A segunda aventura de Bernardo e Bianca

A SEGUNDA AVENTURA DE BERNARDO E BIANCA
Miguel Carqueija


Resenha da animação de longa-metragem “Bernardo e Bianca na terra dos cangurus” (The rescuers down under). Walt Disney Productions, EUA, 1990. Produção: Thomas Schumacher. Direção: Hendel Buttoy e Mike Gabriel. Adaptação dos livros “The rescuers” (Os salvadores) e “Miss Bianca”, de Margery Sharp. Roteiro: Margery Sharp, Jim Cox, Karey Kirkpatrick, Byron Simpson e Joe Ranft. Música: Bruce Broughton.

Elenco de dublagem:

Bernardo.........................Bob Newhart
Bianca..............................Eva gabor
Wilbur..............................John Candy e Don Rickles
Cody.................................Adam Ryen
Jake..................................Tristan Rogers
Percival McLeach.............George C. Scott
Joanna..............................Frank Welker
Marahute..........................idem
(os dois últimos citados não falam; o dublador limita-se a imitar sons animais)

Na época em que esta animação passou nos cinemas do Rio de Janeiro e eu, inclusive, fui assistir, um crítico de cinema (ou n “Jornal do Brasil” ou em “O Globo”; naquele tempo ainda havia espaço razoável para essas críticas, depois reduzidas drasticamente em tamanho), querendo elogiar a obra, afirmou que se Walt Disney estivesse vivo, assinaria o desenho.
Perdão, mas eu não concordo. Para mim é evidente que após a morte de Walt ocorreu uma considerável queda de qualidade na Disney, ainda mais acentuada com a saída de seu genro Ron Miller em 1984. Com o tempo a Disney diversificou para pior as suas animações, com a utilização por exemplo (não aqui) daqueles feios bonecos de computação gráfica; além disso tem havido abuso de personagens escrachados, num humor que se aproxima da vulgaridade. No presente caso não se chega a tanto, exceto na “operação” da gaivota Wilbur.
O desenho de Thomas Schumacher apresenta beleza estética e detalhismo, mas a história é extremamente forçada. Mesmo tratando-se de filme infantil há muita coisa difícil de engolir. O garoto australiano Cody, paladino da natureza, supostamente o herói, afasta-se sozinho da casa da mãe, à beira do deserto, e se mete a escalar paredões assustadores sem equipamento. Quase todos os bichos conversam normalmente com ele, só a iguana e a águia aparentemente não possuem o dom da fala. A águia marahute é grande demais, um exagêro. O vilão é meio assustador para as crianças pequenas; mas é um adversário isolado diante de toda a coligação que se forma contra ele; a pouco leal iguana Joana é sua única aliada.
Esta foi a primeira vez que uma animação longa dos Estúdios Disney teve continuação com outra, destinada aos cinemas. O filme original, “The rescuers” (Os salvadores) ou, no Brasil, “Bernardo e Bianca”, de Ron Miller (1977) era consideravelmente melhor. É claro, a história é infantil e precisamos engolir a organização dos ratinhos, sediada nos porões da ONU e que curiosamente se dedica a salvar crianças da raça humana — a mesma raça que persegue os ratos implacavelmente. Eles contam com aliados de outras espécies e viajam no avião-gaivota Wilbur, gaiato como outros personagens da trama.
O título original poderia ser livremente traduzido por “Os salvadores viajam para o sul” (Austrália), ou seja, uma pobreza. Mesmo assim o título colocado em português, “Bernardo e Bianca na terra dos cangurus”, soa como um insulto ao povo australiano. Aliás quase não tem canguru na história.
Contudo há uma mensagem contundente em favor da vida e contra a caça predatória e dizimação das espécies. McLeach é um sujeito mau, mesmo — e assim costumam ser os que destroem a natureza.
Uma boa tirada de humor é quando o vilão, querendo se dizer esperto, lembra ter estudado “até a terceira”.
No fim fica uma ponta solta: o destino dos animais que McLeach mantinha em cativeiro.
E quanto aos dois protagonistas Bernardo e Bianca? Eles não conseguem se destacar muito e o que sobressai ao longo de toda a película é a timidez de Bernardo e as suas desajeitadas tentativas de se declarar a Bianca e oferecer-lhe o anel de noivado.

Rio de Janeiro, 11 e 12 de maio de 2018.