LUCÍOLA – JOSÉ DE ALENCAR

Ao terminar a leitura de um livro o que o leitor sente é uma profunda saudade dos personagens; foram horas viajadas, horas desbravando vidas no mais íntimo psicológico de pessoas que nunca se saberá se existiram ou não; horas de viagens a cenários pequenos como um quarto ou grandes como uma cidade. Com Lucíola, De José de Alencar, além desta saudade, destes cenários; o leitor sentirá ainda vontade de chorar; indignação e repulsa ao comportamento de uma sociedade de uma época determinada.

Em Lucíola o narrador personagem, Paulo Silva, conta através de cartas para uma senhora, descrita apenas por G.M; o caso amoroso dele (Paulo) com Lúcia; na época ele com vinte e cinco anos; ela com dezenove.

Até aí nada de novo. José de Alencar descreve até a moça como a mais bonita do Rio de Janeiro. O problema começa a agravar-se e encher a cabeça do leitor de questionamentos quando Alencar torna seus personagens um do outro, numa paixão estilo “Romeu e Julieta”, bem mais quente na verdade. Nada de novo, a não ser pelo fato de Lúcia ser uma prostituta de luxo.

Com descrições de uma mulher branca, olhos claros, cabelos ondulados e meio claros; meiga; apresentando sempre comportamento angelical e infantil, e sempre disposta a escravizar-se por Paulo; e por outro lado Paulo, com características de um homem um pouco mais maduro e que dificilmente consegue ficar um dia sem ver Lúcia, Alencar provoca confusões na cabeça do leitor, levando-o a se perguntar durante toda a obra por que Paulo não se casa com Lúcia e a tira de tal vida. Tal pergunta perdurará na cabeça do leitor durante toda a obra, e Alencar maltratará ainda mais o leitor mostrando situações econômicas das personagens: Lúcia é rica e Paulo mal começara a trabalhar; ainda por cima, as riquezas de Lúcia advêm dos seus casos.

Já quase ao término do enredo, depois de muito explanar sobre suas personagens; esquentar a paixão do casal, inclusive com narrativas de ciúmes de ambos os lados e um abandono de Lúcia à vida que leva por causa de seu amor a Paulo, José de Alencar ainda fará o leitor se perguntar por que Paulo não se casa com Lúcia e a tira de tal vida. Na verdade o que Alencar quer, é provar o quão são preconceituosos os homens e mulheres de uma determinada época (a vivida pelos personagens); preconceituosos até mesmo as mulheres, tendo em vista que em nenhum momento do enredo Lúcia pedirá que Paulo a assuma como esposa.

O desfecho de Lucíola dá-se quando Lúcia conta a Paulo porque se tornara prostituta; começa por dizer que seu nome verdadeiro nome não é Lúcia e sim Maria da Glória; e que tudo começou quando toda a sua família adoeceu por causa de uma epidemia de febre; só restando ela de pé a moça viu-se tentado por um senhor (Sr. Couto) que a ajudara à custa de um preço muito alto para a moça; a salvação da família resultou na sua expulsão de casa.

A fuga do preconceito citadino se dá quando as personagens saem do Rio de Janeiro e vão morar no interior; nesta altura Lúcia, Paulo e Ana de doze anos (irmã de Lúcia criada pela mesma, logo após a morte dos familiares. A moça não sabe que Lúcia é sua irmã). Os três vivem os melhores momentos de suas vidas até quando Lúcia pede para Paulo casar com Ana; os motivos citados por Lúcia: virgindade, beleza, dote e seria a única forma do casal continuar próximo um do outro. Logo em seguida Lúcia desmaia e com a visita do médico descobre que está grávida de Paulo e é necessário abortar, pois o feto já está morto; a personagem resiste e adoece. Nos delírios, o nome evocado é sempre o de Paulo.

Num dia desses de melhora, Lúcia insiste que Paulo case-se com Ana; com a recusa de Paulo o que Lúcia consegue é que ele pelo menos cuide da menina como pai; Lúcia vem a falecer logo em seguida.

A Romance Lucíola é intrigante, o leitor é chamado a ver os preconceitos de uma sociedade que induz seus membros a um estilo de vida e os pune caso aceitem viver esse estilo.

Os preconceitos expostos no livro estão longe de serem rompidos, prova disso é que o leitor sempre se colocará na pele de Paulo e se questionará se teria coragem, diante de amor tão grande, romper com toda uma estrutura virtual de valores de uma sociedade, que queira sim; queira não, ainda perduram nos dias atuais.

Por Isaac Sabino