Resenha - Contos para uma Noite Fria - Bruno Anselmi Matangrano
Já faz um tempo que eu comprei o livro, mas o clima estava por demais quente e a minha lista (pilha) de leitura muito alta, o que causou a coincidência de começar a lê-lo justamente nestes últimos dias, os quais estão agradáveis para os chás, os vinhos, o conhaque e um bom expresso. Se você procura um companheiro para uma noite fria, acredito que esse volume lhe será perfeito.
Matangrano é muito conhecido dos autores brasileiros como organizador de antologias, esse é o primeiro lançamento estampando o seu nome na capa como escritor e não organizador.
O livro chama atenção, num primeiro momento, pela parte gráfica, que ficou a cargo de Marcelo Amado e sua empresa Página 42; ilustrado pela jovem e muito talentosa Dandi.
O livro se inicia com um Prefácio e uma Introdução, e então somos levados em uma viagem a um mundo de pesadelo com o primeiro conto, O Viajante.
Esse primeiro conto não me agradou, confesso que esperava mais do conto de abertura. É um conto comum, ordinário, que parece fora do contexto do restante do livro, que tem uma qualidade muito superior a esse. Os escritores todos tem o péssimo hábito de se apegar a coisas do passado, e talvez seja esse o caso desse conto, não se sabe.
Passemos pelo patinho feio e aí entremos em um reino do futuro onde tudo está perdido, e a esperança foi queimada em uma fogueira. Ao ler essa distopia, esse conto muito bem escrito, de estilo rico e elegante, tive uma sensação de déja-vú que seguiu no restante do volume. O livro me remeteu por diversas vezes ao Rei de Amarelo de Robert W. Chambers, não que haja algo de cópia ou homenagem ou o que seja. Mas suas páginas estão impregnadas pelo mesmo espírito, a mesma atmosfera de sonho, de fantástico e de terrível.
No livro de Chambers há uma distopia também, uma história onde a humanidade se encontrou em um estado de espírito tão terrível que foram implantadas nas praças Câmaras de Suicídio. No conto O Germe da Imaginação não há câmaras de suicídio, mas com certeza se houvessem o protagonista agradeceria. Nesse conto vemos uma clara crítica política e um inconformismo com a atual situação política brasileira, assim como uma materialização de um temor que vêm ganhando fôlego de paranoia em boa parcela das pessoas. Essa é uma das funções da fantasia e foi muito bem explorada pelo autor.
No Rei de Amarelo também encontramos estátuas alvas de mármore, como as que se encontram no próximo conto de Bruno Estátuas. Embora o elemento esteja aí, os contos são muito distintos, esse não é filho daquele, mas foi uma coincidência que me chamou a atenção. O clima de pesadelo nos pega eficazmente.
Em Gravidade às Avessas nos damos conta da razão de ser da capa e permanecemos nessa atmosfera de sonho que o livro mantém durante toda a sua leitura.
A Melancolia do Piano se inicia com uma sugestão: Para ser lido ao som de “Trois Gymnopédies” (1888) de Erik Satie. Realmente a leitura ao som da música lânguida e soturna causa um impacto maior e é bem interessante uma proposta assim em tempos de multimídia.
O próximo conto O Futuro da Humanidade ecoa o ânimo do ano de 2012 e da paranoia de destruição total que gerou tantas e tantas antologias com o mote fim dos tempos. Mas o texto de Matangrano surpreende o leitor com uma carga de inteligência e mistério.
Encontro às Escuras e A Donzela e o Rubi são contos góticos. Com certeza são contos para ler em uma noite fria.
Do gótico ao onírico Mise en Abyme nos remete de novo ao tema do sono e dos sonhos. A exploração do misterioso e da loucura segue em Morro dos Aflitos e Entre o Tempo e o Espaço. Este último que poderia se chamar O Viajante - parte II, pois é a continuação do conto que não me agradou e que abre a antologia. Mas esse título O Viajante - parte II seria um título muito Pink Floyd, e isso é um livro não um disco de rock. Mas seguindo a analogia com o Pink Floyd, o efeito de Entre o Tempo e o Espaço é o mesmo de Another Brick in the Wall (part II), pois ao ouvir esta última passamos a gostar de Another Brick in the Wall (part I).
Se você se interessou pelo livro, encomende o seu o mais rápido possível, para ler antes do verão, de preferência em uma noite fria.
Mauricio R B Campos
Enviado por Mauricio R B Campos em 25/05/2015
Reeditado em 25/05/2015
Código do texto: T5254866
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