OS HOMENS QUE EU TIVE (1973)

Aproveitando meu estado oficializado de quarentena (eu já vivo numa quarentena auto imposta) estive garimpando na internet, à procura de alguma das velhas pornochanchadas, aquelas produções baratas e independentes, produzidas na boca do lixo, com forte apelo sexual e que fazia a alegria dos jovens na década de 70 e começo dos anos 80. Nessa busca, acabei me deparando com um filme de 1973, OS HOMENS QUE EU TIVE, que não é uma pornochanchada, apesar de ter certo apelo sexual. Diferente das produções dessa categoria, que apresentam histórias simples, impregnadas de humor, com ênfase no tema sexual, OS HOMENS QUE EU TIVE traz uma trama um pouco mais complexa, colocando em relevo o drama pessoal da personagem, que leva uma vida inadequada aos padrões de comportamento impostos pela sociedade.

Pity (Darlene Glória) é uma mulher que mantém com Dode (Gracindo Junior) um casamento liberal. Ambos têm relacionamentos extra conjugais com tácita aquiescência mútua, a ponto de Sílvio (Gabriel Arcanjo), amante de Pity, a convite desta, ir morar com o casal. Certo dia Dode ouve a confissão de sua esposa de que está apaixonada por Peter, um rapaz com quem ela trabalha e também se relaciona amorosamente. Os dois acabam brigando, levando Pity a sair de casa e ir viver com o homem por quem agora nutre um amor irresistível.

Dirigido por Teresa Trautman, OS HOMENS QUE EU TIVE conseguiu ficar em cartaz por apenas seis semanas. A ditadura militar proibiu sua exibição por “atentar contra a moral e os bons costumes”, sendo liberado só sete anos mais tarde, em 1980, com o título OS HOMENS E EU.

Embora em consonância com o discurso feminista, por abordar temas como o amor livre e a liberdade sexual da mulher, o filme de Trautman não pretende levantar nenhuma bandeira ideológica, ainda que caminhe nesse viés. O longa nada mais é do que um tratado sobre a individualidade e a liberdade. Não obstante lide com temas ideológicos, não faz isso com pretensões de convencimento, de proselitismo. Os tópicos polêmicos, tratados na história, são completamente naturalizados dentro da narrativa. A personagem Pity, com seu comportamento heterodoxo, contrariando os padrões pré- estabelecidos, dialoga naturalmente com o movimento hippie, ainda em voga na época do filme. No entanto ela não se coloca como uma representante de nenhuma minoria ou defensora de qualquer ideologia de gênero. Ela é apenas uma mulher à deriva na sociedade, vivendo sob suas próprias convicções e agindo por si mesma.

OS HOMENS QUE EU TIVE é uma obra que nos leva a refletir sobre liberdade e individualidade, sobre como estamos presos nessa malha que condiciona nosso comportamento, que nos obriga a agir exatamente como a maioria deseja, que nos faz ser, ao mesmo tempo, vítima e verdugo da sociedade. É com certeza uma verdadeira pérola de nosso cinema.

Bia Borges
Enviado por Bia Borges em 02/04/2020
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