INFERNO
Romance: Autor Dan Brown- 2013
   
  Dan Brown está de volta com mais um grande sucesso literário. O autor do polêmico Código Da Vinci, e outros sucessos como o Símbolo Perdido e Anjos e Demônios, agora faz seu herói, o professor de História-detetive, Robert Langton, se envolver com cientistas de engenharia genética e a OMS –Organização Mundial da Saúde, para tentar deter um cientista maluco que acredita que a humanidade será destruída brevemente  pela super população, e por conta disso cria um super-vírus que torna as pessoas inférteis e incapazes de procriar.

    O autor usa a obra de Dante Alighieri, A Divina Comédia, como pano de fundo.  Especialmente a terceira parte do monumental poema, onde o genial poeta florentino fala dos círculos do inferno, onde a humanidade pecadora paga suas penas.
    A Divina Comédia, como se sabe, é um poema iniciático onde o autor manipula com extraordinária habilidade o simbolismo dos filósofos gnósticos e cabalísticos para compor uma critica genial ás pessoas e ao sistema político e religioso da época.   Ela reflete o que de melhor foi produzido pelo pensamento medieval, tanto no campo da filosofia religiosa, admitida pela Igreja, quanto nas doutrinas gnósticas, por ela condenada.
     Tudo é simbólico nesse grandioso poema. Entrelaçam-se tradições cabalísticas e gnósticas, juntamente com filosofia aristotélica e escolástica, formando um enredo formidável, que só um grande gênio, com qualidades de iniciado, poderia produzir. E no fim fica a pergunta: a humanidade é mesmo uma criação de Deus? Se é, porque ela é tão ruim, que precisa que o próprio Deus tenha que envolver pessoalmente numa briga com o Diabo para salvá-la?
 
O herói de Dan Brown, Robert Langton, é um professor de História em Harvard, e sua especialidade é a interpretação dos símbolos que são criados pelos homens para figurar os arquétipos que representam suas tradições, medos, esperanças, enfim, toda a fauna que habita no inconsciente da humanidade. Céu e Inferno também são arquétipos que representam, um a idéia do infinito prazer e felicidade, e outro a dor e o sofrimento infinitos. Quem é bom, segundo a ótica de quem desenvolveu esses arquétipos, vai para o céu, quem é mau vai para o inferno. Deus e o Diabo brigam nessa rinha para ver quem leva a melhor.
O autor de Inferno manipula com bastante habilidade essa questão ética e moral ao trabalhar o tema da superpopulação mundial, deixando no ar uma questão bastante embaraçosa para os filósofos e cientistas: O que é melhor? Sacrificar uma parte da humanidade ou deixar que ela seja destruída por inteiro?
Esse assunto já havia sido tratado por Thomas Robert Malthus em seu famoso Ensaio Sobre a População, publicado em 1798. Nesse apocalíptico  ensaio, Malthus lançava um pavoroso vaticínio sobre o destino da humanidade, profetizando que ela poderia ser destruída graças à grande capacidade, principalmente da população mais pobre, de por filhos no mundo. Ele dizia que a população crescia em progressão geométrica (2,4,8,16,32...) e os meios de subsistência só aumentava em progressão aritmética (2,4. 6,8, 10...)[1]. Isso, num tempo bastante curto, levaria á um colapso mundial, se a natureza, ou o próprio homem, não tomasse providências para frear a explosão populacional. Nesse sentido, dizia Malthus, as pestes, a fome, a guerra e os cataclismos naturais eram uma forma de deter essa perigosa bomba que o corpo humano, com sua prolífica capacidade de multiplicação, hospeda.
Os cientistas, com suas descobertas na área de produção de alimentos, acabaram afastando para mais longe o pesadelo maltusiano. Os seres humanos também, e principalmente os políticos, com sua proverbial sede de poder e seu instinto predador, também contribuíram para desenganar, por um tempo, as previsões maltusianas, promovendo intermináveis guerras e genocídios pelo mundo afora, evitando que a população mundial crescesse acima das possibilidades que o planeta tem para alimentar tanta gente.
Mas curiosamente, nas últimas décadas, é a própria ciência que trouxe de volta esse pesadelo, com a descoberta de medicamentos que esticam a nossa idade, com o desenvolvimento de métodos e sistemas que aumentam a qualidade de vida, e com a prática da própria filosofia humanista, que coloca a vida como a coisa mais importante a ser preservada. E a própria Igreja (católica, principalmente), com seu combate sistemático á todas as formas não naturais de contracepção, tem contribuído muito para isso, e de uma forma bastante trágica, pois é nos países menos desenvolvidos e mais pobres que a população mais cresce, e de uma forma desordenada.
O romance de Dan Brown toca nessa questão, que hoje é extremamente delicada. Qual será a quantidade de população que a terra pode suportar? Hoje estamos com mais de seis bilhões. No tempo de Malthus ela mal chegava a um bilhão. Os recursos que a terra dispõe são limitados. Boa parte deles, como o petróleo, a água, o ar, não são renováveis. O que acontecerá quando estiverem esgotados? Em Inferno, um cientista maluco, adepto da filosofia chamada Transumanismo, cria um vírus capaz de tornar infértil um terço da humanidade, e assim deter a explosão populacional, que ele acredita, irá destruir a humanidade em futuro bem próximo.
Aliás, o Transumanismo ( cujo simbolo é >H ou H+) é uma filosofia recente, desenvolvida principalmente nos meios acadêmicos que trabalham com medicina genética,  que estuda e incentiva a utilização das descobertas ciêntíficas feitas na área  da biotecnologia, da neurotecnologia e da nanotecnologia, para superar as limitações do homem (intelectuais, físicas e psicológicas), e, assim, poder melhorar a própria condição humana. Em outros termos, criar pessoas mais hábeis, mais inteligentes, mais saudáveis fisicamente e que possam ter vidas mais longas, com qualidade. Isso tudo, como se vê comporta uma discussão ética muito profunda, que o autor aborda muito bem em seu romance. Essa questão se resume numa inquietante pergunta: deve o homem substituir a natureza no processo de geração, seleção e evolução da vida no planeta? Ou, em outros termos? O homem pode substituir Deus nesse processo? Será que chegou a hora de reviver Nietsche e perguntar de novo: Deus morreu?
Dan Brown é um autor polêmico e gosta de abordar assuntos que mexem com o imaginário popular. No Código da Vinci ele explorou a bizarra tese dos jornalistas ingleses Baigent, Leigh e Linconl, que sugeriram um possível envolvimento amoroso entre Jesus e Maria Madalena, que teria gerado uma linhagem real que se estende no tempo e passa por uma série de acontecimentos históricos envolvendo as cruzadas, os cavaleiros templários, a igreja católica, e por aí adiante. No Símbolo Perdido ele mexe com a maçonaria e suas tradições; em Anjos e Demônios ele envolve a Igreja Católica e a comunidade científica numa estranha conspiração. Mas agora, em Inferno, ele toca num problema que realmente exige reflexão. Para onde estamos indo? Qual o futuro da humanidade nesta verdadeira panela de pressão que se tornou o planeta terra? Vale a pena continuarmos procriando? Que espécie de planeta estamos deixando para nossos descendentes?
Dan Brown não se arrisca a dar respostas. O romance termina exatamente quando a OMS –Organização Mundial de Saúde, vai começar a discutir as medidas a serem tomadas para combater o vírus que o cientista maluco espalhou pelo mundo.
Acho que nós mesmos vamos ter que responder á essas questões.        


[1] Na progressão geométrica um número constante(no caso citado é o nº 2) é multiplicado pelo produto das multiplicações enquanto na progressão aritmética essa constante é somada ao produto.  
O INFERNO DE DAN BROWN

João Anatalino
Enviado por João Anatalino em 17/07/2013
Reeditado em 25/07/2013
Código do texto: T4391343
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