Visita a Madrid e Toledo (extraído do livro Álbum de Recordações)

Madrid

Depois de minhas viagens à terra de Tio Sam, a Europa revelou-se o próximo destino internacional. Voei, inicialmente, para a Espanha. Viajei acompanhado da esposa e da filha mais nova.

Chegamos à capital madrilena às 16h00, hora local. Após o desembaraço da bagagem, ocupamos o apartamento do hotel onde passaríamos alguns dias hospedados.

Desfeitas as malas, sem descansar o corpo do vôo que nos trouxe de São Paulo, com escala na cidade de Porto, em Portugal, ganhamos as ruas. Saímos pela metrópole estranha, sem nada conhecer e com pouquíssimo conhecimento da língua espanhola.

Segundo a história, Madrid foi fundada na época da dominação árabe, por Mohamed I, Emir de Córdoba, que viveu entre 852 e 886. Inicialmente, ele construiu uma fortaleza árabe para defender Toledo dos leoneses e castelhanos.

Em 1085, Alfonso VI conquistou Toledo, capital espanhola da época. A partir daí, a cidade passou a ser administrada pelos cristãos. Em 1202, já sob domínio espanhol, Alfonso VIII concedeu à Madrid o título de vila; em maio de 1561, Felipe II a elevou à capital do Império.

Madrid possui ruas modernas e prédios centenários que compartilham o progresso ao lado de altos edifícios contemporâneos. É agradável passear pela cidade, conhecer seus monumentos históricos e apreciar a vida madrilena.

Aos poucos, fomos conhecendo a cidade:

O Palácio de Líria, construído no século XVIII; o complexo de Azca, de arquitetura moderna; a Praça do Oriente, expondo monumento a Felipe IV, ao centro; o Palácio Real e o do Marquês de Salamanca, este último ornamentado por linda fonte de águas cristalinas; igrejas centenárias, como a catedral de São Isidro, onde está sepultado o corpo do santo, patrono da cidade; as igrejas de São Francisco, o Grande; de São Jerônimo, construída no século XV; e muitas outras de iguais beleza e significação histórica.

Deslumbrei-me a cada momento.

Conheci a fachada dos prédios do Congresso dos Deputados, na Praça das Cortes, próximo o Palácio Real, cujo projeto foi concebido baseado nos palácios italianos do Quattrocento; o edifício do Senado, situado na Praça da Marinha Espanhola, expondo monumento a Cánovas Del Castilo, político do século XVII; a Biblioteca Municipal, com sua portaria em estilo barroco; a Bolsa de Comércio (Bolsa de Valores), de construção próxima à de sua congênere de Viena, na Áustria; as Portas de Alcalá e de Toledo, um dos principais monumentos da cidade...

Tomei um verdadeiro banho histórico e cultural. O maior de minha vida, até então. Em meus cinqüenta e seis anos, à época, jamais havia visto edifícios antigos de rara beleza e de tão impressionante conservação física. Foram superiores ao tempo. Resistiram às ações implacáveis da natureza e aos atos predatórios do homem. Do segundo, principalmente. Eu, pobre mortal, brasileiro de classe média, realizava visita ao Velho Mundo, iniciada pela Espanha.

Após algum descanso, porque ninguém é de ferro, fomos conhecer outros lugares, saborear a culinária espanhola na Plaza Mayor. Antes, visitamos a Porta do Sol, lugar apreciado pelos turistas.

A Plaza Mayor foi construída por Felipe III, erigida para valorizar o seu reinado. Conta com cento e trinta e seis lojas e quatrocentos e trinta e sete pequenos estabelecimentos comerciais; caracteriza-se por ser lugar de encontro e de passeios turísticos. No centro da praça está a estátua de Felipe III, esculpida por Pietro Tacca. Felipe III foi o primeiro rei da dinastia austríaca nascida na Espanha.

Falando dos atrativos que aguçam os prazeres da boa comida e de finas bebidas, destaco os frutos do mar e os vinhos. São muitos os restaurantes estabelecidos na Plaza Mayor, conhecidos por marisqueiras. Ali podem ser saboreados os mais variados pratos da culinária madrilena. Os frutos do mar abundam nos cardápios consultados e são servidos para serem provados às mesas expostas nas partes externas dos estabelecimentos, onde, ao som de excelente música, também pode ser degustado um saboroso vino rojo.

São delícias que me fizeram, anos depois, sentir água na boca e nos olhos – de sabor e de saudades!

Eis um fato inusitado: Em certo dia, fomos a um restaurante. Sentados à mesa, consultando o cardápio, não sei a qual de nós, se a minha mulher ou a filha, ou a mim próprio, uma palavra revelou-se estranha. O garçom ao lado, um peruano residente em Madrid, tentava explicar com palavras e gestos. Como continuávamos sem entender o que nos estava sendo oferecido para comer, o prestativo peruano juntou os braços, levantou-os e, baixando-os e subindo-os em movimentos sincronizados, cantou: “coró-cocó”. O esforço do amável garçom libertou-nos da ignorância. Todavia, como não havíamos viajado à Europa para comermos galinha, optamos por um prato mais sofisticado. Não lembro qual.

Deixamos Madrid depois de visitas aos exuberantes jardins do Campo Del Moro; ao monumento a Cristóvão Colombo, na praça que o homenageia e em que se vê uma cascata por onde escorrem águas cristalinas; à Fonte de Netuno, no Passo do Prado, com fontes e plantas bem cuidadas e excelente vista de parte da cidade.

Conhecermos a Praça de Touros, local de inesquecíveis touradas. A arquitetura data da colonização árabe. Ali, nos deixamos fotografar junto ao monumento de imponentes espécimes bovinos, de chifres pontiagudos, e a outros monumentos relativos às touradas. São excelentes obras de arte que teimam em não abandonar minhas lembranças.

Toledo

Em 09 de outubro de 1996, desembarcamos em Toledo, antiga capital espanhola. A cidade foi edificada às margens do rio Tejo, abriga castelos, muralhas, portas e pontes construídos para garantir a segurança ao longo dos séculos. Foi ocupada por invasores germanos, depois reconquistada dos Mouros por Alfonso VI, em 1085. Toledo tornou-se cidade imperial. São fartos os registros de suas ações militares datadas de centenas de anos.

A cidade expõe traços dos antigos invasores, além das inconfundíveis características árabes e judias, refletidas em sua arquitetura milenar. Portas e pontes são marcos de sua história. A Ponte San Martin dá acesso a Toledo através de uma porta em forma de arco, construída com blocos de pedras, contendo, na parte superior, um brasão bem elaborado e bonito.

A Porta Barroca de Alcântara também exibe um brasão de Toledo esculpido no alto. A Porta do Sol, erigida no século XIV é uma das mais representativas obras da arquitetura toledana. A Porta Nova de Bisagra, com seu escudo imperial estampado ao alto foi reconstruída em 1550, sobre as ruínas de uma porta edificada pelos antigos invasores árabes. Por essa porta passaram o rei Alfonso VI e o grande guerreiro espanhol El Cid.

Toledo foi a capital espiritual da Espanha. Os reis católicos desejavam ver o reino espanhol livre dos judeus e dos mouros, porém a cidade era aberta a todas as raças e a todos os cultos.

A fachada principal da catedral mede noventa metros de cúpula, teve início no século XV e somente foi concluída no século seguinte. Foi desenhada pelo filho de El Grego. O seu interior conta com cinco naves, a central com quarenta metros de altura. A harmonia das naves, os finos vitrais coloridos e o excelente trabalho realizado são complementados pela beleza e a arte dos entalhes e das esculturas nas paredes, de alto a baixo. Trata-se de uma gigantesca construção com dezenas de séculos; uma obra de engenharia monumental; uma arte deslumbrante; uma iluminação natural inteligente. Tudo, concebido pelos maiores mestres da arquitetura européia da época, contratados por Felipe III e por seus sucessores ao longo dos cento e sessenta anos de construção.

A Sala Capitular é a principal obra do conjunto. Os afrescos foram pintados por Juan de Borgonha. Descrever as preciosidades da catedral de Toledo é um cansativo prazer. Falar da beleza de La Custódia, obra de Enrique de Arfe, montada com 5.600 peças de prata maciça, ouro e pedras preciosas é um puro deleite que me ocorre à lembrança nesse momento em que contemplo sua magnífica fotografia.

La Custódia é o principal atrativo da catedral. Adicionado às obras e pinturas de Rubens, Belini, Reni e de outros famosos artistas, transformam aquele templo em um grande museu, onde podem ser apreciados o retrato de Paulo III, pintado por Tiziano, e a grande tela O Espólio de Cristo, de autoria de El Grego.

A catedral, à noite, é iluminada com singeleza, porém com extraordinário bom gosto. As luzes a fazem parecer um grande edifício dourado, com as duas cúpulas desafiando o firmamento; a maior mede noventa metros; a outra, quarenta.

Uma maravilha inigualável!

El Greco foi um grande mestre da pintura. Toledano por adoção, é autor de magníficas obras, abundantemente expostas à visitação pública. O turista poderá conhecer o seu ateliê, local de suas criações magistrais e recanto de suas geniais inspirações. Sua arte, porém, reflete certa tristeza. As cores usadas em suas obras tendem mais para o preto, principalmente a tela O Enterro do Conde de Orgaz. Não poderia ser diferente. Em qualquer cerimônia fúnebre o ambiente é mesmo triste e as cores perdem o encanto.

O Hospital de Santa Cruz de Mendonza, construído em estilo renascentista, impressiona por sua beleza e sofisticação arquitetônicas. As paredes, escadarias, arcos e portas são autêntica exposição de arte do século XIV.

O movimento intelectual renascentista, surgido em Florença, na Itália, por volta de 1420, modificou a tradição medieval não apenas renovando as artes plásticas como, também, a economia e a sociedade num mundo em constante transformação de grandeza e de valores.

Os estilos artísticos e arquitetônicos de Toledo são produto da mistura de raças que povoou a Espanha, entre elas a árabe, tendo os mouros se destacado por suas construções soberbamente projetadas e imponentemente executadas.

Em Madrid, as salas do Taller Del Moro refletem a criatividade e o bom gosto mourisco. A Estação Ferroviária – La Ferrocarril – também testemunha essas afirmações.

Conhecer a exuberância dessas construções, inteiramente conservadas, resistindo a centenas de anos, enriquece o passeio e justifica o dinheiro gasto na viagem.

Que experimente o leitor!

Ao fazê-lo, tenho certeza, confirmará as exaltações narradas nestas páginas, sob a égide de minha sinceridade e despretensiosa empolgação.

Amanhã, você, caro leitor, conhecerá um pouquinho de Barcelona. Não perca a oportunidade!