Um Trem Para a Escuridão

"Às Armas, Cidadãos!"

Um velho provérbio popular afirma que “o verdadeiro cego é aquele que não quer ver”. Falta ao brasileiro achar uma luz no fim do túnel, mas quando o próprio trem está no escuro, o que se pode fazer? A ocasião se torna ridícula quando somente um único cego que viaja em um dos vagões se dá conta do descaso e resolve se insubordinar. Inicia-se então uma revolta contra as sombras que se lançam ao povo. As vítimas: Os assentos do vagão. O motivo: o direito de todo ser humano de viver na claridade, afinal, em pleno século XX, às voltas da eletricidade e da mecanização, é um absurdo viver no escuro – quanto mais viajar na total escuridão.

No conto “Apólogo Brasileiro sem Véu de Alegoria”, o hábil escritor e jornalista Alcântara Machado desafia a razão e põe em xeque a famosa habilidade brasileira de dar “um jeitinho” pra tudo.

Com muito humor e ironia, desnuda sutilmente a alma brasileira: o gosto das massas pela agitação, o bem conhecido “jeitinho brasileiro”, a passividade de um povo pacato, porém, muito barulhento e ambicioso, e a submissão diante da “autoridade”.

Antônio Castilho de Alcântara Machado nasceu a 25 de maio de 1901 na cidade de São Paulo. Formou-se advogado no ano de 1924 pela Faculdade de Direito de São Paulo, onde lecionava seu pai. Aos dezenove anos, tornou-se jornalista, chegando a ocupar o cargo de redator-chefe do Jornal do Comércio. Estreou na literatura ao escrever críticas de peças de teatro . Em 1925 viajou à Europa, onde se inspirou para escrever as crônicas e reportagens que dariam origem a seu primeiro livro, “Pathé-Baby”, publicado em 1926 e contemplado com um prefácio de Oswald de Andrade. Apesar de demonstrar traços marcadamente modernistas, não chegou a participar da Semana de Arte Moderna de 1922. Foi partidário do Movimento Modernista; fundou em 1928, junto com Oswald de Andrade, a Revista de Antropofagia. Juntou-se a Mário de Andrade em 1931 e, juntos, dirigiram mais uma publicação, a Revista Nova. Continuou a exercer a carreira de crítico literário no Rio, onde se candidatou ao cargo de deputado federal. Eleito, sequer chegou a ser empossado, dadas complicações de uma cirurgia no apêndice, que resultaria no seu falecimento, na cidade do Rio de Janeiro, a 14 de Abril de 1935, deixando inacabado o romance “Mana-Maria”. Alcântara Machado escreveu também “Brás, Bexiga e Barra-Funda” além de outras reportagens e contos que foram reunidos nos póstumos “Cavaquinho e Saxofone” e “Contos Avulsos”.