Efemeridade do tempo em Cerejeiras em Flor

Há filmes que simplesmente são feitos para entreter e que passam tantas vezes despercebidos. Outros que marcam, que tocam mais que o olhar bem fixo à tela, mas que também envolvem alma e coração até os últimos segundos de exibição. Uma trama muito sensível e repleta em simbologia. É exatamente assim que acontece com Hanami – Cerejeiras em Flor, longa alemão que tem como plano do fundo a terra do sol nascente, o Japão. Um belíssimo trabalho escondido sob a safra de superproduções, efeitos especiais e grandes doses de ação.

Trudi (Hannelore Elsner) recebe uma estarrecedora notícia: seu marido, Rudi (Elmar Wepper), tem pouco tempo de vida. Aconselhada pelos médicos, ela o convence a sair da Bavária, onde moram num vilarejo, e espairecer numa visita aos filhos em Berlim. E omite dele o trágico destino. O sessentão Rudi ainda dá conta de seu emprego burocrático e não abre mão do cotidiano pacato, simples e regrado. Na capital alemã, o reencontro com Karolin, lésbica, e Klaus, casado e pai de duas crianças, é marcado por passagens embaraçosas, desconfortantes e de uma vivacidade ímpar.

Um drama de pura reflexão sobre temas rotineiros e sob um olhar magnífico da diretora Doris Dörrie. Efemeridade do tempo, velhice, solidão, instantes do “ser feliz para sempre” e amor incondicional são alguns dos assuntos trabalhados em Cerejeiras. É a descoberta da vida no tardar dos dias.

Desde o princípio, percebe-se o cuidado para que tudo pareça o mais natural possível. Do figurino e maquiagem à fotografia, tantas vezes estourada, uso de luz natural, o que muito aproxima o espectador. Atuações no ritmo certo, sem exageros. Há expressões contidas e o olhar complementa diálogos, alguns fora de contexto, justamente para representar o distanciamento entre os membros da família com relação aos quesitos físico e mental, que já não se complementam devido ao rompimento e à falta de comunicação instaurada. Também o uso de imagens justapostas e desconexas exemplifica a falta de solidez dos envolvidos.

A mosca, símbolo muito presente na trama, surge para representar a alma que partiu, que vagueia de um lado para o outro. Símbolo esse que desaparece quando da chegada de Rudi ao Japão, onde descansa a alma e o espírito da esposa Trudi.

A flor de cerejeira, em si, já representa o elemento máximo do drama. Sakura em japonês, é a flor símbolo do Japão. Quando do surgimento da flor de cerejeira, acontecem muitos festejos. É a vida efêmera como o é a flor, que se desprende da árvore.

Os tempos mortos da trama conjugam-se com momentos de guinada surpreendentes. O filme é maduro e mostra experiência de vida. Um filme para ser visto e digerido ao longo de dias.

Fonte: http://www.cinemaslumiere.com.br/blog/efemeridade-do-tempo-em-cerejeiras-em-flor/