Resenha impressionista para "Um rio que vem da Grécia", de Claudio Moreno

Hoje li "Um rio que vem da Grécia", do professor Cláudio Moreno (L&PM, 2004, 110p.).

Bah, é muito bom! São crônicas reflexivas e bem-humoradas, que relacionam historinhas dos mitos gregos com a nossa realidade atual e cotidiana. Desde a chamada 'guerra dos sexos' até 'o objetivo ou o sentido da vida' (a vida, "essa história tão curta da qual somos autor, personagem, leitor" (p.14), e incessante revisor (p.80)), nosso querido profe mostra que temos muito a aprender com os gregos! :-)

Trechos que selecionei:

* p.20: Como notava Vieira, o que sai da boca alheia entra em mim pelo caracol do ouvido, então não é de se espantar que chegue todo retorcido aos meandros do cérebro.

* p.40: Maldição das mulheres: "Viverás para os olhos dos outros, ou não serás ninguém". Os homens apreciam os resultados, mas estremecem, solidários, diante dessa sina terrível.

* p.50: O nosso mundo maluco, com seu sistema impiedoso, que cria desejos para todos, criou milhões de Tântalos que vivem morrendo de sede com a água diante dos olhos.

* p.52: O objetivo da vida não é a felicidade, mas é a própria vida, e qualquer atalho que sigamos só vai nos fazer perder a viagem.

* p.76: Como nos ensina Jorge Luis Borges, "o passado é uma matéria muito, muito maleável".

* p.96: Conheço muitos Sísifos e Danaides que sofrem seus castigos sem perceber seu inferno, que ficariam aterrorizados se alguém anunciasse que iriam repetir eternamente o que estão fazendo, mas mesmo assim continuam, como sonâmbulos.

e a melhor de todas é do Ulisses, claro:

* p.18: Ora, se a vida humana é, como diz a ODISSÉIA, um longo caminho a percorrer na superfície de um mar onde os perigos espreitam, as sereias podem ser entendidas como um apelo terrivelmente sedutor do inconsciente. Muitos se deixam dominar, e são por isso destruídos. Outros sobrevivem, mas surdos e insensíveis, escravizados aos remos. Orfeu opta por enfrentar a música da morte com a sua música da vida, mas isso é para poucos, pois é privilégio dos artistas. Alguns, no entanto, como Ulisses, estão fortemente atados à dura madeira da realidade e podem abrir os ouvidos para a beleza e o mistério desse canto; esses, agora mais sábios, farão a melhor viagem.

Este rio de mitos e sabedoria vem da Grécia até o nosso dia-a-dia!