"A loja de pianos da Rive Gauche"

“A loja de pianos da Rive Gauche” T.E.Carhart

Um americano radicado em Paris passeia pelas redondezas de sua residência e é atraído por uma pequena loja repleta de peças para piano, tais como pedais, cordas, teclas, tampos e feltros. Senta-se à mesa de um café de onde pode observá-la melhor. Pensa em algum pretexto para entrar na loja e lhe vem, de assalto, a idéia de retomar seus estudos de piano que abandonara na juventude.

Para tanto seria necessária a aquisição do instrumento. Encontra então a senha para adentrar-se na lojinha que tanta curiosidade lhe desperta.

O americano é o próprio autor, T. E. Carhart que, com uma prosa delicada e sensível, narra neste livro sua história de paixão por este complexo instrumento – “uma harpa dentro de uma caixa”- segundo o poeta inglês Leigh Hunt.

A editora Record não dá o crédito da capa, uma interessante foto, meio Kafkiana, da ruela estreita e antiga, onde se destaca a placa com o nome da loja, Desforges.

Quando Carhart passa a freqüentá-la vai descobrindo tratar-se não só de uma loja destinada a consertos e reformas de pianos, mas de uma espécie de confraria cujos membros são aficionados por música.

Lá encontra os mais diversos exemplares de pianos, vindos de vários lugares, de épocas remotas e de diferentes marcas como Erard, Pleyel, Steinway, Bechstein, e outros. Na descrição dos pianos, Carhart lhes atribui personalidades que variam de acordo com o tipo de madeira, de caudas ou meias-caudas, de armários e talhas. Assim, temos os pianos sisudos e os alegres, os solenes e os informais, os bons e os medíocres.

Um piano, para estar e manter-se vivo, deve ser tocado. Conclui que é melhor um piano mal tocado que nunca tocado. Dedilhar suas teclas prolonga-lhe a vida, lição que aprendera com Luc, funcionário e especialista nos mecanismos da “harpa”.

O americano encontra seu piano, retoma seus estudos e relembra as primeiras experiências com este instrumento. Primeiro, aos cinco anos, na França. Depois, aos oito, na América do Norte. Estas lembranças nos revelam como a formação musical em Conservatórios nos EUA, década de 60, seguiam um método bastante semelhante ao adotado aqui na mesma década. Remeteu-me aos meus próprios estudos, na infância, em uma pequena cidade do interior do Paraná!

Hanon era, para sua professora americana, a bíblia de estudos técnicos. E o mico de apresentação para convidados, os próprios pais e familiares de todos os alunos, ao final do ano, também acontecia do outro lado do oceano. Divertidas estas lembranças.

T. E. Carhart nos remete tanto à história da música clássica, quanto à história do piano como instrumento; nos dá como referência de seu aparecimento, o ano de 1694, e seu inventor, o florentino Bartolomeo Cristofori.. Descreve o aperfeiçoamento pelo qual o piano foi passando e sua repercussão nos meios musicais com as novas composições feitas para ele, como as sonatas de Haydn e Mozart.

Um livro para saborear ao som de um piano qualquer da vizinhança, com intervalos para dar atenção exclusiva a este som, imaginar quem o produz, identificar uma sonata, esperar pelo acorde que virá ao final de uma execução. E retomar a leitura, ávido de notas de música e sensibilidade.