Resenha sobre o livro da Maria Kazue Mori

É de autoria de Juliana de Oliveira Teixeira, graduada em Jornalismo pela UEL, Mestranda em Comunicação. Publicada em Discursos Fotográficos, Londrina, pág. 7. Só tomei conhecimento graças a Museóloga Márcia Hattori que me mandou uma cópia. O prefácio do livro da Mori é de minha autoria. A história de Lins contada pelos

próprios linenses

The history of the city of Lins told by its own inhabitants

Juliana de Oliveira Teixeira *

A história da imigração japonesa em Lins é um apanhado de

relatos de nikkeis (japoneses e seus descendentes) que vieram tentar a

sorte no Brasil nas primeiras décadas do século XX. Nessa época, o

Japão ainda vivia a Restauração Meiji, iniciada em 1868, que tinha como

objetivos a industrialização e a urbanização do território japonês. Para

tanto, os recursos financeiros que promoviam o “progresso” vinham dos

altos impostos taxados no setor agrário – empobrecendo a população

camponesa e forçando-a a migrar para a cidade. As cidades,

despreparadas para absorver tamanha mão de obra, geraram uma

população de miseráveis. Dessa forma, a oportunidade de emigrar para

o Brasil, um país “paradisíaco, com frutos de ouro” era mais que

tentadora. (MORI, 2010, p.22).

O primeiro navio a partir do Japão foi o Kasato Maru, em 1908.

Depois dele, muitos se seguiram – a maioria atracando no porto de

Santos, em São Paulo. Ao desembarcarem no estado paulista, as

expectativas que os japoneses traziam na mala logo se esgotavam, pois,

frequentemente, o que havia sido acordado antes da viagem não era

cumprido. Os custos da viagem eram automaticamente descontados dos

baixos salários dos trabalhadores – isso quando seu pagamento não era

efetuado em vales que só poderiam ser usados nos armazéns das

fazendas. Mori (2010, p.24) explica que, posteriormente, os fazendeiros

brasileiros, interessados na cafeicultura, estabeleceriam um sistema de

parceria por empreita com os japoneses. Aos nikkeis cabiam as tarefas

* Graduada em Comunicação Social – Habilitação Jornalismo pela Universidade Estadual de

Londrina (UEL). Especialistas em Marketing, Comunicação e Vendas pela Universidade Norte do

Paraná (Unopar). Mestranda em Comunicação pela Universidade Estadual de Londrina (UEL).

Bolsista da Capes.

discursos fotográficos, Londrina, v.7, n.11, p.211-216, jul./dez. 2011213

de derrubar a floresta nativa, preparar a terra, plantar as sementes e

cuidar do cafezal até durante seis anos. Aos fazendeiros, restava o dever

de remunerar os japoneses – o que geralmente era feito com uma parcela

de terra.

Foi assim que muitos nikkeis firmaram raízes no país e, também,

como o município paulista de Lins foi fundado. Próxima à Estrada de

Ferro Noroeste do Brasil, a localização da cidade auxiliou em sua

formação em 1916, com o bairro nipônico Barbosa. Com rigor de

historiadora, Mori (2010) lista e retoma os principais acontecimentos

da trajetória de Lins até o ano de 1982. Para tanto, apoiou-se na técnica

da história oral, realizando inúmeras entrevistas com os primeiros

descendentes dos pioneiros japoneses do município. As fotografias,

também fonte de pesquisa da autora, funcionam mais como suporte,

como ilustração ao conteúdo.

Mori (2010) constrói o cenário que os nikkeis tiveram que

enfrentar: florestas para todo lado, instalações precárias, falta de recursos

básicos – como hospitais, transporte e escolas – e uma terrível epidemia

de malária, responsável pela morte de famílias inteiras.

Na época havia muita maleita. Morria um atrás do outro, e não

tinha tábua para fazer o caixão; então, embrulhavam o corpo num

pano e levavam nas costas mais ou menos 20 quilômetros, andando

pelas picadas dentro do mato. Gastavam quase um dia de

caminhada e, na volta, pegavam um pedaço de cipó e todos vinham

segurando para não se perder na estrada, pois não tinha luz nem

lampião. Quando chegavam de volta, já tinha outro falecido.

(TURUDA apud MORI, 2010, p.92).

No entanto, como a pesquisadora bem pontua, os japoneses,

obstinados, resistiram às dificuldades e acabaram por formar a cidade

com maior número de nikkeis do Brasil à época. O fortalecimento do

município se deu pela orientação sociocultural dos pioneiros que previa,

obrigatoriamente, a formação de associações e escolas. As associações

tinham como objetivo promover o cooperativismo entre os japoneses.

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Reuniões periódicas eram realizadas e, quem podia, contribuía com uma

quantia em dinheiro – mais tarde, viraria mensalidade. Por meio das

associações, as escolas de nikkeis eram fundadas, contratava-se um

professor e a língua ensinada era a japonesa.

Com o advento da Segunda Guerra Mundial, tanto as associações

quanto as escolas foram fechadas pelo governo brasileiro. Japoneses

foram proibidos de se reunir, de ouvirem rádio, de usar o idioma

japonês. Mori (2010) relata que muitos nikkeis foram vítimas de

preconceito e perseguições. Como tesouros, alguns objetos históricos,

fotografias e cartas foram enterrados para que não fossem confiscados.

Mas, nem só de trabalho viviam os primeiros japoneses de Lins.

De acordo com a autora, eles comemoravam as datas especiais do

calendário do Japão, como o Oshogatsu (primeiro dia do ano) e o

Tencho Setsu (aniversário do imperador Showa). Além disso,

dedicavam-se ao haikai, ao karaokê, ao origami, ao bonsai, à cerimônia

do chá, dentre outras atividades. No esporte, o beisebol era o mais

popular. O introdutor dessa prática esportiva na cidade foi Kisei

Kakazu, em 1946. Morador de São Paulo, em uma das visitas à família

em Lins, trouxe uma bola, uma luva e um taco e ensinou as crianças a

jogar. Deixando as regras do beisebol por escrito, Kisei voltou para

capital, ficando a cargo dos mais velhos orientar os mais novos e,

assim, formar um time. Com tacos de guajuvira, sacos de café

marcando as bases de strike, os meninos treinavam nas horas de folga

e “aos domingos, revezavam-se para apanhar café e algodão e

arrecadar fundos para comprar material para a equipe”. (Mori, 2010,

p.120).

Talvez, o grande mérito do livro de Mori seja o de dar voz aos

linenses para que eles contem a história dos primeiros anos do

município. Assim surgem depoimentos com ótimas personagens –

pessoas que fizeram de Lins o que ela é hoje. Uma das nikkeis que

mais chama atenção é Saga Omura, mulher de personalidade e parteira

da região. A nora de Saga, Kunie, relembra aos fatos da vida da sogra

e a maneira como ela se comportava.

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Yoshikuni
Enviado por Yoshikuni em 06/12/2012
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