É tempo de desejar
O mercado editorial brasileiro vem assistindo a dois fenômenos por demais interessantes: o primeiro é o crescente número de autores novos que buscam seu lugar ao sol das letras; o segundo é o igualmente crescente aumento das editoras pequenas que já estão começando a preocupar as grandes detentoras do mercado.
Deixando o segundo fenômeno para uma crônica futura e procurando não me alongar em um assunto tão vasto quanto o primeiro, irei ater-me ao comentário de um livro que é um belo exemplo de ambos. Trata-se de Tempo desejo, de Carlos Costa.
Com belíssimo projeto da Editora Antigo Leblon e contando com as colaborações de Luciane de Moura Portugal Costa (capa) e do professor Tanussi Cardoso (em belíssimo prefácio) este primeiro livro do poeta Carlos Costa apresenta ao leitor os versos de um escritor maduro, com um ótimo domínio da escrita e da palavra.
Em menos de cem páginas o leitor é brindado por uma coletânea de poemas que vão da leveza das imagens belas construídas com elementos simples, no melhor sabor de Quintana (“Nas veias arenosas do meu tempo, / as pedras são pedestres sobre o mar: / detêm, na pulsação, o movimento; / e ali, paralisado, o meu olhar.”) ao hálito sensualista tão marcante no Drummond póstumo de O Amor Natural (“Do apartamento de cima / caem monossílabos tontos: / agora o quarto respira / a urbana e sensual prosódia”).
As influências e leituras desses e de outros poetas se fazem sentir aqui e ali sem nenhum demérito ou prejuízo para o poeta ou para a obra, muito pelo contrário: é um prazer observar como um poeta estreante (mas não iniciante, vale ressaltar) dialoga de forma eficaz com a tradição e ao mesmo tempo mantém sua independência e estilo próprio.
Chama a atenção, por exemplo o poema “Decote”:
Teus seios, pela metade,
são nádegas por inteiro.
Neste dois simples versos encontra-se um casamento entre os poemas-minuto de Oswald e a já citada temática sensualista de Drummond (que, aliás, também experimentar a técnica oswaldiana) criando uma imagem que pode ser lida de forma burlesca, divertida, ou de maneira a lembrar um voyeur que espia a sociedade da qual é mais que mero expectador. Aliás, eis aí um excelente epíteto para o poeta: voyeur atuante.
De modo muito inteligente e sensível o poeta organizou seu volume em gradação: começa-se a leitura com poemas quase ingênuos (como as preliminares de um encontro amoroso) até chegar-se ao clímax desejado (só mesmo lendo o último poema para entender plenamente o porquê) passando por todas as etapas de um idílio amoroso no qual o casal de amantes (leitor e poesia) podem entregar-se sem receio nem pudores.
O livro já vale à pena pela belíssima frase com que Carlos Costa abre seus braços ao leitor: “Viver / é a matéria-prima. / Criar / é a arte final.”.
É só abraçar.
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Editora Antigo Leblon
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Carlos Costa
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