou-lhe novamente o lápis marrom canela.

_ É, isso é marrom, mas cor-de-pele só tem essa. É o nome dela.

_ Não entendi. Eu conheço uma moça que tem uma pele muito, muito branca. Minha avó é meio bege, e chama o japonês da quitanda de amarelo. Mas ele não é tão amarelo, não. Minha mãe é bem rosada, igual ao seu lápis, e meu pai é marrom. E tem a minha outra avó, mãe do meu pai, todo mundo chama ela de preta. Mas ela nem é tão escura.

_ Mas... Tudo isso é cor de pele? Não dá pra ser assim! Isso é cor-de-pele, aquilo é vermelho, aquilo é amarelo. Eu sei que uma pessoa cor-de-pele é chamada de branca. Gente marrom é chamada de negra. Mas tem gente que é meio vermelhona, né?

O outro menino, prestando muita atenção, viu que os olhos do amigo eram bem pretos. Pareciam duas jabuticabas. Os dele eram azuis.

_ E cor-de-olho? Tem? Não né? Por que é que tem cor-de-pele?

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E se eu lhe pedisse o lápis cor-de-fome? Cor-de-miséria? Co-de-maravilha e a cor-de-beleza ? Quais são mesmo as cores do Brasil? A verdade, é que nós, brasileiros não temos nenhuma cor. Somos feitos de preto, branco e colorido. As nossas crianças nascem de olhos puxados de índio e oriental, olhos grandes, olhos pequenos, azuis, pretos, castanhos, cinzentos. Cabelos cacheados, cabelos lisos, cabelos africanos, espanhóis, russos, alemães, turcos, americanos.

Dentro desse mundo chamado Brasil, por mais incrível que pareça, há barreiras entre as pessoas devido sua etnia. Pelo menos na minha visão, quem tem raça são os cães. E nem por isso eles brigam. Agora, lembre-se do exemplo dos lápis. Eles têm cores diferentes, mas a matéria prima de todos eles é a mesma: madeira e carga. Assim como nós temos corpo e espírito. Todos nós.

Olhe para o seu lado, a pessoa que você vê, qual é a origem do seu sobrenome, qual é a cor dos seus cabelos e dos seus olhos. Olhe para você mesmo e tenha orgulho, em fim, de ser brasileiro, filho de umas mil coisas, que no fim das contas, acaba formando uma etnia somente: a sua. Sim, porque não há duas pessoas iguais no mundo. Nem os gêmeos são iguais.

No meio das favelas, das casas ricas, dos bairros de classe média, nas casas dos ingleses, marroquinos, franceses e portugueses, há uma miscelânea de cores intermináveis. Há cores de fome, de miséria, de vontade, de desejo, de maldade, de alegria, de trabalho, de amor, de espiritualidade e uma cor bem característica de “a gente se vira como pode”. Na realidade, dá pra ver essa cor em todo o país.

E se desse pra gente ver o coração de cada brasileiro, eu sei que mesmo lá no fundo, haveria um “tum-tum” verde e amarelo. Um balanço compassado em ritmo de samba e batuque, dentro de todos os que nasceram aqui e todos os que renasceram aqui. Lá então estaria uma fila de bandeiras de todo o mundo, mas na frente viria a do Brasil.

Há também uma saudade no peito de muitos que saem daqui pra terra do Tio Sam, pra terra do chá das cinco, pra terra do sol nascente, pra terra vermelha da Rússia e pra terra da primavera florida da Alemanha. A saudade às vezes aperta e muita gente quer voltar para a Terra Brasilis.

Estamos todos pintados, estampados, coloridos a lápis de cor em um desenho em que não dá pra saber onde começa uma cor e termina a outra. Numa enorme aquarela em uma escala de cores infinitas que se repetem está o Brasil. O mais lindo e colorido mundo dentro da Terra.

Carol Bohone
Enviado por Carol Bohone em 10/01/2008
Código do texto: T811820