"Ler e escrever: estratégias de produção textual", de Ingedore Villaça Koch e Vanda Maria Elias

A presente resenha crítica tem por objetivo apresentar a obra Ler e Escrever: estratégias de produção textual, de Ingerdore Villaça Koch e Vanda Maria Elias, a qual constitui um manual prático e didático de estudos dos elementos que compõem a atividade de produção de textual. Para professores, estudantes de Letras ou interessados em aperfeiçoar sua produção escrita, a obra apresenta rico repertório no que se refere ao estudo dos elementos e das estruturas constituintes do texto.

No primeiro capítulo a perspectiva de Koch & Elias direciona-se ao texto enquanto evento sociocomunicativo, além de tratarem de fala e escrita como situadas num continuum, isso porque, embora haja diferenças entre as duas, essas não podem ser consideradas polares ou dicotômicas, de maneira que fala e escrita complementam-se enquanto modalidades de uso da língua. Além disso, no primeiro capítulo as autoras apresentam o conceito de texto tanto falado quanto escrito, e abordam de forma abrangente, com farta exemplificação, as marcas da oralidade na escrita.

O segundo capítulo trata da escrita, a princípio as autoras apresentam, a partir do questionamento “O que é escrita?”, uma breve explicação sobre a modalidade, e a seguir três focos diferentes acerca da mesma. De forma que os dois primeiros focos baseiam-se, grosso modo, em concepções do senso comum, já o terceiro, apresenta um foco baseado em estudos que consideram a escrita como uma atividade de interação, de forma que ao escrever, o produtor estabelece uma relação dialógica com seu leitor. Assim, todo o processo de construção do texto é direcionado a atender os critérios dessa interação. Ainda no segundo capítulo, a escrita é abordada como um processo de ativação de conhecimentos, com isso, são apresentados quatro tipos de conhecimentos ativados durante a produção textual, os quais:

• Conhecimento linguístico;

• Conhecimento enciclopédico;

• Conhecimento de textos;

• Conhecimento interacionais.

Embora todo o livro constitua um material valioso aos interessados nos estudos do texto, o terceiro capítulo aborda um assunto considerado de grande relevância na atualidade, trata-se do estudo dos gêneros textuais. Intitulado “Escrita e práticas comunicativas”, esse capítulo aborda, a partir da perspectiva Bakhtiniana, o que vêm a ser os gêneros e para que servem os mesmos. Segundo as autoras os gêneros baseiam-se em formas padrão relativamente estáveis de estruturação de um todo, em suma relativo às formas que organizam e nas quais se enquadram os textos, os quais estão diretamente ligados aos aspectos sociais de uso da língua e que, portanto, estão presentes em nosso cotidiano. Além da perspectiva acerca dos gêneros, as autoras, a partir de vasta exemplificação, abordam as sequências textuais que podem, de forma isolada ou mesclada compor os gêneros discursivos.

O quarto capítulo é dedicado ao estudo do contexto. Dessa forma as autoras apresentam a princípio algumas considerações que são de suam relevância para se entender primeiramente quais são os elementos constitutivos do contexto, os conhecimentos compartilhados, o propósito da comunicação, o lugar e o tempo em que ocorre a situação de comunicação, bem como os aspectos histórico-culturais. Em seguida são apresentados diferentes desdobramentos do contexto, que anteriormente era considerado somente como o entorno verbal do texto, o chamado cotexto. Todavia essa perspectiva muda a partir da consideração do texto como um evento sociointeracional, no qual estão inseridos propósitos comunicativos. Diante disso o contexto é estudado, ou identificado de três vertentes distintas:

• Contexto imediato;

• Contexto mediato;

• Contexto sociocognitivo.

As três formas diferentes de identificar o contexto são apresentadas com o auxílio de textos de exemplo e ilustrações, e para finalizar o assunto as autoras ainda discorrem sobre as funções do contexto e sobre os fatores de contextualização. Com o foco voltado para a atribuição de sentido e para a relação dialógica do texto, os fatores de contextualização são imprescindíveis para situar o leitor no tempo, espaço e/ou entorno sócio-histórico-cultural pretendido ou demarcado pelo produtor do texto.

No que se refere à intertextualidade, o quinto capítulo, supre de maneira satisfatória o entendimento acerca desse importante elemento de constituição textual, já que tanto nos campos do sentido, da forma ou da estrutura, um texto é sempre resultado de outros. Para ilustrar esse fenômeno, as autoras recorrem a exemplos de diferentes gêneros constituídos a partir de um texto fonte, que pode ser facilmente ativado ou recuperado na memória social do leitor. Ainda no que tange a intertextualidade, podemos encontrar seus modos de constituição que se configuram em “explícita” e “implícita”, além da abordagem sobre intertextualidade e gêneros textuais, na qual as autoras apontam para a intertextualidade intergêneros, que se configura quando o autor lança mão de seu conhecimento metagenérico para produzir um gênero no formato de outro.

As autoras dão sequência à abordagem apontando para os subtemas: Intertextualidade e coerência e intertextualidade no ensino da produção escrita, na qual defendem a importância de se destacar aos alunos, em nossa prática cotidiana, o fenômeno da intertextualidade, com destaque não somente para a relação existente entre os textos, mas de modo a promover a reflexão sobre o objetivo da utilização de um determinado texto de referência, bem como ao posicionamento do produtor diante dos textos aos quais faz remissão. Essa contribuição das autoras permite que se reflita também sobre o trabalho diário com os textos em sala de aula, e a necessidade de estimular atividades de leitura para que os alunos, ao longo de sua vida escolar possam adquirir repertório e exercitar, quando necessário em sua vida cotidiana, fora também da vida escolar atividades de intertextualidade explícita ou implícita.

No sexto capítulo, o foco da obra é direcionado à Escrita e a progressão referencial, assim, como o título sugere, são tratadas as questões relativas aos elementos e as estratégias de construção e reconstrução de objetos do discurso, materializados por elementos de retomada e progressão das ideias contidas no texto. As autoras postulam que o processo de referenciação constitui uma atividade discursiva, já que ao produzir o texto o escritor opera sobre o material linguístico por meio de escolhas significativas, para representar estados de coisas, de acordo com sua maneira particular de uso da língua. Ao longo do capítulo Koch & Elias apresentam de forma didática e muito bem exemplificada todos os desdobramentos da referenciação os quais são apresentados na sequência de subtemas a seguir:

• Formas de introdução de referentes no modelo textual;

• Formas de progressão referencial;

• Cadeias referenciais;

• Funções das expressões pronominais;

• Orientação argumentativa do texto;

• Referenciação e ensino

O penúltimo capítulo intitulado Escrita e progressão sequencial, toca nos recursos utilizados para produzir efeito de continuidade no texto e que, por conseguinte, corroboram no que tange a produção de sentido. Tais recursos de progressão sequencial possuem uma terminologia específica, a exemplo disso temos:

• Recorrência ou repetição: recurso retórico, ou de efeito estilístico;

• Paralelismo: consiste na repetição sucessiva de uma mesma estrutura, todavia preenchida por elementos lexicais distintos;

• Parafraseamento: o tratamento de conteúdos anteriormente abordados por outros autores e que um determinado autor lança mão com escolhas sintáticas daquelas utilizadas a priori. É o caso da presente resenha;

• Recursos de ordem fonológica: estão para além da segmentação ou sequenciação, tais como o metro, a rima, e o ritmo.

• Recorrência de tempos verbais: situa o leitor e contribui para o modo como o texto deve ser entendido;

• Manutenção temática;

• Progressão tema-rema;

• Progressão tópica: referente aos tópicos discursivos constituintes do texto;

• Encadeamentos.

No capítulo final é apresentada a noção de coerência, a qual pode também ser entendida como princípio da interpretabilidade, e está diretamente ligada ao sentido do texto e a ordenação lógica de ideias. Entretanto, observamos, a partir dos exemplos apresentados por Koch & Elias, que embora haja casos em que o autor subverta a ordenação lógica de ideias por conta de atingir efeitos estilísticos, ainda assim pode ser mantida a coerência de um texto. Ainda nesse capítulo observamos que a noção de coerência se constrói na relação existente entre autor, texto e leitor, estando, dessa maneira, para além da materialidade linguística. À coerência está diretamente ligada a ativação de conhecimentos, tanto por parte do escritor que lança mão desse elemento para produzir seu texto e criar efeitos de sentido, quanto por parte do leitor, o qual ativa também alguns tipos de conhecimento a fim de efetivar a atribuição de sentido. Ao longo do capítulo as autoras apresentam as multifaces da coerência, de forma clara e sem, de modo algum, esgotar o tema.

De maneira geral, a obra de Ingedore Villaça Koch e Vanda Maria Elias, contribui enormemente para a prática de professores das áreas da linguagem, embora fosse muito interessante que professores de outras áreas passassem também a tomar contato com as propriedades textuais, já que este se faz presente na rotina escolar. A presente resenha buscou destacar os pontos de maior relevância da obra, embora esta constitua, em sua totalidade, um material de grande valia para a área de estudos do texto.