PELÉ, ETERNO

PELÉ ETERNO

- documentário de Aníbal Massaini Neto -

por Flávio MPinto

Quem não viu o Rei do Futebol em campo , poderá ver um pouco do seu talento neste belíssimo documentário. Que Pelé é eterno todos sabem, e quem teve a oportunidade de vê-lo ao vivo e a cores, agora se regojiza com a película.

Reconhecidamente o Brasil é um país que sempre procura destruir seus ídolos. Os americanos não cansam de destruir, nos seus filmes, os monumentos que construíram e os brasileiros, já na real, seus ídolos. Assim foi com Ayrton Senna, Roberto Carlos, Falcão, Emerson Fittipaldi, Piquet, todos atingidos na sua honra pessoal no intuito de diminuí-los como homens. Pelé escapou , mas tentaram ridicularizá-lo em duas afirmações: uma na comemoração do 1000º gol, quando apelou para que “ cuidassem das crianças” e depois , quando falou que “ brasileiro não sabe votar “. Em ambas a história lhe deu soberbas razões.

PELÉ ETERNO, de Aníbal Massaini Neto é um primor de documentário e deixa o povo brasileiro com a alma lavada e enxaguada com a magnitude do projeto. Está á altura do reinado do maior craque de futebol do planeta, o Atleta do Século(20), o único que conseguiu parar uma guerra , o único que fez a torcida expulsar o árbitro e recolocá-lo em campo, o único em tantas coisas que fica difícil relacionar e apresentar. Apenas Rei Pelé. Michael Jordan estaria no mesmo patamar técnico se não tentasse voltar mais duas vezes após se aposentar no auge da carreira.

O Edson Arantes do Nascimento necessitava de uma obra desse porte para definitivamente gravar imagem de Pelé no mundo e mostrar que, o que sempre foi dito ás gerações mais jovens, não era invenção. Aliás, Gérson, o Canhotinha de Ouro, teve uma mostra da inteligência e do raciocínio do Rei em campo, quando inquiriu, no intervalo do jogo por sua tranqüilidade, após receber seu lançamento, ao matar a bola no peito e chutar para empatar com Tchecoslováquia em 70 no México com o zagueiro no seu cangote. Pelé respondeu que ao correr para receber a bola, viu o zagueiro se antecipar e saltar com o pé que não era o de impulsão. Logicamente cairia desequilibrado e não teria condições de voltar para bloqueá-lo. Isto Pelé anteviu. Gérson entendeu e não dá para discutir com o Negão, disse como se referia ao rei Pelé. Naquela fração de tempo toda a genialidade se fez presente em lances indescritíveis e impossíveis de ver hoje. Quem entende de futebol sabe. O scout computadorizado, com todas as características dos jogadores e jogadas do adversário, manuseado pelas equipes de voleibol de hoje, era feito na cabeça do Pelé no campo de futebol, futebolísticamente. E tudo era acompanhado do equivalente treinamento individual técnico e físico até a exaustão, pois sua genialidade com a bola não seria suficiente se não tivesse preparo físico adequado e um repertório de dribles constantemente aperfeiçoados. Isto ele sabia e treinava muito. Até para suportar a extrema violência com que era tratado em campo. Nunca um jogador de futebol foi tão marcado, caçado, perseguido, chutado, agarrado, por zagueiros, meio campistas e até goleiros. Mazurkievtz que o diga: anda atrás dele até hoje. Pena que a bola não entrou. Neste aspecto da violência, o filme mostra a Copa do Mundo da Inglaterra, onde Portugal, agora tão endeusada, dirigida por um brasileiro, promoveu uma caçada sem precedentes no esporte mundial a um praticante. É certo que sob os olhares complacentes do juiz. Não ficam impunes , também, as disputas das Libertadores da América que, sem TV, valia tudo, tudo mesmo e os nossos vizinhos se aproveitavam. Gremistas -remember La Plata 82 ?. Depois que a telinha começou a mostrar ao vivo as partidas muita coisa mudou e basta ver como anda a celeste olímpica...

Pelé elevou aos patamares da arte a técnica futebolística em respeito ao público, principalmente, não se cansava de declarar. Obviamente teve uma turma de coadjuvantes , não no seu nível, mas bem acima da média de quem não integrava o onze santista. Dorval, Coutinho, Mengálvio, Mauro, Zito, Gilmar, Pepe, dentre outros, sim, os verdadeiros e únicos galácticos.

Fez muito bem a direção do filme em mostrar o famoso gol contra o Juventus em computação gráfica, pois outro jogador não teria a autorização para representar o papel dignamente.

Nesta época de Olimpíadas na Grécia, gostaria que Pelé tivesse nascido no auge da mitologia grega, pois assim poderíamos explicar,com maior facilidade,sua atuação nas quatro linhas.

Eu, daqui, relembro uma cena que o Tôto me contou e que poderia estar no filme. Foi naquele famoso jogo Santos e Peñarol, naquele tempo do vale tudo na Libertadores. O estádio Centenário cheio, não cabia nem uma agulha, de acordo com o amigo Tôto e ele lá, torcendo. Se não me falha a memória, foi 2 a 1 para os castelhanos que ganharam bem á sua maneira. Quase na virada dos 90’, Pelé embraveceu de tanto levar socos, pontapés, chutes , agarrões, gravatas impunemente, e saiu driblando todo time uruguaio. Ia entrar com bola e tudo, mas quando a dita ia passar a linha fatal, o juiz terminou a peleja correndo direto para o túnel com todo time santista atrás. Que coisa. Essa era a Libertadores de antigamente. Mas a cena do Tôto ocorreu no início: após a tradicional saudação santista, como verdadeiros artistas, de mãos dadas inclinavam o corpo saudando o público. Pelé ao levantar a cabeça gritou lá do centro do gramado- E aí, Tôto!

Mais do que aquelas bolas que não entraram nas traves de Tchecoslováquia, de Petras, Victor, e Uruguai na Copa de 70, um embate que gostaria de ter visto seria o Rei Pelé contra a Laranja Mecânica em 74. Acho que uma das armas daquela fantástica equipe holandesa , talvez sua maior arma defensiva, seria guardada logo após o encontro nos gramados com o Rei do Futebol. Me refiro a tática do Impedimento Forçado. Apanhariam o Rei uma vez só, sem sombras de dúvidas, assim como foi aquele famoso drible no Airton Pavilhão, pois na próxima, iria entrar com bola e tudo, tendo, provavelmente, a partir do meio campo, só o goleiro pela frente!

Essa crítica é uma homenagem aos 102 anos de história do EC 14 de Julho, o Leão da Fronteira, que nunca perdeu para o Santos, e a meu pai, Bino, que jogou naquela máquina de fazer gols, pouco antes da era Pelé.