As duas mulheres de Abraão
 
“Sarai, mulher de Abraão, não tinha gerado filhos: mas tendo uma escrava egipcia, chamada Agar, disse ao seu marido;(...) ; toma, pois a minha escrava, a ver se pelo menos por ela posso ter filhos.” Gênesis, 16;1.           


Abraão foi um patriarca pelo Senhor eleito,
Para gerar a nação que Ele havia escolhido.
Mas homem velho, já com vigor arrefecido,
Ele não tinha mais a potência para tal feito.
 
Sara, a sua esposa, igual na avançada idade,
Era a mulher a quem de fato Abraão amava;
Mas com ela não funcionava sua virilidade,
Por isso ela deu-lhe Agar, sua bela escrava.
 
Então com essa formosa egípcia por amante,
O idoso pai Abraão, não obstante sua idade,       
Foi logo capaz de produzir um descendente.
 
Mas também a Sara, porque muito ela amou,
Deus lhe deu mais tarde o dom da fertilidade;
Mesmo sendo idosa ela também engravidou.
                                  
Abrão, o bígamo                      
 
A personalidade de Abraão tem sido um assunto bastante debatido entre os estudiosos dos temas bíblicos. Que era um patriarca criado na tradição dos povos pastores do Oriente Médio, parece não haver dúvidas. A sua história com Sara e a escrava egípcia Agar, demonstra bem que ele cultivava a tradição de poligamia, que era comum aos homens daquele tempo e região, e remanesce ainda hoje entre os povos de crença muçulmana. Essa tradição continuou a ser preservada entre seus descendentes, particularmente seus netos Esaú e Jacó, que tiveram várias esposas, desaparecendo, entretanto, da história do povo de Israel em algum momento, após a instituição do reino unificado.
Nos tempos de Jesus a poligamia já aparece como uma instituição reprimida e condenada pelo ordenamento jurídico daquele povo. Provavelmente, a monogamia pegou carona no sentimento monoteísta que passou a vigorar entre os judeus após a institucionalização do reino de Judá como legítimo sucessor do povo de Israel no cenário político do Oriente Médio. Isso aconteceu após a destruição do reino de Israel pelos assírios e a sobrevivência do reino de Judá como uma das mais fortes nações da região, condição que só viria a perder com a invasão dos caldeus, em 586 a C.
Isso porque a prática da monogamia aparece como regra no Deuteronômio e não no Levítico, mostrando que nas tradições mais antigas esse costume era tolerado em Israel. Os próprios reis Davi e Salomão fizeram largo uso desse costume, o que corrobora essa informação. Assim, o fato de Abrão aparecer como bígamo nas crônicas bíblicas não causa nenhuma estranheza.
 
A poligamia na Bíblia
 
É evidente que a questão da poligamia, entre os povos do Oriente, se funda muito mais em uma necessidade social e econômica do que moral mesma. Ela era tolerada e até incentivada como instrumento de fortalecimento do clã, já que naqueles tempos a riqueza familiar se fundava na força demonstrada pelo grupo para ocupar, lavrar e defender a terra.
O Oriente Médio, onde as históricas bíblicas se passam, é um território de poucas terras férteis e escassas fontes de água. Assim, os clãs que ocupavam determinado território, geralmente tinham que ter braços fortes e numerosos para conquistá-los, ocupá-los e defendê-los contra os inimigos que geralmente procuravam invadi-los. Toda a história da antiga tribo de Israel, em sua saga para ocupar as terras de Canaã é um exemplo dessas lutas pelo controle das terras habitáveis. É, aliás, uma luta que continua até.
Destarte, o homem que tivesse uma família numerosa é quem tinha maiores chances de conseguir sucesso nessas empreitadas. Principalmente se fossem filhos homens, cujos braços eram mais úteis para o árduo trabalho da agricultura e do pastoreio, e mais competentes na guerra, pois essa era uma constante na vida daqueles povos.
Vai daí a necessidade de Abraão de ter filhos homens. Diz a Bíblia que ele era velho e não tinha filhos quando deixou a Mesopotâmea para se fixar em Canaã. E sua mulher Sarai, também idosa, era estéril, e se não pudera lhe dar descendentes na juventude, muito menos o faria na velhice. Mas Abraão, ao que supõe pelos relatos bíblicos, era um homem rico. Possuía muitos rebanhos, e ao que parece, era chefe de um numeroso clã, formado por sobrinhos, agregados e suas respectivas famílias, bem como numerosos servos, que faziam parte do clã, como era de tradição entre os grupos patriarcais da antiguidade. A preocupação de Abraão, portanto, abstraindo a conteúdo político, religioso e ideológico que os cronistas bíblicos deram à sua história, era econômico e social, pois no dia em que morresse, não seria um herdeiro do seu sangue que assumiria a sua herança. 
Mas era costume naqueles tempos que a matriarca da família, no caso de Abraão, Sarai, fosse considerada como a “mãe de família” de todos os membros nascidos no grupo. Assim, quando ela mesma não conseguia gestar, ela poderia fazê-lo através de uma concubina que ela mesma escolhesse para o seu marido. Escravas geralmente eram as escolhidas para essa “gestação por tabela”, e os filhos dessa relação eram adotados como se fossem gerados no seu próprio útero. Essa era, pois, uma prática comum entre os patriarcas dos tempos antigos e muito utilizada para prover uma família numerosa.
Desse costume evoluiu a tradição ainda cultivada pelos povos muçulmanos, que ainda praticam a poligamia.
 
Esse costume parece ter desaparecido entre os judeus em alguma época depois da formação do seu estado nacional, com o advento dos reis (Saul, Davi e Salomão), e a sua dissolução pelas invasões dos caldeus, sendo que a última, em 586 a C., levou cativos para a Babilônia a maioria dos habitantes de Jerusalém. Parece que a poligamia ainda era praticada em Israel na época dos reis, pois Davi e Salomão a praticaram com bastante liberalidade. Mas já nos textos do Deuteronômio (a segunda lei) ela já não aparece, e nos comentários rabínicos posteriores, torna-se um prática criminosa, equiparada ao adultério. O próprio Jesus ensina que aquele que quiser deixar sua esposa, por motivo justo, como o adultério, por exemplo, que dê a ela uma carta de divórcio, pois se assim não for, incorre em pecado.
O episódio de Abraão com suas duas mulheres e os filhos que ele teve com elas acabou se tornando um caso emblemático, que teve importantes e terríveis conseqüências na geopolítica do Oriente Médio. Essas conseqüências são sentidas até hoje, na forma dos intermináveis conflitos que sacodem aquela conturbada região da terra.   
 
Os Mórmons e a Maçonaria
 
A Maçonaria não agasalha em seu catecismo qualquer opinião pró ou contra a poligamia. Ela a vê apenas no seu sentido histórico, como uma tradição, que nos tempos bíblicos, foi útil e justificada, como forma de povoamento da terra e fortalecimento dos clãs.
Aliás, sendo a organização ecumênica e tolerante que é, não poderia ser de outra forma. Assim, não condena nem aprova, de forma que, se nos países que ainda adotam esse costume ele é aceito, a Maçonaria existente nesses países não deixa de fazer parte da Fraternidade universal por causa disso.
A questão da poligamia na Maçonaria já teve alguma importância no passado por força da relação que a Ordem maçônica manteve, num certo período da história, com os mórmons, os chamados adeptos da Igreja dos Santos dos Últimos Dias.
Os mórmons são um típico produto da liberdade religiosa que a América disseminou pelo mundo. Tanto que uma das crenças que norteia a religião dos mórmons é a de que Jesus Cristo andou pelos Estados Unidos logo depois da sua ressurreição e apareceu aos povos indígenas da América, mias propriamente no atual estado do Missouri, por onde ele teria perambulado por 40 dias e pregado sua doutrina aos naturais da terra. Esse novo apostolado de Jesus teria sido registrado em placas de ouro escritas por alguns discípulos que o acompanharam em suas andanças pelo continente.
Essas placas nunca foram encontradas, pois elas teriam sido levadas de volta a Deus pelas mãos do mesmo profeta que as teria gravado. Mas um dos discípulos, chamado Mórmon, compilou todos os relatos das placas, e um missionário chamado Joseph Smith, em 1820, recebeu de um anjo a missão divina de reescrever a narrativa dessa nova missão de Jesus. O resultado foi o curioso Livro de Mórmon, chamado de “O Novo Testamento de Jeus Cristo.”
Esse livro é composto por vários livros,chamados de  Primeiro Livro de Néfi, Segundo Livro de Néfi, Livro de Jacó, Livro de Enos, Livro de Jarom, Livro de Ômni, As Palavras de Mórmon, Livro de Mosias; Livro de Alma, Livro de Helamã, Terceiro Néfi,Quarto Néfi, Livro de Mórmon, Livro de Éter e o Livro de Morôni, além do testemunho de supostas testemunhas e do próprio autor do livro, o profeta Joseph Smith.
 
A questão da poligamia
 
Joseph Smith, tanto quanto seu sucessor Brigham Young, eram maçons e sua crença, disseminada rapidamente pelos Estados Unidos provocou de imediato a repulsa do cristianismo oficial. Em conseqüência, os mórmons logo ganharam inimigos políticos e religiosos importantes, o que os levou a deixar a costa leste dos Estados Unidos em 1844, para se concentrarem no atual estado de Utah, na época um território onde o governo americano  ainda não tinha muito controle.Ali eles construíram o seu mais famoso templo, ás margens do lago salgado onde hoje se ergue a cidade de Salt Lake City.
Foi em Utah que ocorreu o célebre (e triste episódio) do massacre de uma caravana de colonos que supostamente estava se dirigindo à Califórnia e foram atacados pelos mórmons comandados por Brigham Young, aliados aos índios paiútes, com os quais eles haviam formado uma curiosa Irmandade. Foi informado, na época, que o móvel dessa chacina seria a pretensão dos mórmons de se apossarem do território e ali fundarem a nova terra da promessa. Em razão dessa pretensão, vários conflitos já haviam ocorridos entre os grupos mórmons estabelecidos nesse território e as tropas dos Estados Unidos. Esse episódio, que ficou conhecido como o Massacre de Mount Meadows, ocorreu em meados de1857 e continua sendo, até hoje, um dos mais estranhos e inexplicáveis acontecimentos da história americana.*  
Poligamia
 
Os mórmons também eram antipáticos á religião oficial dos Estados Unidos (tanto a católicos quanto protestantes) em razão da prática da poligamia. Joseph Smith dizia que foi Deus quem instituiu a poligamia, pois ela era permitida aos seus escolhidos Abraão, Isaque, Jacó, os reis de Israel e assim por diante. Dai ele pregar essa prática como boa para sua comunidade, até como medida de incremento da população mórmon e fortalecimento do grupo. Evidentemente, numa época em que o puritanismo era dominante na sociedade americana, essa era uma idéia que só provocava repulsa.
Cabe dizer, entretanto, que nem todo mórmon apoiava essa prática. Várias dissidências surgiram no seio da seita e as corren-tes contrárias se tornaram tão fortes que o costume acabou por ser extinto. Uma nova “revelação divina”, feita a Wilford Woodruff, em 1890, aboliu de vez a poligamia entre os praticantes do mormonismo. **
 
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Foto: Agar Expulsa: Peter Josef Verhagen



* Esse episódio, bem como o fato de os fundadores da Igreja Mórmon serem maçons repercutiu de forma bastante negativa na maçonaria America. Muitos conflitos entre a Ordem, as religiões oficiais e o próprio governo americano foram justificadas por esse relacionamento entre a maçonaria e o mormonismo,.
** Atualmente, os Fundamentalistas vivem em comunidades isoladas no Estado de Utah e estados vizinhos, evitando, tanto quanto possível,  todo contato com a civilização.
 
OS MAÇONS, OS MÓRMONS E A POLIGAMIA NA BÍBLIA

do livro " LENDAS DA ARTE REAL, TÍTULO PROVISÓRIO, NO PRELO.
João Anatalino
Enviado por João Anatalino em 11/12/2012
Reeditado em 12/12/2012
Código do texto: T4030939
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