AVATAR - O FILME DO SÉCULO

Quando me dispus a assistir Avatar com meus filhos ontem, na sua hipnótica versão 3D (ah, amigos, esta coisa de 3D é um deslumbramento, já fico imaginando como será quando passar do cinema para dentro de nossas casas!), nunca imaginaria que James Cameron, o legendário diretor de Titanic, fosse um visionário, no melhor estilo. Talvez que o próprio avatar - ou um Na'vi, do seu mítico planeta Pandora; ou inspirado por um deles, considerando particularmente ser bastante possível existir por aí, neste Universo imenso de Deus, um tal maravilhoso mundo!

Em plena semana do vergonhoso fracasso no acordo em Copenhage, pergunto-me se é por acaso que nos chega esta sacra apologia em prol da Vida - mas leia-se Vida com V maiúsculo mesmo, esta Vida em contexto universal, ante a qual deveríamos já ter aprendido, via nossos piores descalabros, a venerar acima de qualquer coisa - no nosso semelhante quanto na fauna ou flora, não importa!

Chame-se esta Vida de Deus, Fonte, Essência, o que for! Uma história em vários sentidos nem um pouco inverossímel, visto que nos expõe, gritante, talvez mesmo óbvia demais, a radiografia clara de toda a nossa arrogância patética como civilização pretensamente ideal, portadora de modelos falidos que se tenta, a todo custo, em meio às nossas guerras sangrentas, impor a povos vitimizados pelas potências bélicas terrenas sob um pretexto magistralmente exposto num dos diálogos do filme:

- "Quando algo não nos pertence e está sob o controle de outro, este outro forçosamente se transforma em nosso inimigo..."

O outro, nestas condições ardilosas, propícias, se torna pasto para as guerras contra o terror - algo também aludido momentaneamente na fala de um dos personagens beligerantes da trama, um general terrestre famélico cuja missão é impor a todo custo o domínio sobre Pandora atendendo ao interesse em certo minério bilionário existente em suas paisagens, o pano de fundo de um ataque colonialista na melhor forma das antigas conquistas romanas: oferta aos bárbaros tribais de um pretenso modelo de civilização compreendendo roupas, língua, costumes terrenos, estradas nas paisagens já exuberantes, já completas, perfeitas, de Pandora - em troca de opressão, de domínio puro e simples!

Impiedade, irreverência, desrespeito. Agressão fortuita! Todos os métodos infamantes possíveis empregados num ato invasivo maciço contra uma sociedade já estruturada e - acima de tudo, feliz! - em nome de uma única finalidade: dominar e obter, pela força, o tal minério para produção de energia. Depois de já se haver destruído todos os recursos naturais da Terra! A praga; a doença depredatória não mais que sendo transferida a mundos outros, a raças inimaginavelmente superiores, dotadas de um encanto existencial cuja essência, neste nosso mundo utilitarista, é acessível, ainda agora, apenas à sensibilidade de uns poucos!

Os Na'vi - povo de pele de tonalidade azul, belos, altos, esguios, vivendo em clãs em Pandora (lua orbitando o planeta gasoso Poliphemus em Alfa Centauro), sob o influxo majestoso da poderosa rede vital que, lá, entrelaça em harmonia suprema tudo e todos! Árvores sagradas, animais, seres! Tudo coexistindo em simbiose sagrada, perfeita! Vivem assim, em condições aparentemente primitivas à ótica míope dos seres humanos, que lá chegam sem poder respirar o ar daquele mundo misterioso sem máscaras, tendo, por isto, que criar geneticamente Avatares - clones dos Na'vi, réplicas mistas destes com humanos - cada qual controlado mentalmente por um cientista ou invasor humano, que lhes transfere suas consciências e os infrilta estrategicamente nas florestas densas e magníficas do planeta, a fim de aprender sobre eles sem despertar suspeitas e de interagir de maneira supostamente pacífica - penduricalhos em troca de estradas, medicina e tecnologia (onde já vimos e ouvimos esta história, num sem número de outras versões, inclusive na nossa pátria?), captar a confiança dos nativos para, enfim, saltar, senão com o seu consentimento, com a violência avassaladora e costumeira de nossa raça beligerante, para enfim dominar Pandora; se apoderar do tal precioso minério e, com este fim mesquinho, arrasar-lhe os cenários perfeitos, saturados de Vida magnificente, enfim - transformar aquele mundo na ruína deprimente na qual já vai se tornando a nossa exaurida Terra!

Chegam a fazer isto, em parte. No momento deste ataque cruel, impiedoso - quando já estávamos apaixonados, eu e meus filhos, pelos dóceis, soberanos Na'vi, e, deles, pela personagem de Zoe Saldaña, a Na'vi que se afeiçoa ao mariner Jake (Sam Worthington), invasor bom e pacifista, não mais que marionete utilitária nas mãos dos líderes daquela invasão - chorou minha filha; eu chorei! Ao ver - e aí os efeitos 3D imperam sobre a nossa percepção, atordoadores! - aquelas paisagens que à noite brilham, fosforecentes, em árvores, flores e seres mínúsculos, misteriosos; florestas majestosas, animais, toda uma raça pacífica e benéfica sendo destroçada brutalmente pelos armamentos terrestres, que, naquele cenário de sonho, se tornam estranhamente pré-históricos, bizarros, ícone absoluto da mais ostensiva involução... as lágrimas nos vem, espontâneas. Entramos, sem sentir, em processo de simbiose com aquele modelo de Vida ideal, com a qual tantas vezes sonhamos em meio às dificuldades, estas sim, primevas, de nossa existência na Terra! E vê-los assim, destruídos com a mesma impiedade, e sob os mesmos pretextos que sabemos pouco louváveis, e em nenhum caso convincentes, utilizados à larga pela nossa pobreza crassa de recursos ditos humanos, nos lança, subitamente, no desejo irreprimível de sermos um deles, daqueles felizes Na'vi! Para nos livrarmos da doença! Desta doença que os autores dos nossos pretensos avanços científicos e tecnológicos talvez que já intentem estender a mundos próximos ao nosso combalido orbe, através de tantas missões espaciais cujo significado não alcançamos sequer atinar com o mínimo de seus reais objetivos!

No fim - e é esta convicção que, mesmo aqui e agora, sobrexiste a todo o desconsolo de nossos próprios tempos tidos como realidade última, como o último biscoito do pacote - os meios ignotos da Vida, para restabelecer o seu próprio equilíbrio e harmonia, prevalecem naquele enternecedor mundo, em Pandora - onde seres humanóides têm por hábito se conectar, via Árvore das Almas, com a rede suprema das energias vitais, sendo prontamente ouvidos e atendidos!

Não obstante todo o sofrimento no desenrolar da trama, de entremeio com o fascínio de cenários mágicos, avançados demais para o nosso merecimento involuído - o final é feliz para os Na'vi! E, como não poderia deixar de ser - e sobretudo é, sempre, a qualquer tempo, para modus vivendi primitivos como o nosso - a apoteose da destruição para os sórdidos projetos humanos naquele mundo de sonhos; para os ambiciosos planos dos chamados pelos Na'vi Povos dos Céus!

Que somos ainda desalentadores quão selvagens Povos dos Céus é a certeza que nos resta, ao final de Avatar - somada aos temores talvez que bem reais de que o fracasso deste recente acordo climático nos prenuncie um futuro próximo, em nosso próprio e ainda belo mundo azul, bastante sombrio!

Que a Grande Mãe nos preserve de um tal desfecho, como o fez em Pandora, é o nosso grande e melhor anseio!


http://ccaleidoscopio.blogspot.com

Christina Nunes
Enviado por Christina Nunes em 20/12/2009
Reeditado em 30/12/2009
Código do texto: T1987396
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