VIAGENS DE GULLIVER

Com a estréia do filme inspirado nas aventuras de Gulliver, resolvi pegar na estante o livro, que me foi presenteado por minha irmã Maria e finalmente lê-lo. O livro tem como subtítulo: “Viagens em diversos países remotos do mundo em quatro partes, por Lemuel Gulliver, a princípio cirurgião e, depois, capitão de vários navios”.

De autoria do irlandes Jonathan Swift e publicado pela primeira vez em 1726, o livro é conhecido pela maioria das pessoas apenas parcialmente, pelas aventuras vividas por Gulliver em Lilipute, onde é um gigante vivendo entre seres diminutos.

Mas o livro, como pode-se perceber pelo subtítulo , é muito mais que apenas essa aventura.

E apesar das diversas adaptações para o público infanto-juvenil, não é um livro infantil!

O livro narra as peripécias do nosso herói em quatro viagens, a primeira para Lilipute; A segunda para Brobdingnag, onde a situação é invertida, ele é o pequenino e os habitantes são gigantes. A terceira ocorre em diversos lugares, Laputa, , Glubbdubdrib e Luggnagg, onde os habitantes são do mesmo tamanho, porém extremamente estranhos. Na quarta viagem, Gulliver vai parar no país dos Houyhnhnms, cavalos inteligentes e onde os humanos são os seres irracionais – os Yahoos.

O livro é uma crítica à sociedade inglesa da época em particular e aos costumes europeus em geral e em cada aventura, Gulliver tem a oportunidade de analisar e comparar os hábitos das sociedades que ele passa a conviver, com as dos seus conterrâneos.

1ª viagem (pag 17 a 69) : Vítima de um naufrágio, Gulliver aparece desacordado em uma praia. Ao acordar, percebe que está amarrado e que existem pessoas diminutas ao seu redor. A altura dessas criaturas é de 15,2 cm. Gulliver é chamado pelo povo de Lilipute de “homem montanha”. Para viver entre eles é obrigado a aceitar uma série de regras impostas pelo Imperador e seu Conselho. Um grande problema é como alimentá-lo, já que são precisos centenas de bois, galinhas e ovelhas para que Gulliver tenha a fome saciada.

Gulliver apaga um incêndio nos aposentados da Imperatriz, urinando sobre as chamas. Como havia uma lei proibindo qualquer pessoa de satisfazer suas necessidades no palácio, a Imperatriz se recusa a retornar aos seus aposentos e declara-se inimiga de Gulliver.

Em sua convivência com o Liliputianos, Gulliver aprende diversas coisas. A sociedade é dividida em castas e a educação das crianças segue essa casta. Elas são separadas logo pequenas e enviadas para seminários, onde são educadas conforme sua origem: nobre ou eminente (mais ricos) ou de posição média (comerciantes, mercadores e mecânicos). Os seminários são divididos entre as crianças de sexo feminino e sexo masculino. Os filhos de roceiros e lavradores não vão para seminários, permanecendo em casa com os pais, pois a educação para eles não é importante.

Para o liliputianos, a “fraude é maior crime do que o roubo”.

Na região, além de Lilipute, há outra ilha, Blefuscu, também de criaturas diminutas, que é inimiga de Lilipute e estão em guerra declarada. Gulliver sequestra a frota de navios de guerra de Blefuscu e a traz para Lilipute.

Mas ao contrariar o Imperador quando ele exige que Gulliver domine Blefuscu e além disso insistir em manter relações com esses inimigos, Gulliver é condenado à morte e refugia-se em Blefuscu, mas decide partir quando percebe que sua permanência ali pode colocar em risco a situação de paz conseguida, após Blefuscu perder seus navios. Acaba partindo, levando alguns animais consigo, apesar de querer levar também alguns habitantes, o que lhe foi negado. Acaba encontrando um navio e sendo resgatado por pessoas de sua estatura, voltando para a Inglaterra, onde permanece por pouco mais de dois meses, partindo então para sua segunda viagem.

2ª viagem (pag 73 a 131): Gulliver vai até uma ilha com um grupo em busca de água. Abandonado na praia pelos companheiros, que fugiram de um gigante, Gulliver descobre que está em uma "terra de gigantes". É encontrado por um lavrador e passa a viver nessa família. É cuidado pela filha de 9 anos do lavrador, que ele chama de Glumdalclitch (amazinha). O lavrador o exibe para os vizinhos e é instigado a ganhar dinheiro com as aparições do pequenino. Ele e sua filha começam então a viajar pelas cidades, fazendo apresentações pagas do "homem minúsculo", até que ele interessa à Rainha e é por ela comprado. Gulliver solicita que Glumdalclitch fique com ele. Em sua estadia na corte, tem a oportunidade de conhecer melhor os costumes desse povo. Fazem para ele uma casinha que pode ser transportada. Em uma viagem até a praia, a casa onde Gulliver está é pega por uma águia e levada aos céus, caindo no mar, quando é salvo por um navio, com pessoas de seu tamanho. Retorna ao seio de sua família, viajando novamente poucos meses depois.

3ª viagem (pag 135 a 200): Gulliver tem seu navio atacado por piratas, é preso e abandonado em uma canoa, indo parar em uma ilha. Ali ele encontra uma “ilha suspensa” – Laputa – e é levado para dentro dela. Lá moram o Rei e seu séquito. Uma sociedade totalmente dedicada à matemática e à música e que não presta atenção ao que acontece ao seu redor. Cada habitante tem por isso dois criados, encarregados de lhes chamar a atenção e bater no ouvido, quando é para escutarem ou bater na boca, quando é para falarem. A ilha consegue flutuar graças a um imã, que é repelido ou atraído pelo magnetismo da região - apenas aquela região, o que não permite que o Rei avance além dos seus domíniios.

Depois de Laputa, Gulliver vai para Balnibarbi, onde conhece uma academia de projetistas, onde o “único inconveniente é que nenhum desses projetos atingiu seu objetivo”.

Um dos projetos é “reconverter o excremento humano nos alimentos originais”. Há também projetistas políticos. “Persuadir monarcas a a escolherem os seus validos em atenção à sabedoria, à capacidade, e à virtude deles, para ensinarem os ministros a consultarem o bem público... escolhendo para os diversos cargos pessoas qualificadas para os exercerem – além de muitas outras quimeras fantásticas e impossíveis”.

Gulliver se decide a ir embora, através do Japão, país próximo. Vai então para Maldonada, porto de partida para Luggnagg, país que mantém relações com o Japão. Enquanto aguardava a chegada de um navio, é convidado a visitar a ilha de Glubbdubrib, a “Ilha dos feiticeiros ou mágicos”, onde vivem somente bruxos. Ele vai para lá, onde é recebido pelo governador. Fica sabendo que todos os criados e ajudantes são pessoas já falecidas. Os bruxos locais têm o poder de chamar quem quiser entre os mortos, por 24 horas, quando então eles fazem o que lhes é ordenado. Esses mortos só podem ser chamados novamente depois de três meses. Gulliver pede então ao Governador, que chame diversas figuras históricas, para que ele possa conversar com elas. Entre os grandes homens que aparecem estão: Alexandre, Aníbal, César, Brutus, Homero, Aristóteles e Descartes. Gulliver também chama pessoas comuns e através desses diálogos, descobre que nem tudo é como os livros de história contam.

Volta então para Maldonada e parte para Luggnagg, onde ouve falar dos Struldbrugs (imortais). São pessoas predestinadas, desde o nascimento, a nunca morrerem. Trazem uma marca na testa. Apesar de não morrerem, envelhecem normalmente. A princípio, Gulliver acha fantástica essa situação e faz um discurso sobre o que faria se fosse um Struldbrugs, ao que os ouvintes retrucam com a verdade do cotidiano desses imortais. “quando completavam oitenta anos, idade tida nesse país como limite máximo da vida, tinham não só a insensatez e todas as enfermidades dos outros velhos, se não muitas outras nascidas da medonha perspectiva de nunca morrer”. Ou seja, os “imortais” são um transtorno à sociedade de Luggnagg, mais uma maldição que uma benção. Gulliver parte então para o Japão, com uma carta de recomendação ao Imperador Japonês e tem seu retorno à Inglaterra garantido.

4ª viagem (pag 201 a 258): Gulliver torna-se capitão de um navio, empreende uma viagem, na qual vários tripulantes morrem, obrigando-o a recrutar novos nos portos onde atraca. Acaba sendo vítima de um motim e abandonado em terras desconhecidas. Nesse lugar, depara-se primeiramente com seres estranhos, espécie de macacos-homens. São descritos por Gulliver como um “animal tão desagradável, cheio de desprezo e repugnância”. Quando é cercado por vários deles e ameaçado, acaba sendo salvo por um cavalo, que faz o grupo se dispersar. Mais tarde, descobre que os cavalos são inteligentes, tem uma linguagem própria e vivem em sociedade, enquanto que os humanos são como animais, vivendo como selvagens ou sendo domesticados para realizar tarefas, como se fossem burros.

Gulliver aprende a linguagem deles e fica sabendo que os cavalos chamam a si próprios de “Houyhnhnm” e os humanos são os “Yahoos”.

Os Houyhnhnm são extremamente éticos, desconhecem a maldade e os jogos de interesse típicos dos humanos. Não há mentiras entre eles e quando Gulliver tenta explicar esse conceito, passam a designar como sendo “a coisa que não é”. Para seu amo (o cavalo, chefe da família com quem vive) é difícil conceber que existam Yahoos desenvolvidos e que, pior, existam cavalos que são tratados como seres irracionais. Quanto mais Gulliver fala sobre a sociedade dos homens, mais descrente ficam os Houyhnhnm.

Para Gulliver, ele encontrou finalmente um lugar onde pode viver de maneira correta. Quanto mais ele convive com os cavalos, mais ele sente aversão aos seus iguais. Ele nunca mais sairá dali e não pensa em momento nenhum em retornar à Inglaterra, esquecendo-se inclusive de sua família.

Porém, os Houyhnhnm pensam de maneira diferente. Vêem Gulliver como sendo uma doença, que pode contaminar e destruir a sociedade perfeita deles. É lhe solicitado então que vá embora, deixando o país e voltando para os seus. Gulliver não quer ir, mas percebe que não há argumento que possa apresentar para que mudem de idéia. Constrói então um barco e se lança ao mar, com a firme intenção de encontrar um lugar deserto e lá passar o resto de sua vida, pois para ele é inaceitável voltar a viver entre os Yahoos civilizados.

Epílogo (pags 259 a 270): A intenção de Gulliver não se concretiza. Ele é resgatado a contra gosto por um navio português e obrigado a viajar com eles até Portugal e depois voltar para sua família. Ao chegar em sua casa e ser beijado pela esposa, acaba desmaiando, tamanho é o nojo que sente. Acaba se tornado um pária, não permitindo a aproximação de ninguém, seja sua mulher, sejam seus filhos. Aos poucos, vai permitindo alguma aproximação, sem jamais voltar a ser o que era antes.

"Viagens de Gulliver" é uma leitura extremamente prazeirosa, podendo ser lida como ficção, aventura fantástica ou sátira política e social. Não importa o viés que o leitor decida, ele encontrará aquilo que se decidiu a procurar.

Lendo diversas passagens do livro, principalmente aquelas que falam dos políticos e dos advogados, percebe-se que a nossa situação não evoluiu. O desprezo por aqueles que os elegeram, a busca pelo interesse próprio e particular ao invés do interesse da comunidade são os mesmos que se vê hoje em dia.

Uma das coisas que se percebe ao final da leitura desse maravilhoso livro é que o Homem não evoluiu, que hoje ele é igual ou pior do que era no século XVIII.

Continuamos sendo todos Yahoos.

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Ficha do livro:

Título original: não consta (Gulliver's Travels)

Título em português: Viagens de Gulliver

Autor: Jonathan Swift

Tradutor: Octavio Mendes Cajado

Editora: Abril Cultural

Pags.: 275

Ano da edição: 1979

Obs.: Há uma edição recente da editora Penguin e Companhia das Letras (446 páginas).

DIMAS ROCHA
Enviado por DIMAS ROCHA em 07/02/2011
Código do texto: T2777440
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