POR UNS DÓLARES A MAIS, resenha

POR UNS DÓLARES A MAIS, resenha
Miguel Carqueija

Resenha do filme “Por uns dólares a mais” (Per qualche dollaro in piú). Itália, Produzione Europee Associati, United Artists, 1965. Produção: Alberto Grimaldi. Direção: Sergio Leone. Roteiro: Sergio Leone, Fulvio Morsella, Luciano Vincenzoni, Sergio Donati, Enzo Dell’Aquila e Fernando di Leo. Música: Ennio Morricone. Fotografia: Massimo Dalamano. Com Clint Eastwood, Lee Van Cleef, Gian Maria Volonte, Mara Krup, Luigi Pistilli, Klaus Kinski, Joseph Egger, Panos Papadopolus, Benito Stefanelli, Roberto Camardiel, Aldo Sambrell, Luis Rodrigues e Mario Brega. 132 minutos.

O faroeste italiano se popularizou da década de 1960, não sei se tem antecedentes, mas a sua característica principal é o aspecto mais “sujo”, digamos, como ausência dos “mocinhos” heroicos, aspecto mais desleixado dos personagens (como barbas por fazer, o que aliás combina com a rusticidade do ambiente), o grau elevado de violência. Os protagonistas tendem ao cinismo.
Embora a crítica da época não olhasse os “spaguetti-westerns” como eram conhecidos, com bons olhos, o diretor Sergio Leone acabou se consagrando e realmente, por esta amostra, ele era um cineasta competente. Os personagens são bem delineados, há cenas interessantíssimas, o clima fatídico é mantido do início ao fim. É claro, não é uma história edificante. Os supostos heróis, Monco e o Coronel Mortimer (Eastwood e Lee Van Cleef) não passam de caçadores de recompensas pouco escrupulosos que caçam um bandoleiro conhecido como Indio (Volonté), que chefia uma quadrilha numerosa, quinze elementos, e que realiza um audacioso roubo a banco.
Mortimer é frio, concentrado, sinistro. Ele na verdade, no caso específico, não está somente atrás de recompensa, mas tem contas a ajustar com Indio. Tendo lutado na guerra civil, Mortimer sabe atirar muito bem com vários tipos de armas. Monco também é frio e capaz de matar facilmente. Eles têm seu egoísmo também e vêem-se mutuamente como empecilhos. Mesmo assim, pela dificuldade em enfrentar uma quadrilha com quinze membros, depois de tentarem intimidar um ao outro acabam fazendo uma aliança meio frágil. No decorrer da trama terminam mais amigos porém nem por isso ficam juntos.
Então, a rigor ninguém presta na película, embora os espectadores sejam levados a torcer pela dupla. Lee Van Cleef interpreta muito bem o fleumático mas mortífero coronel, com seu cachimbo e seus truques. Clint Eastwood também está ótimo no seu papel de anti-herói, que não é a mesma coisa que vilão. O anti-herói combate os vilões mas ele é, em si, um herói às avessas, por não seguir os códigos de ética dos heróis. Assim, eles matam sem remorso e sem compaixão pelos inimigos, e como os inimigos são piores do que eles, os espectadores também não têm pena.
Assim, embora muito bem feito, este faroeste reflete faces desagradáveis dos seres humanos.
Existem pontos fracos na trama. Por exemplo, o sumiço dos habitantes do vilarejo onde se dão os derradeiros confrontos. E a incoerência de serem os dois caçadores de recompensa capturados e não mortos: são apenas espancados e aprisionados. Isso permite que depois escapem e não pouparão os bandidos. Ou seja, os bandidos não seguem sua própria lógica e tardiamente tentarão matar a dupla.
Charme à parte é a música assobiada do famoso Ennio Morricone, recentemente falecido. Morricone é autor de notáveis trilhas sonoras de faroestes italianos.

Rio de Janeiro, 18 de novembro de 2020.