Filme: “ Janela da Alma”

“Como é o lugar

Quando ninguém passa por ele?

Existem as coisas

Sem se vistas?”

Carlos D. de Andrade

Refletindo nas palavras acima de Carlos D.de Andrade e fazendo uma analogia com o filme “Janela da Alma”, percebe-se que o lugar existe e as coisas também mesmo sem terem sido vistas com os olhos do corpo. Como escreve, Juvenal Ardiuni (1977:139):

O olhar é muito mais do que função fisiopsicológica.

É uma linguagem forte. É um universo carregado de

sentido. É condensação do mistério do homem. Relata destino de muita gente.Provoca alterações decisivas na vida.

... O olhar é, em grande parte, a morada do homem.

Assim sendo, o olhar, a grande morada do homem, não se pode restringir ao olhar pelo sentido da visão apenas, ele vai além disso. Para nós, portadores do órgão da visão sem mutilações, isso tem uma dimensão ampliada por poder registrar forma, luz, cor e movimento, ou seja, a imagem falada e significada. Porém, para os portadores de deficiência visual, a dimensão desse olhar é outra. Os “anjos” que para nós são pessoas de intenções e valores bons, e representativos palpáveis, para eles são mesmos “anjos” no cerne da palavra.

O anjo possui duas asas, mas ele só se equilibra no tráfego do “reino do céu”, quando ambas estão perfeitamente iguais ou uniformes, porquanto a asa direita simboliza o intelecto ou a razão, e a esquerda o coração ou o sentimento. Ramatis

São anjos mediadores. Mediadores da representação concreta que passa a ser imagem construída e não visualizada. Então, eles não vêem imagens, fazem imagens e sonham com imagens.

Mas nada é construído aleatoriamente, já que somos seres complexos e interligados internamente. Cristo, uma vez afirmou:

O que tem ouvidos para ouvir, ouça. (Mt 11,15)

E sabemos que há vários modos de ouvir, e conseqüentemente vários tipos de surdez. Por que ouvir relacionado com ver? Felizmente alguns portadores de deficiência visual conseguem “ver com ouvidos”. A linguagem aqui ouvida permite ao homem situar-se no mundo, perceber a situação do universo no seu conjunto, levando o próprio ouvinte a inserir-se no ambiente físico e social, fazendo uma correspondência entre a consciência pessoal e o mundo da experiência.(Arduini, 1977:184).

Ao ouvir a palavra, ela se torna visível, mesmo sendo cega. Torna-se individualizada e internaliza ganhando aqui o espaço de ser proferida pela pessoa que a possui não permitindo assim que o outro fale a sua língua e “construa” as suas imagens.

Porém,

Não são as palavras que valem, e , sim, a vibração que há nas palavras. Mikhail Naimy

A vibração da palavra é revestida de emoção. Emoção que faz o diferencial. Que eleva as diversas criaturas a lugares desconhecidos e misteriosos. Que reverte as imagens, os sons, as palavras. Que supostamente pode fazer da janela que não olha, o elo do olhar através da janela, da janela da alma.

Scheilla Oliveira
Enviado por Scheilla Oliveira em 24/11/2007
Reeditado em 07/07/2013
Código do texto: T749865
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