O Feijão e o Sonho

Muitas palavras podem ser usadas para descreverem o clássico o feijão e o sonho, obra prima de Orígenes Lessa. Palavras, contudo, seriam poucas para descrever essa pequena, mas grande obra.

O feijão e o sonho foi descoberto por mim a pouco, numa mesa de livros, que talvez sejam expostos pela biblioteca por serem os livros menos livros, ou então, para enfatizar uma determinada temática. Apesar de pertencer a uma série que foi a minha maior amiga durante toda meu ensino básico e médio – Série Vaga-lume -, essa obra primorosa jamais tinha achegado as minhas mãos, nem tampouco, Orígenes Lessa, seu autor.

Demorei 22, quase 23 anos para lhe descobrir, e quando o descobrir, fiquei boquiaberto. De uma leitura fácil e envolvente, que faz o leitor 'entrar de cabeça' na história, Orígenes consegue o maior feito dos grandes gênios da literatura: fazer com que seu leitor viva cada drama de uma história.

A experiência vivenciada pelo protagonista - o poeta Campos Lara - de o feijão e o sonho é a experiência que todos os que beiram a trilha literária vivenciam: a dificuldade para conquistar seu espaço e sobreviver do seu trabalho. No drama, Campos é um poeta persistente, que mesmo a contragosto de sua companheira – Maria Rosa – e pouco ou nenhum lucro conseguindo com a sua poesia, teima em não abandonar por nenhum outro trabalho 'prático'. Persiste contra as avarias do caminho da poesia, no sonho de imortalizar seu nome pela poesia.

No desenrolar de sua vida Campos Lara passa por diversidades sem tamanho, que aumenta na mesma proporção do crescimento de sua prole. Adversidades que tenta amenizar lecionando, mas logo descobre que não possui talento para professor, além do que, “não conseguia vê a classe como um todo”, dando privilégios de atenção para aqueles que se sobressaiam.

Tenta, para agradar Maria Rosa, trabalhar com seu co-cunhado – Gomes – examinando café, mas em menos de uma semana de trabalho desiste, não se sentia bem com os colegas de trabalho, seu mundo era outro, o mundo da literatura, retorna então para o mundo da poesia, era um mundo sem grande retorno, mas era seu mundo, sua paixão.

Sem muito sucesso na poesia, começa a escrever romances, trabalhos que eleva seu nome a conquistar o tão sonhado mundo literário. Mas, se o seu nome cresce em grandes proporções, o conforto de sua família não acompanha tal crescimento, ainda é precário.

Trinta anos se passa Campas Lara, que escreve incansavelmente, tornara-se nacionalmente conhecido. As portas se abrem, e em todos os lugares que vai, jornais o chamam para trabalharem em suas redações, as editoras o disputam. Porém, se antes Lara tinha de enfrenta a obscuridade, agora, por ser considerado um ‘dinossauro’ da literatura, era debatido com fúria pelos novos escritores.

Era uma nova leva de escritores, desejosos por conquistarem seus próprios espaços; e para conquistarem seus próprios espaços, com suas idéias ‘revolucionárias’, tinha de destruir os que já estavam no cenário. E Campos Lara era mais um que devia ser destruído, e é o que a nova leva de literatos fazem, destroem-no. É o seu fim!...

Só então descobre sua família. Tarde demais para essa descoberta. Seus filhos crescidos na miséria e no esquecimento do pai, não lhe reconhecem. Lara se vê obrigado a reconhecer que Maria Rosa tinha razão. Devia ter esquecido a literatura e se dedicado a algo prático, como o co-cunhado Gomes e não deseja o mesmo fim dele para nenhum dos filhos.

Um dia, por acaso, entra no quarto de Joãozinho, seu filho, para o qual sonhara que fosse também poeta e vê seu grande interesse pela literatura, mas nada fala, apenas observa em silêncio. Poucos dias depois, o silêncio é quebrado, por Joãozinho, apelido de infância, que lhe mostra uma folha escrita a bico de pena, quer a aprovação do pai, é uma poesia escrita pelo próprio filho.

Grande descoberta! João era também um poeta como ele. Não sabe se ri ou chora ao pensar nas grandes dificuldades que o filho deveria de passar para depois ser reconhecido, vindo a seguir, se combatido e jogado ao esquecimento.

Fica entre o sonho de ter no filho um grande poeta, passando por inúmeras dificuldades, e a realidade de tê-lo em algo prático, que pudesse ter como manter uma família. Entre o feijão – que pouco tivera em seus pratos – e o sonho, de ter a sua literatura reconhecida.

O Feijão e o Sonho é enfim, um reflexo das dificuldades aonde se vira as costas para a literatura, em que para ser reconhecido, o literato sucumbe-se, na maior parte das vezes, a indigência.

Israel Goulart
Enviado por Israel Goulart em 07/06/2007
Reeditado em 07/06/2007
Código do texto: T516870
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