Uma grande aventura do Tio Patinhas

UMA GRANDE AVENTURA DO TIO PATINHAS
Miguel Carqueija

Resenha da novela gráfica “Cercado por todos os inimigos” ou “A última aventura”, publicada em quatro partes no Almanaque Tio Patinhas, a saber: no n° 582 (2013), capítulos 1 e 2; no n° 583 (2014), capítulo 3 e capítulo final. Publicação brasileira da Editora Abril (São paulo-SP). Roteiro: Francisco Artibani. Desenho: Alessandro Penna. “Design” gráfico: Lua Azul.

O Tio Patinhas (Uncle Scrooge no original, em evidente alusão ao personagem do conto “O avarento” de Charles Dickens), criado em 1948 pelo quadrinista Carl Barks (da equipe de HQ de Walt Disney) é, de há muito, um ícone da cultura pop norte-americana e possuidor de grande prestígio no Brasil. Apesar de sua imagem de usurário unha-de-fome ele manifesta também boas qualidades, por vezes amolece o coração e revela não ser, no fundo, tão insensível quanto parece.
A novela gráfica “Cercado por todos os inimigos” mostra bem a verve que vem, há tempos, da Itália, com um senso de humor e oportunismo de enredo que, de fato, funcionam a contento. Certo, o traço de Alessandro Pereira é tosco se comparado com o estilo elegante de Carl Barks ou Don Rosa. Os Metralhas aparecem magros, contrastando com sua histórica corpulência. Os rostos dos personagens, porém, são bastante expressivos, bem como as atitudes.
Nesta história o Tio Patinhas sofre bastante. Seus principais inimigos unem-se para destrui-lo: Patacôncio, Pãoduro Mac Money, Maga Patalógica e os Irmãos Metralha. Estes, nesta versão reduzem-se a três; seu número médio é cinco.
O plano é conduzido por dois desonestos gigantes financeiros, Patacôncio e Mac Money, que raramente aparecem juntos. Rivais de Patinhas no mundo dos negócios, combatem-no em geral separadamente. A originalidade desta trama é a união dos dois milionários contra Patinhas, arregimentando ainda a bruxa italiana e os Metralhas.
Pego de surpresa quando tranquilamente cogitava sua participação na “festa anual da colheita” da Vovó Donalda, o Tio Patinhas não consegue evitar o roubo de seus três acres cúbicos de dinheiro e sua moeda número 1, e quando corre atrás do prejuízo desguarnece o mercado das finanças, de que se aproveitam Patacôncio e Mac Money. O ataque é brutal, mas Patinhas, que a seu modo é uma espécie de super-herói, possui uma grande capacidade de recuperação.
Assim o contra-ataque ocorre na segunda parte, com o Tio Patinhas, secundado pelo Donald, e com a discreta ajuda do Professor Pardal e da Vovó Donalda, aproveitando-se das discórdias que começam a ocorrer na liga dos vilões: primeiro os Metralhas, porque a bruxa, tendo colocado o dinheiro da caixa-forte numa dimensão mágica, não consegue recuperá-lo para eles. Em seguida, como seria de esperar, surgem desentendimentos entre Patacôncio e Mac Money. Este fator é habilmente explorado por Patinhas.
Aliás o quadro psicológico dos personagens é muito bem explorado. Mac Money, por exemplo, é o vilão ideal, sem escrúpulos, realmente mau e perigoso, que não recua diante de qualquer torpeza. Patacôncio também não presta, mas falta-lhe coragem para ir às últimas consequências. Quando as coisas começam a dar errado, a traição mútua será inevitável.
Quanto ao Tio Patinhas, é o sujeito durão, capaz de dar a volta por cima e enfrentar as situações mais adversas. Embora sovina, ganancioso e mal-humorado, Patinhas segue princípios éticos que o levam, apesar de seus defeitos, a ser estimado por muita gente.
Desfilam em “Cercado por todos os inimigos” muitos personagens, inclusive alguns pouco conhecidos e outros que aparecem com participações irrelevantes, como o Gastão e o Gansolino; com certo destaque comparece o Donald, que tem alguns momentos de brilho na sua fantasia de Superpato. O prefeito corrupto de Patópolis, um porco como se sabe, faz a sua aparição caricata. Os sobrinhos de Donald desta vez não se destacam muito.
Algumas curiosidades da aventura:
Presença dos “fermies” e dos “terries”, estranhos seres subterrâneos que surgiram pela primeira vez na história “Os fabricantes de terremotos”, do grande Carl Barks.
A Maga Patalógica, a certa altura, se vê transformada numa fada, para grande desgosto seu; e o que é pior, com um traje ridículo.
O Peninha tem uma pequena mas brilhante participação.
O alter-ego de Donald, o Superpato, aparece apenas na hora de lidar com os Irmãos Metralha.
Para entender tudo o que acontece acaba sendo preciso conhecer um pouco de finanças: as manobras de Patacôncio e Mac Money contra o império do Tio Patinhas e a forma como este contra-ataca.

Rio de Janeiro, 30/7 a 3/8/2014.