“Chaplin” (Chaplin)

“Chaplin” (Chaplin)







Artistas desunidos, uni-vos. E tomem ciência de que a chancela United Arts teve por detrás o envolvimento de C. Chaplin.

Sabe de onde veio aquela técnica toda de cair e levantar num piscar de olhos? Começa com F. Fome. Chaplin viveu uma infância e adolescência miseráveis na Grande Londres no período de tempo que compreende os estertores do séc. XIX e alvorada do XX. Artistas do tipo eu canto, eu danço recebiam de tudo no palco, exceto gratidão.

Richard Attenborough dirige (“Gandhi”, “Uma ponte longe demais”, “Um grito de liberdade”) a história que une um dos patronos da arte que une o Self Made Man a um talento único exposto na unha, conquistado polegada por polegada, desde o tempo em que artistas de teatro eram enxotados de restaurantes até o tempo, como ele mesmo antevira, em que seriam solicitados.

O desempenho de Robert Downey Jr. no papel de Charles Chaplin angaria os melhores adjetivos.

Attenborough realiza com eficácia o esquema de trás pra frente aos bocados, com 20 anos incompletos Chaplin já tinha passado pelo reformatório (por falta de verba em casa, não por delito), seu pai morrera na cantoria boêmia, sua mãe fora colocada num manicômio, ela também estivera no teatro de revista.

Em 1963, em Vevey, Suíça, o editor fictício Antony Hopkins fala para o Charles grisalho, com muitas marcas inclusive as de Veni, Vide, Vici – “vou te dizer uma coisa, vai soar um pouco norte americano, mas não tem jeito. Não tenha medo de expor suas emoções, o público gosta disso”.

No filme, quem faz a mãe de Chaplin é justamente sua filha, Geraldine. Artistas dessa esfera possuem passe livre para certos luxos. A direção usa de poucas palavras para mostrar a mãe enlouquecida num quartinho, costurando luvas.

Em 1913 Chaplin chega no Alabama. Dá o que pensar, a vida dos desbravadores. Cinema não era encarado como coisa séria pelos profissionais da ribalta, o criador do “Vagabundo” vagava em meio a um mar de chapéus de caubóis realizando projeções quase clandestinas quando ele recebe um telegrama da Califórnia: 150 U$ dólar por semana. “À audácia, a fortuna ajuda”.

Considerando a linguagem dos 90, Attenborough surpreende. Aos 31 minutos ele nos fornece uma nova abordagem. Charles chega na nascente Hollywood, os filmes são editados no negativo, antes da revelação, está acontecendo alguma coisa que ninguém sabe o que é com uma tecnologia aprendida na marra, tudo isso se chama cinema. Também dá o que pensar. O que é que poderia bater à nossa porta, hoje, com o mesmo poder de transformação?

Em 1918 Chaplin tornou-se o homem mais famoso do mundo, já tinha seu próprio estúdio e conseguira uma inimizade que mais tarde lhe traria um custo incalculável. Bastou uma palavra displicente num encontro social para o futuro “dono” quase vitalício do FBI, J. Edgar Hoover.

A explicação de Chaplin do por que o Vagabundo não poderia falar foi notável. Hollywood mudava com a velocidade de uma bala de canhão, os filmes doravante podiam mostrar atores falando, mas o Vagabundo não, dizia ele. E prosseguia: “Imaginem o maior bailarino do mundo, Nijinsky, antes de realizar uma performance para a platéia, aproximar-se dela e abrir a boca para dizer algo como: olá, meu nome é Nijinsky, vim dar boa noite a vocês e dizer que hoje...Pronto. Terminou a mágica. Aconteceria o mesmo com o Vagabundo. Na hora em que abrir a boca, estará liquidado”.

Antony Hopkins, dada altura, mais se parece com um analista do que com um editor. “Vamos lá, pede ele, você teve dois filhos com essa mulher, escreveu um livro de 500 páginas e dedicou somente 5 a esse casamento. Há algo errado, não?” Ou então, de modo pouco sutil, perguntava para o astro se ele tinha consciência de seu ligeiro problema com as mulheres.

Por hora o cinema falado não o assustava e desviou como que por milagre da Crise de 29, vendendo todas as suas ações um ano antes. Com grana no bolso e um estúdio, uma outra nota da sua sinfonia passou a gritar mais alto, embora já viesse querendo decolar desde que começou a dirigir seus próprios filmes – a nota da crítica social.

Chaplin fora um tanto desleixado com o lendário J.E. Hoover antes mesmo que este se tornasse o todo poderoso do FBI. Nada como um louco ressentido e com poder para ter a vida transtornada.

“O Grande Ditador” começou a ser rodado em 1938, o cinema falado já corria solto há mais de uma década, todo mundo achou essa iniciativa uma insanidade, mas logo depois passaram a chamar-lhe de gênio. Isso porque, em 38, para muita gente, Hitler ainda não era um assassino consumado. Em 39, 90% dos americanos repudiavam a idéia de um envolvimento na crise européia. Os associados bradavam contra o autor, dizendo que um filme sobre Hitler era uma estupidez. Chaplin rebatia: nasci no mesmo ano que esse homem, com uma diferença de 4 dias. Já descobri que sou capaz de qualquer coisa e sei que ele também é. E como se não bastasse, sou judeu.

Em 1972, a quadragésima quarta edição do Oscar prestou-lhe a devida homenagem. Chaplin estava com 83 anos e proibido de colocar os pés em território americano desde 52. Assistiu a festa com lágrimas nos olhos. A Academia destacou sua obra e sobretudo seu papel na evolução do cinema. Charles escreveu, produziu, dirigiu e atuou em 81 filmes. A rainha Elizabeth II condecorou-o com o título de Sir em 1975 e dois anos depois ele partiu para o outro mundo, sendo chamado no funeral, pelo próprio Nijinsky, de “o maior bailarino do mundo”.

Encerramos com Hellen Keller: “A vida é uma aventura ousada ou não é nada”.

 
Bernard Gontier
Enviado por Bernard Gontier em 23/01/2012
Reeditado em 05/08/2021
Código do texto: T3457224
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