FICHAMENTO DO LIVRO DE MÍRIAN GOLDENBERG - A ARTE DE PESQUISAR

GOLDENBERG, Mírian. A arte de pesquisar: como fazer pesquisa qualitativa em ciências sociais. Rio de Janeiro: Record, 2007.

A autora construiu seu livro a partir de uma visão esclarecedora de como criar um "olhar científico" quanto a construção de uma pesquisa científica e mostra as origens da pesquisa qualitativa nas ciências sociais citando a escola de Chicago (departamento de antropologia e sociologia) como uma forte aliada para a disseminar a pesquisa qualitativa como fonte positiva de coleta de dados, a partir de estudos diferentes realizados por diversos autores.

Explica que a escola de Chicago é "um conjunto de pesquisas realizadas, a partir da perspectiva interacionista [...], envolvendo, principalmente, a sociologia, a antropologia, a ciência política, a psicologia e a filosofia". (p. 25). A partir de 1929, os departamentos de antropologia e sociologia separaram-se, até esse período, as pesquisas etnográficas (descrição de povos, sua raça, língua, e de sua cultura material)1, contribuíram para validar a pesquisa qualitativa na pesquisa sociológica.

Mostrou que uma pesquisa qualitativa precisa estar amparada por pelo menos um método de coleta de dados tais como o estudo de caso, o método bibliográfico, a entrevista, o questionário e a observação.

Depois mostra a interação entre análise quantitativa e qualitativa, mostra que é possível se fazer uma pesquisa utilizando as duas técnicas devido se poder fazer um "cruzamento" de informações para se chegar a um ponto comum. Ou seja, não há limites para utilização de coleta de dados, "a combinação de métodos é conhecida como 'triangulação' que é um método emprestado de estratégia militar e da navegação, que se utilizam de múltiplos pontos de referência para localizar a posição exata de um objeto". (p. 63).

A autora (p.71) mostra como construir os argumentos para pesquisa, tal como sua construção, mostra que o primeiro passo é tornar o problema concreto, através de:

1. Dar imersão sistemática no assunto;

2. Do estudo da literatura existente;

3. Da discussão com pessoas que acumularam experiência na prática no campo de estudo.

E aponta que ao escolher o objeto de estudo, o pesquisador deve pensar:

1. Como identificar um tema preciso;

2. Como escolher e organizar o tempo de trabalhar;

3. Como realizar a pesquisa bibliográfica (revisão de literatura);

4. Como organizar e analisar o material selecionado;

5. Como fazer com que o leitor compreenda o seu estudo e possa e correr à mesma documentação caso retorne a pesquisa, (fichamento).

Ao explanar todo o processo de construção de uma pesquisa qualitativa, a autora chama a atenção para a análise e o relatório final. Pois é neste estágio que o pesquisador terá que compilar todas as informações obtidas durante a pesquisa e fazer uma comparação analítica sobre os dados revelados.

Goldemberg (p. 95) elenca o cronograma de um relatório de pesquisa, a saber:

1. Capa (dedicatória, agradecimentos, resumo, epígrafe)

2. Sumario;

3. Introdução (Objetivos, Hipótese, Público alvo, Motivo)

4. Justificativa;

5. Discussão teórica;

6. Descrição do plano de estudo e do método de coleta de dados;

7. Apresentação dos resultados;

8. Análise, interpretação e conclusão;

9. Referência bibliográfica;

10. Anexos.

O relatório é onde se fará toda a união das informações obtidas durante a pesquisa, seja qualquer tipo de coleta de dados, o relatório deve conter: (p.97).

1. Apresentação do problema, para esclarecimento das razões da pesquisa, (um breve resumo de outras pesquisas significativas), hipóteses do estudo e as definições dos principais conceitos ou categorias;

2. Os processos de pesquisa, planejamento do estudo, técnica de coleta de dados e o método de análise empregada. (se houver questionário ou entrevistas, estes devem estar nos anexos);

3. Resultados, isso quer dizer que terá que estar no relatório todos os fatores que nortearam a pesquisa, os positivos e os negativos, as dificuldades e os objetivos alcançados;

4. As conseqüências dos resultados. Perguntas que não foram respondidas e sugestões de novos estudos;

5. Principais conclusões.

Ao se tratar da construção de um projeto de pesquisa existem as seguintes etapas (p. 75):

1. O problema que exige respostas deve ser delimitado dentro de um campo de estudo;

2. A tarefa de pesquisa precisa ser reduzida ao que é possível se realizar pelo pesquisador;

3. É preciso evitar que a coleta de dados seja feita de forma a favorecer uma determinada resposta;

4. É preciso definir os conceitos que serão usados;

5. É necessário prever as etapas do processo de pesquisa, mesmo sabendo que elas poderão ser reformuladas.

Os passos da pesquisa são (p. 78):

1. Escolha um tema;

2. Delimitação do problema;

3. Definição dos objetos a serem pesquisados;

4. Objetivos;

5. Construção do referencial teórico(leituras de livros);

6. Formulação da hipótese;

7. Elaboração dos instrumentos de coleta de dados.

No que se refere a entrevista esta é uma ferramenta da pesquisa qualitativa, sua estrutura é (p.86):

1. Padronizada, as perguntas são apresentadas a todas as pessoas exatamente iguais, na mesma ordem e podem ser do tipo:

- Fechada – as respostas são limitadas às alternativas apresentadas. São padronizadas, facilmente aplicáveis, analisáveis e pouco despendiosa.

- Abertas – resposta livre, não-limitada, o pesquisador fala ou escreve livremente sobre o tema, a análise é mais difícil.

2. Podem ser assistemáticas – solicitam respostas espontâneas, não-dirigidas pelo pesquisador, a análise é muito mais difícil.

3. Entrevista projetiva – utiliza recursos visuais (quadros, pinturas, fotos) para estimular a resposta.

O objetivo da autora é mostrar as diferenças entre pesquisa qualitativa e quantitativa e suas especificidades sob a luz das sociologias positivista, compreensiva e interpretativa.

Para isso, Goldenberg se valeu das teorias de Comte, que é o fundador do positivismo, este "defendia a unidade de todas as ciências e a aplicação da abordagem científica na realidade social humana". E complementa: "Comte estabeleceu uma hierarquia das ciências em que a matemática ocupava o primeiro lugar e a sociologia ou 'física social' o último[...]". Colocando a pesquisa como uma "atividade neutra e objetiva, que busca descobrir regularidades ou leis, em que o pesquisador não pode fazer julgamentos nem permitir que seus preconceitos e crenças contaminem a pesquisa". (p.17).

Outro autor citado foi Émile durkhein, que também foi a favor dessa unidade "tomando os fatos sociais como coisas" ele "defendia que o social era real e externo ao indivíduo, ou seja, o fenômeno social, como fenômeno físico, é independente da consciência humana e verificável através da experiência dos sentidos e da observação". (p.17). Suas idéias foram decisivas para que as duas ciências tivessem o mesmo padrão de pesquisa.

Goldenberg também citou Kant, idealista que influenciou outros teóricos que se opunham ao modelo "positivista de conhecimento aplicado às ciências sociais [...]", tal como Wilhelm Dilthey filósofo alemão adepto da sociologia compreensiva, defendeu que "cada ciência tinha seu objeto de estudo, podendo assim não utilizar a mesma técnica de pesquisa".

Para Wilhelm Dilthey, os objetos de pesquisa das Ciências Sociais são de origem emocional, valorativa e subjetiva, "se preocupa com a compreensão de casos particulares e não com a formulação de leis generalizantes" (p.19). Diferentemente das Ciências Naturais que são "externos passíveis de serem conhecidos de forma objetiva".

Existem dois conceitos que diferencia o método das Ciências Naturais -ERKLAREN, que busca generalizações e a descoberta de regularidades do das Ciências Sociais - VERSTEHEN, que visa à compreensão interpretativa das experiências dos indivíduos dentro do contexto em que foram vivenciadas. Como o maior representante da sociologia compreensiva, Max Weber, se apropriou da idéia de VERSTEHEN, que acreditava "que o principal interesse da Ciência social é o comportamento significativo dos indivíduos engajados na ação social, ou seja, o comportamento ao qual os indivíduos agregam significado considerando o comportamento de outros indivíduos". (p.19).

Outros nomes citados no trabalho de Goldenberg foram:

1. Frederic Le Play, este "foi um dos primeiros a estudar a realidade social dentro de uma perspectiva científica que considerava a observação direta controlável e objetiva da sociedade como o método mais adequado á pesquisa social". E complementa, "Ele expõe o método das monografias, que se caracteriza por ser uma técnica ordenada e metódica, de observação direta da sociedade [...]".(p.19/20).

2. Lewis Henry Morgan, primeiro antropólogo que utilizou o método etnográfico (estudo da cultura dos povos ou raça, língua etc), em sua pesquisa, era um evolucionista.

3. Franz Boas, geólogo, crítico antropológico evolucionista, utilizou como técnica, o trabalho de campo.

4. Malinowski, considerado o pai do funcionalismo, fez uma expedição nas ilhas Trobriand, "acreditava que cada cultura tem como função a satisfação das necessidades básicas dos indivíduos que a compões, criando instituições capazes de responder a estas Necessidades". (p.22).

5. Clifford Geertz, principal representante da "abordagem interpretativa, que propõe um modelo de análise cultural hermenêutico: o antropólogo deve fazer uma descrição em profundidade(descrição densa) das culturas como 'textos' vividos, como teias de significados que devem ser interpretadas". Geertz, "inspirou a tendência atual da chamada 'antropologia reflexiva' ou 'pós-interpretaiva'". (p.23).

Outro aspecto da pesquisa qualitativa é o interacionismo simbólico, este "exercia uma profunda influência sobre a sociologia de Chicago, através da presença de Georde Herbert Mead (pai do interacionismo) e do filósofo americano, John Dewey, [...], que trouxe para o interacionismo a pragmatismo, uma filosofia de intervenção social que postula que o pesquisador deve estar envolvido com a vida de sua cidade e se interessar por sua transformação social". (p.26), e "destaca a importância do indivíduo como intérprete do mundo que o cerca [...]". (p. 27).

Mas a autora adverte que "o interacionismo simbólico, ao contrário da concepção durkheimiana, que defende que as manifestações subjetivas não pertencem ao domínio da sociologia, afirma que é a concepção que os indivíduos têm do mundo social que constitui o objeto essencial da pesquisa sociológica". (p. 27).

Essa abordagem se fez necessário para que compreenda-se que existe uma diferença entre um tipo de pesquisa e outro, como também para contextualizar o surgimento e o desenvolvimento dos métodos de pesquisa qualitativas.

Em suma, Goldenberg explicou muito bem o que é uma pesquisa qualitativa, seus passos, suas dificuldades, enfim, todo o processo. Tudo isso amparada por diversas teorias as quais levaram a validação de seu trabalho. Esta obra é rica em informações e muito útil para aqueles que estão ingressando na pesquisa.

benna bandeira
Enviado por benna bandeira em 05/12/2008
Reeditado em 05/12/2008
Código do texto: T1320736
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