Páginas da Vida

Imagens da cidade do Rio de Janeiro, a retratação fiel da classe média carioca, mansões e louras belíssimas, um elenco estelar, a abordagem de problemas urbanos somados a novos talentos revelados em cenas de forte carga dramática não deram a uma novela de Manoel Carlos o brilho e a audiência de outrora.

O que teria acontecido? Fomos nós ou eles que mudaram? Veremos...

Noite de sexta, mais um final de novela. Diferentemente das anteriores, essas páginas vieram recheadas de um movimento dialógico mais lento, reflexivo, moderado como os próprios passos do autor, ultimamente.

A obra findada revela um traço personalístico do seu criador que até então não conhecíamos: a nostalgia conservadora de uma ala carioca.

O culto ao belo e ao refinado, a imposição da saudosa constituição familiar, o deletamento proposital da violência urbana, um elenco de silhuetas perfeitas, parecia, até agora, a fórmula inexorável do sucesso.

Mas o bolo solou... O que terá sido dessa vez???

A denúncia social é marca registrada nos produtos culturais manoelinos. Sua competência para abordar esses temas também é inconteste a ponto de repercutir na sociedade civil, resultados jurídicos: Já fomos alertados para a indiferença sutil no trato com nossos idosos ao ponto de suscitar o Estatuto do Idoso; acatar a informação de que amar deve ter medida certa e virmos florescer Associações de Mulheres que Amam demais; o enfoque sobre a dependência química e suas consequências para o desajuste familiar e mais recentemente, a inclusão social dos portadores da Síndrome de Down.

A retratação dos sete pecados capitais ou de intolerâncias de gênero inquietam o mundo desde o surgimento da raça humana e sempre envolve a platéia em catarse e audiência. Entretanto, seu ingrediente principal nas tramas televisivas gira em torno do seu objeto de estudo e admiração maior: a família. Foi assim em Baila Comigo, Laços de Amor, Por Amor, Mulheres Apaixonadas e até, Presença de Anita.

Sabe-se que seus enredos são por ele controlados desde o argumento inicial até os arremates, como: trilha sonora, escolha de elenco, cenário, figurino, etc. Mas, o traço indelével de Maneco ainda é mais preciso, ferino, especial: o talento para fazer a platéia calar a cada fala de seus protagonistas. Certa vez, ouvimo-lo dizer que haviam frases que só seriam bem compreendidas se ditas por Suzana Vieira ou Marieta Severo. E como ele esteve certo..., sempre!

Depois de uma trama policialesca sobre diários e lingerie, Páginas da Vida invadia o horário nobre com a obrigação de reconquistar o público cativo que andava aproximando os índices da vice liderança a partir de Prova de Amor e Cidadão Brasileiro.

A Vênus lança mão do Time dos Sonhos para exterminar a concorrência. A peso de ouro, contrata um plantel de aproximadamente cinquenta atores para um roteiro que basicamente se centrava em sete a dez personagens. Tínhamos talento em demasia para pouca estória. Diríamos que as páginas de tantas, soltaram-se e perderam-se entre as ventanias da concorrência.

De fato, hoje em dia, por termos sido acostumados ao mais alto padrão dramatúrgico platinado, a citar Irmãos Coragem, Escrava Isaura, Roque Santeiro e o Clone, é irritante e por que não dizer, constrangedor ter de se contentar com Kubanacan ou o remake de O Profeta. É que reprisar ou refazer o que já deu certo evidencia uma crise de criatividade ou nenhuma vontade de investir em novos autores.

O que a Globo esquece é que se fez Globo por arriscar sem temer.

Tantas e quantas vezes for escrita uma história manoelina ou gloriana haverá expectadores, mas cada vez mais e em igual proporção cresce o descontentamento com o acúmulo de páginas já conhecidas e lidas.

Fica a reflexão!

Arsenia Rodrigues
Enviado por Arsenia Rodrigues em 04/03/2007
Reeditado em 26/06/2008
Código do texto: T400466
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