A Construção de um Mundo a Partir dos Efeitos Tecnológicos e da Globalização

SEVCENKO, Nicolau. A Corrida para o Século XXI: no loop da montanha- russa. São Paulo: Companhia das Letras, 2001.140p.

José Nicolau da Silva Neto

Vida e Obra

Nicolau Sevcenko é Filho de imigrantes russos, da região da Ucrânia de onde veio fugido da perseguição bolchevique para o Brasil. Destarte, nasceu em Santos, litoral paulista em 1952. Não durou muito tempo na cidade, uma vez que, ainda pequeno, sua família se mudou para São Paulo. Aqui, fez de tudo um pouco, sendo, inclusive, coletor de metais, office boy e, claro, escritor.

Já formado, veio a se tornar Docente de História na Universidade de São Paulo, onde ainda atua. Dentre as universidades que o mesmo trabalhou pode-se mencionar a Universidade Estadual de Campinas e Pontifícia Universidade Católica. A nível internacional destaque para suas atuações como professor nas universidades do Reino Unido, mais precisamente em Londres, bem como também em Georgetown, nos Estados Unidos. Ainda aqui, vale mencionar que atualmente exerce a profissão na Universidade Harvard, Estados Unidos.

Nicolau Sevcenko Escreveu diversas Obras, dentre as mais importantes inclui-se Orfeu extático na metrópole: São Paulo nos frementes anos 20 (1992), A revolta da vacina (1983), obra que apresenta uma reedição pela Cosac Naify em 2010, Literatura como missão: tensões sociais e criação cultural na Primeira República (2003), além claro, de A corrida para o séc. 21: no loop da montanha-russa (2001). È importante salientar neste contexto que ele organizou o volume História da vida privada no Brasil: da belle époque à era do rádio (1998). Nunca é demais lembrar que ele veio a traduzir a obra intitulada Alice no País das Maravilhas no início da década de 90 do século passado, tendo sido uma vez mais lançada em 2009 pela Cosac Naify.

Resumo

Nesta obra, Sevcenko aborda as transformações tecnológicas inerentes ao século XX e, por conseguinte, o como essas se deram na passagem para o subseqüente. Para tanto, ele a divide em três partes, quais sejam: Aceleração tecnológica, mudanças econômicas e desequilíbrios, Máquinas, massas, percepções e mentes e, Meio ambiente, corpos e comunidades. Ainda aqui, utiliza o método comparativo ligando os efeitos inerentes a montanha russa com os percalços tecnológicos ocasionados pelas constantes mudanças sócio-econômicas que perpassou por todos os limiares dos séculos XIX, XX e, finalmente, mas não menos importante, do século XXI.

A OBRA

A Construção de um Mundo a Partir dos Efeitos Tecnológicos e da Globalização

Nicolau Sevcenko trabalha de forma nítida o como se deu as construções de um mundo pautado nas desigualdades sociais e, por conseguinte o como se foi transformando os interesses das nações capitalistas na medida em que ocorriam os efeitos devastadores das tecnologias.

Nesse sentido, como já afirmamos, ele divide seu ensaio em três partes e, em cada uma delas, procura mostrar deste o século XIX e adentrando o passado como se foram formando outra mentalidade, se construindo novos discursos rumo a uma sistematização de valores provocada por uma incipiente tecnologia. Ao passo que se teve uma Aceleração tecnológica, há então, a necessidade de se criar estratégias e mecanismos para se sobressair na corrida rumo ao progresso e de sustentação do imperialismo dos países capitalistas, diga-se de passagem. Desse modo, vai se travando entre os espaços sociais envolvidos nesse processo uma batalha pelo controle das forças naturais e, claro, das construções advindas das novas tecnologias.

Ainda aqui, importa-nos discorrer que, no que toca ao primeiro capítulo o autor trabalha, em princípio, a particularidade que perpassou por todo o limiar do século passado, particularidade essa que veio a mexer com as estruturas do meio social. Segundo Sevcenko isso se deu em virtude dos efeitos provocados pela Segunda Guerra Mundial. Nesse sentido, emerge fatores que irão caracterizar essa fase, principalmente no pós-guerra: Incremento e intensificação das mudanças no âmbito tecnológico, o que, diga-se de passagem, permitiu um alargamento de setores ligados à área de serviços e informações.

Ao passo que se tinha um surto econômico, fazia-se necessário construir estratégias, da parte dos países envolvidos nesse processo, para poder manter e, concomitantemente procurar ampliar cada vez mais os recursos advindos da Revolução Científico-Tecnológica. Foi nesse embate que, países como Estados Unidos e União Soviética emergiram como as principais potências econômicas e, passaram a disputar o controle tecnológico, num período comumente denominado de Guerra Fria. Para Sevcenko uma vitória nesse sentido, não importando de que lado viesse implicaria em uma vantagem decisiva: “para os dois lados beligerantes, era uma realidade patente que, quem conseguisse superar o oponente na concorrência tecnológica, contaria com uma vantagem decisiva” (p. 25).

Na década de 70 do século passado, já com os Estados Unidos como grande potência econômica houve, por parte deste espaço social, uma edificação de medidas tanto para superar a crie do petróleo, bem como também com o intuito de dinamizar o mercado internacional. A partir delas, os limites impostos pelas fronteiras nacionais foram superados, permitindo assim, uma fluidez de capital, principalmente o financeiro. Aqui, de acordo com o autor “eles foram beneficiados não só pelas medidas de liberalização e desregulamentação dos mercados, mas também pelas conquistas das novas tecnologias microeletrônicas” (p. 28). Tal fato permitiu uma aceleração no que diz respeito à transferência de recursos e, concomitantemente, aumentando cada vez mais as disparidades econômicas entre as classes sociais, haja vista que as empresas adquiriram um auto grau de mobilização e, passaram a utilizar dos mecanismos de controle social que melhor se adequassem a nova situação, tais como redução da mão de obra (no que toca a classe trabalhadora) e, claro, investindo no poder de se deslocar para os espaços onde eram ofertados os menores valores de impostos. Assim, estado e sociedade ficam sob o julgo de seus interesses financeiros.

No segundo capítulo ele trabalha com a adaptação humana nesse meio tecnológico. Isso provoca mudanças nos comportamentos, haja vista que, nesse novo mundo construído por intermédio dos efeitos devastadores da globalização a sociedade passa a ser regulada por um novo tempo, o mecanizado. À medida que se tem uma mudança comportamental, há uma desconstrução dos valores de outrora e, dessa feita, o mundo passa a ser regido por novos valores construídos para obedecer à lógica da sociedade mecânica.

Nesse contexto, o que aparece em cena é um quadro social calcado no consumismo, onde os indivíduos são despersonalizados na medida em que as qualidades pessoais e a essência de cada ser não mais estão em jogo, mas sim o seu poder de adequação ao capitalismo. Afinal de contas, como diz Sevcenko, agora “as pessoas são aquilo que consomem”..., ou ainda, “em outras palavras, sua visibilidade social e seu poder de sedução são diretamente proporcionais ao seu poder de compra”. (p. 64).

Endossando ainda mais essa discussão ele busca demonstrar não só a adaptação das classes sociais a margem desse processo, mas também dos setores dominantes, principalmente das táticas edificadas pelas empresas no intuito de aumentar esse poder de compra. Nesse sentido, elas procuram dotar seus produtos não só de qualidade, mas que atendam aos desejos das pessoas na prática cotidiana. Partindo desse contexto e, se utilizando do método comparativo com os efeitos advindos da montanha russa com os provocados pelas novas invenções tecnológicas, ele chega a admitir que em ambos os casos as pessoas se adequam aos seus estilos de propaganda e, por conseguinte há uma construção de uma sociedade do espetáculo onde os elementos da cultura popular são redefinidos, ou melhor, colocados de lado em detrimento de uma cultura baseada unicamente na comercialização. Tais mecanismos construídos pelas empresas são calcados principalmente no poder da imagem e da propaganda.

Finalmente, mas não menos importante, ele envereda no último capítulo pelos elementos que fizeram a virada de século, isto é, do passado para o atual. Aqui, uma vez mais, prevalecem os efeitos de uma política tecnológica e subsidiada pelos pressupostos do sistema capitalista. Neste diapasão, importa-nos dizer que assim como nos períodos anteriores, o século XXI assume as mesmas feições de um sistema capitalista cada vez mais destruidor da cultura popular, do coletivismo e da solidariedade.

Desta feita, o autor proporciona uma leitura de mundo engajada nas discussões em torno das preocupações com o meio ambiente. Em uma sociedade capitalista e sob o julgo da globalização o que importa é a competição, onde nem sempre, ou quase nunca os melhores vencem. Pois, como já ficou evidenciado linhas atrás, há aqui, uma inversão de valores calcados na cultura das elites dominantes, ou melhor nos expressando, em uma apropriação dessa cultura pelas classes dominantes. Ao passo que se verifica uma construção de um novo mundo, com ritmos alucinantes e, as pessoas sendo vista não como sujeitos, mas sim como objetos, a preocupação com os crimes ambientais não tem a devida importância.

È preciso discorrer que o mais preocupante ainda é que as ações em prol da preservação ambiental ficam muitas vezes só no papel, nos discursos políticos e acadêmicos. Nunca é demais lembrar que impera desde o século XIX, uma ditadura dos valores, uma moral capitalista que, paulatinamente foi se construindo e ao mesmo tempo criando mecanismos para sua sustentação. Uma moral capitalista, imperialista e tecnológica que, vai se remodelando e colocando a sociedade e, principalmente a classe trabalhadora sob seu controle a partir das amarras impostas pelo sistema capitalista (nunca é demais repetir).

Por tanto, o século XXI apenas está incorporando e ampliando o que vem se construindo desde dois séculos atrás, para sermos mais específicos. Afinal, estamos Inserido em uma realidade onde as desigualdades sociais estão cada vez mais evidentes e gritantes, onde os projetos sociais governamentais não apresentam resultados satisfatórios e os sujeitos não encontram seu espaço de inserção no meio socioeconômico imposto.

Indicação da Obra

Este é um trabalho construído sob a ótica do marxismo e, permite que o leitor se aprofunde nas discussões que perpassam pela dinâmica do sistema capitalista instaurado e desenvolvido pelas novas tecnologias e, claro, pelas novas relações sociais imanentes a ele. Um texto diferenciado por múltiplos aspectos, dentre os quais cita-se a linguagem simplificada, mas sem perder o rigor teórico e metodológico e, acessível ao mais variados públicos, desde estudantes, graduandos a doutores.

Ainda aqui, proporciona uma discussão sobre vários pontos, como apropriação da cultura de massa por uma cultura subsidiada exclusivamente pelo consumo, dos controles sociais a partir do aumento desenfreado pela busca do poder econômico e, claro, do como se foi construindo, mantendo e ampliando as desigualdades sociais.