Anos 50 revoluciona Brasil

“Crônica de uma Namorada” é um romance da Zélia Gattai Amado. A autora sempre gostou de contar histórias à família e aos amigos. Em 1979 começou a transcrever suas histórias em livros como o ‘Anarquistas, graças a Deus’. Daí foi um passo para outros como: ‘Um chapéu para viagem’ – 1982 – ‘ Senhora Dona do Baile’ – 1984 – e ‘Chão de Meninos’ – 1992. Passou para um segundo momento literário em sua vida, onde inventava também as histórias. São exemplos: Pipistrelo das mil cores – 1989 – ‘O segredo da Rua 18’ – 1991. Seu primeiro romance, em 1995, vem comemorar seus 50 anos de união com Jorge Amado.

Nesse romance, Zélia Gattai une ficção e realidade, retratando a sociedade paulistana extasiada com o advento da televisão. Fala-se mais do desabrochar da vida de uma adolescente que, propriamente, da televisão. No entanto, dá para perceber muito bem o que significou para aquelas pessoas poderem assistir uma programação de televisão. Como só existia um televisor em cada casa, era preciso conciliar os gostos e deixar a autoridade máxima determinar o que se poderia assistir. A ânsia da jovem de ser uma namorada perpassa todo o livro, causando certa inquietação no leitor, que sente-se convidado a caminhar em busca de uma solução.

O que se percebe nos dias de hoje é que o televisor ocupou o lugar central na sala das famílias. Antes dela, a família era o centro e tudo se voltava para cada um dos seus membros, ou até para as famílias vizinhas mais próximas. Os móveis eram colocados de tal forma que favorecesse o diálogo e convivência. Com o advento desta mídia, a disposição da mobília se modificou para atender a todos. É isso que retrata José Teixeira Coelho Netto ao afirmar: “O que acontece com a casa pós televisão? A televisão fica no centro ou num canto, e toda a organização do espaço, quando possível, é feita de modo que a convergência se faça para ela. Neste momento, tudo aquilo que no passado se quis deixar de fora, passa para dentro. A invasão do público na esfera do privado é enorme.”

Voltando à obra, vê-se sua divisão em três partes: ‘A menina’, ‘A mocinha’ e ‘A namorada’. Na primeira parte, é colocada a questão da televisão como uma ameaça à saúde do povo... até que essa família ganhe uma televisão de presente – o pai havia casado após a morte da primeira mulher e sua noiva ganhara a televisão. Os programas jornalísticos destacados e assistidos pelo chefe da família são: o Repórter Esso, o Mappin Movietone e o Imagens do Dia. ‘O céu é o limite’ era o programa preferido do restante da família. Também gostavam de Mazzaropi, da ‘Hora da Peneira’. Este último foi cobiçado por uma das personagens que vibra a história inteira com ele.

De acordo, ainda, com José Teixeira Coelho Netto, a televisão poderia ser um elo de contato entre a individualidade e a sociedade, de maneira eficaz. Aliás, ela pode fazer isto. No entanto, ao longo da história, ela vem perdendo essa missão de mediadora na formação individual dos cidadãos, assumindo, apenas, um papel de enfoque superficial do individual, familiar, grupal sem evidenciar a localização da fonte, de maneira geral.

Na Segunda parte, a vibração é por causa do primeiro jogo de futebol do Brasil, na Copa do Mundo, noticiado pela televisão. Também nesse momento do livro, é colocado a questão dos bastidores de um programa de auditório. Aqui, percebe-se também, a participação receptiva dos telespectadores ao assistirem os programas e darem sua opinião. Evidencia-se, assim, o lado crítico de quem assiste. Não é um alienado coitado na sociedade mas alguém capaz de escolher o que lhe agrada. Já na terceira parte, a namorada vai assumindo ‘ar de maturidade’ e lutando por sua independência e objetivos com mais serenidade.

Do ponto de vista literário, a obra é interessante por sua linguagem simples e ousada para a época. É atrativa e enfoca com muita fidelidade os reais conflitos de uma adolescente. No entanto, do ponto de vista crítico, pensei que fosse uma obra mais profunda a respeito da história da televisão e seus personagens. Visto que não é, fica em aberto a reflexão pessoal de cada leitor e receptor diante do livro, da história contada e das futuras recepções de cada telespectador.