AS DOBRAS POÉTICAS

Eis que a amiga Joyce Lima, lá de Itagibá, no sul da Bahia, escreveu na madrugada de hoje aqui no Recanto que “Há sempre um outro lado do que se diz. Nas dobras da poesia há muitos sentidos que se escondem”.

É certo que a Joyce milita profissionalmente na área de Educação e bem sabe que depois da linguística saussuriana o mundo literário deixou de ser uma bola quadrada para se tornar redonda, tal qual certa cerveja descendo na garganta dos boêmios. Quando os formalistas russos suscitaram suas teorias, o mundo se iluminou de pesquisadores e cientistas malucos que desbancaram os alquimistas parnasianos e suas teorias chegaram ao novo século imbuídas de verdades científicas, pois conseguiram dissecar os sapos parnasianos em modernos laboratórios da linguagem. O sentido lexical desceu pelo ralo medieval e nasceu um novo mundo de palavras acesas que não queimam em vão, conforme poética do Quinteto Violado.

Antes de focar no que a autora quis dizer com “as dobras da poesia”, vamos ver o que é poesia, palavra abstrata, que não encontra definição única por ser algo subjetivo, que depende do nosso estado de espírito e capacidade de se enternecer, sonhar, sentir. A poesia está em todo canto e lugar, desde que tenhamos um olhar sensível para tal. Já o poema é a forma concreta da poesia, ou seja, é como codificamos o nosso sentir. Porém nem todo poema é poesia. Para que se alcance o Nirvana da poética é preciso compreender a estilística como a força comunicativa e magnetizadora da poesia e a polissemia, a multissignificação e o sentido figurado como “os vários sentidos que se escondem nas dobras da poesia”.

Escrever linearmente, como prosa, e dar o formato de poema, é um poema, mas nem sempre se pode dizer que é poesia. Escrever “Eu vi o pôr do sol atrás da montanha” é uma narrativa, diferente de se escrever “Eu vi a montanha tragar o sol” ou coisa assim. Ao usar “nas dobras da poesia” Joyce fez uma construção poética, pois deu um significado semântico à palavra “dobras”, em substituição ao léxico “versos”.

Atentem, pois. Quando o poeta diz “lata”, na lata cabe o incabível (Metáfora. Gilberto Gil). E “dobras” é a lata metafórica da Joyce.