“Kinsey – Vamos Falar de Sexo” (Kinsey)

“Kinsey – Vamos Falar de Sexo” (Kinsey)





Até hoje ainda não fizeram um estudo sobre passeatas imbecis. Renderia algum conhecimento. Lançado em 2004 nos USA, gerou polêmica e algazarras. Qual...o que se desperdiça de energia à toa é incalculável. Por que é que não se protesta pela lisura do senado, digamos?

Uma das grandes contribuições da vida e obra de Alfred Charles Kinsey (1894 -1956) foi o intrépido passo da Associação Americana de Psiquiatria ao remover a homossexualidade da lista de desordens mentais (1973), ação essa que decerto influenciou a Organização Mundial de Saúde (OMS), a não mais considerar a homossexualidade como doença (1986).

Ou seja, a ficha custa a cair no planetinha, considerando a data de sua primeira publicação nesta área – “Sexual Behavior in the Human Male”, em 1948.

Bill Condon escreve e dirige, sem mais e sem menos, apenas como todo filme didático deve ou deveria ser, noutras palavras, como manda o figurino e Liam Neeson prova uma vez mais estar bem além desses personagens insossos que a labuta (e não a arte) o obriga a desempenhar. Liam faz Alfred Kinsey, considerado o Pai da Sexologia.

Ora se às vezes a vida não é uma caixa repleta de surpresas que se desdobram com misteriosa coerência na linha do tempo.

Kinsey passara 3 anos nos recônditos do continente norte americano colecionando vespas parasitas (um milhão de vespas, doadas ao Museu Nacional de História Natural) e lá pela vespa 500.000 ele concluiu “que cada ser vivo é diferente de todos os outros seres vivos e que a diversidade se torna fato irredutível da vida. Só as variações são reais”.

Sob o microscópio, Kinsey nunca achou uma vespa igual a outra. Ano aproximado – 1920. Quinze anos depois ele aplicou o mesmo raciocínio sobre o sexo.

Condon não imputa ao roteiro uma demarcação temporal rígida na jornada deste estudioso, que defendeu tese de doutorado em 1919, passou a lecionar como professor assistente (departamento de zoologia - Universidade Bloomington -1920) e no ano seguinte desposaria a estudante Clara Bracken McMillen, no filme interpretada por Laura Linney (indicada ao Oscar de melhor atriz coadjuvante).

A sacada de Condon, além de colorir com uma imensa vida esse personagem – enlameado por todos os lados quando da divulgação de seu primeiro livro – foi mostrar com uma agradável dinâmica não só os recheios da vida como o dos estudos também, incluso aí o Questionário Kinsey – exibido durante boa parte do filme a intervalos. São cenas num preto e branco quase azulado do próprio professor preparando individualmente cada membro de sua equipe para entrevistar centenas e centenas de pessoas acerca de tópicos que ninguém falava abertamente, ou antes, sequer pensava. No raciocínio inserido nestas conversas está o xis de toda a questão.

Outros nomes integram a obra: Chris O'Donnell, Peter Sarsgaard, Timothy Hutton, John Lithgow, Tim Curry e Oliver Platt.

O filme abre com o pai, John Lithgow, pregando num domingo qualquer, tendo o pequeno Kinsey na platéia:

“A luxúria tem vários caminhos: o salão de baile, a sorveteria, o bar do cortiço, o banho turco. Mesmo as mais modernas invenções da ciência são usadas para cultivar a imoralidade. O motor a gasolina nos trouxe o passeio de carro e com isso o bordel a beira da estrada. A eletricidade tornou possível o show de imagens. Por causa do telefone uma jovem pode ouvir a voz de um pretendente, no travesseiro, ao lado dela. E não vamos esquecer a invenção mais escandalosa de todas: o fecho Talon, mais conhecido como zíper”.

Curiosamente, perto de meio século depois, o professor Kinsey convida o pai para responder o questionário. Com o meneio na medida certa ficamos sabendo que o pregador puritano, na pré adolescência, passou pelo “tratamento” de ficar com as mãos amarradas, devido, digamos, a um excesso de toques em suas partes íntimas.

O nova-iorquino Bill Condon, nascido em 55, católico, filho de um detetive, faturou uma indicação ao Oscar pelo roteiro de “Chicago”, (ele anda se esbaldando na saga “Crepúsculo”) e construiu um Kinsey distante das pechas de pedófilo e ou pervertido, sugeridas pela imprensa de cor marrom. Nada foi provado.

Liam Neeson colaborou sobremaneira nessa construção – ele é o estudioso dotado de um foco quase sobrenatural, sexo para ele não tem atadura nenhuma com emoção, aspectos psicológicos e o que mais esteja fora da alçada fisiológica, sendo talvez sua grande bandeira utilizar a ciência “como cura para a opressão sexual”.

Se a América ficou chocada em 1948, com seu primeiro trabalho, o segundo, “Sexual Behavior in the Human Female” (1953), deixou o país em frangalhos. A soma de ambos resultou nas estarrecedoras estatísticas, dentre outras, de que 92% dos homens e 62% das mulheres se masturbava. E mais – 37% dos homens e 13 % das mulheres já tinham tido relações com parceiros do mesmo sexo.

Grosso modo, a casa caiu para a família tradicional americana.

Costuma-se dizer que a revolução sexual ocorrida nos 60 teve nos estudos de Kinsey seu ponto de partida e mola propulsora. Costuma-se dizer também que até hoje seu trabalho serve para consultas e pesquisas.

Enfim, é a velha história – quando o ser humano não precisa de um exemplo, precisa de um espelho. Kinsey trouxe o segundo.

 
Bernard Gontier
Enviado por Bernard Gontier em 06/02/2013
Reeditado em 30/05/2021
Código do texto: T4126463
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