Lendo e comentando 1 - Tempo acesso, livro de Perpetua Flores

Obra “Tempo aceso”/poesia, 2008

DE PERPÉTUA FLORES

A POESIA ACESA PELO FOGO DA CRIATIVIDADE

por Antonio Soares

Perpétua Flores, gaúcha de Santo Ângelo/RS, radicada em Buenos Aires. Com vasta produção, incluindo a difícil crítica literária. Recém editou Tempo aceso, obra em que reune algumas dezenas de poemas.

A imediata impressão que a leitura de seu texto comunica ao leitor, recai naquela pujança ou força torrencial de criar textos. Seus poemas transpiram energia. Perpétua maneja com extremados engenho e arte os sentimentos, emoções ou forças psíquicas, e ainda recria poemas e textos sobre textos, como se fôra estrategista do próprio texto. O efeito está naqueles corpozinhos de es-plendorosa volubilidade que são os poemas.

Nas suas breves palavras intro-dutórias, ela identifica de imediato o processamento desta pujança caudalosa, nem intuída por quem lhe escreve abas, introdução ou contra-capa. É como se o coração se adiantasse ao sentimento - ela o insinua. Ou a um ato de seduzir o poema já feito para se criar um novo poema. Nisto o que ela chama de prodígio da criação poética. Donde se torna claro que o coração ou sentimento se volve sobre o poema já feito, o seduz, o acende em novo fogo, disso resultando um novo e outro momento ou tempo. Justíssimo o título de tempo aceso. Haja surtos criativos, haja momentos de êxtases, haja impulsos ativados e reativados para consumar o ato poemático.

Porém, não basta ser senhor ou detentor desta força torrencial do sentimento ou do coração. É preciso que essa força se torne ou se constitua num poema. Um grande choro não é poema, nem mesmo a fala ou desabafo que se veicula para outrem que dá apoio. Tornar-se-á poema quando esse muito choro se objetiva ou se torna em linguagem bem pessoal, nítida, original e bem constituída. A Perpétua Flores deram os deuses tanto a pujança torrencial de um sentimento sempre em renovados surtos de efervescência como o bom gosto de tecer uma linguagem poética.

Na obra encontramos poemas dos mais variados matizes, revelando uma extraordinária potencialidade. Poemas que vão de uma página (apenas um atinge as 4 páginas) até ao poema de três, dois e até um verso. Pelo menos oito poemas são constituídos por título e um verso. Aquilo que tanto glorifica poetas como Fernando Pessoa na facilidade de conseguir o verso ao estilo epitáfico, isso é comum em Perpétua. Um poder de fechar o verso, de prescindir de liames ou vínculos coordenados ou subordinados. Seguem-se dois poemas de (1) um verso:

1 - Assobio:

Música surrealista.

2 - Ventilador de teto (2)

Cativa roda dos ventos.

Como se vê, o verso explicita o sentido do título, firmando a criatividade, acumulando e su-perpondo sentidos e conteúdos.

Tanta lição e firmeza a dar às nossas poetas que se refestelam numa poesia improvisada, sem firmeza de verso, sem ritmo versificatório, reduzida a um fraseado sem nada de bom gosto.

Leiam, estudem, analisem esta poeta gaúcha que, da Argentina, nos visita em corpo e em livro. Façam de Tempo aceso um manual de poesia. Antonio Soares