A fé e a razão como alicerces do ser humano

Com o avanço do racionalismo no século XX, surgem muitos questionamentos, no que se refere ao estudo entre fé e razão, julgando assim, não ter nenhuma ligação entre ambos. Nisso, o Papa João Paulo II publica a encíclica Fides et Ratio, e de uma forma sistemática, expõem o vínculo entre o conhecimento racional e o conteúdo da fé. Assim, o Santo Padre salienta a necessidade que um tem para o outro, enaltecendo seus benefícios e fazendo uma minuciosa compreensão desses entendimentos.

No decorrer da história, o ser humano depara-se com dúvidas que lhe é própria de sua existência: Quem sou eu? De onde venho e para onde vou? Por que existe o mal? O que é que existirá depois da vida? , essas são perguntas que o homem em sua integridade, busca encontrar respostas que esclareçam suas indagações. Dando inicio á sua encíclica, o Pontífice explica a partir do caminho racional elaborado ao longo dos séculos, no qual o homem formou baseado em sua autoconsciência, pois, ao passo que o homem procura compreender o mundo á sua volta, vai conhecendo a si próprio, de forma que desenvolve nele um sentido iminente das coisas e de sua vida.

No campo filosófico, a razão é um forte instrumento que leva a humanidade sustentar seus ideais, e é predominante para a busca da verdade, a verdade de todas as coisas, busca compreender o ser das coisas. O Santo Padre faz uma forte crítica à filosofia moderna, que se concentrou sobre si mesma, e perdeu o “caminho” da investigação da verdade do ser.

Neste âmbito, a Igreja não deve está ausente, ela em sua missão deve encaminhar a todos ao conhecimento da verdade, Mas qual verdade? Nessa perspectiva o Santo Padre diz:

"Desde que recebeu, no mistério Pascal, o dom da verdade última sobre a vida do homem, ela (a Igreja) fez-se peregrina pelas estradas do mundo, para anunciar que Jesus Cristo é o caminho, a verdade e a vida. (Jo 14,6)"

A Igreja com seu papel fundamental preza os serviços que ela exerce na sociedade, realizando assim a diaconia da verdade. Esta missão que tem como centro a verdade se dá através da submissão a Cristo que é a Verdade. Nesta concepção, tem o propósito de animar a comunidade fiel, de modo que todos participem em um objetivo comunitário, comprometendo-se em transmitir afirmações que tenham como verdade única, uma vez que, quando o homem sente um ardente desejo de conhecer, organiza respostas para aproximar-se da verdade plena.

O Papa fala de Jesus como a revelação do Pai, comunicando seu anúncio que está alicerçado em Deus. Dessa maneira, Deus O deixa conhecer livremente para que a humanidade sustentem as verdades inerentes á sua existência. Mas toda nossa compreensão de Deus é insuficiente, por não podermos alcançar tamanha sabedoria, é sempre um conhecimento amplo e complexo. Essa aspiração do saber é de caráter humano, que constrói a partir de sua insistência em conhecer. Em suma, o homem alcança a verdade através da razão, razão essa que é iluminada pela fé, descobrindo o sentido de tudo e particularmente da sua própria existência.

Por ser a fé um mistério, no qual em Jesus que revela o rosto do Pai, a razão através da vontade humana, tenta esclarecer com uma compreensão coerente os diversos fatores existenciais e espirituais que surgem através dos tempos. Nesta percepção, deve-se também o fato do ser humano ter a liberdade de elaborar argumentos, que possa fundamentar sua fé. Por isso, o Santo Padre leva-nos a entender que para poder alcançar o conhecimento da fé, é necessário, portanto, o homem agir conforme a sua liberdade, pois sua “inteligência e vontade põem em ação o melhor da sua natureza espiritual” .

O professor Maurílio José de Oliveira Camello em seu artigo ‘Sobre a mente’ de Santo Tomás de Aquino situa seu ponto de vista no limiar entre razão e fé, afirmando que:

"Na medida em que inclui memória, inteligência e vontade, a mente é uma potência ou conjunto potencial da alma, que, aliás, tem outras potências. Dado que a parte mais elevada da mente é o intelecto, é primariamente nele que está a imagem da Trindade."

Assim, defende que no intelecto já encontra-se a imagem da Trindade, o Deus uno e Trino. A fé demanda, exige, requer, que seu principal objeto seja entendido, a razão, o homem ao concluir seu questionamento admite que é preciso aceitar aquilo que é estabelecido pela fé. A teologia contribui com o pensamento filosófico no sentido de purificá-la, uma vez que o raciocínio não está livre de falhas.

Em vista disso, busquemos a verdade nos aprofundando em um conhecimento que estruture e dê um sentido verdadeiro para o nosso existir. Usemos o instrumento da razão para compreender a perspectiva da fé, não contentar-se com a superficialidade, mas que todo o entendimento possa ser de enorme valor, direcionando, sobretudo o meu agir e a minha relação com o próximo. Que a razão seja um recurso que leve a todos uma compreensão melhor da fé. Acredito numa relação entre fé e razão cujo seu objetivo principal seja compreender e dar respostas concretas, que uma esteja a serviço da outra.

No entanto, a fé revela os mistérios e o intelecto nos oferece os meios racionais, tornando-se acessível para a inteligência humana. Deste modo, a encíclica do Papa João Paulo II faz-nos questionar, mas acima de tudo, internalizar estas duas dimensões que caracterizam a existência da humanidade, ou como ele prefere dizer-nos “as duas asas pelas quais o espírito humano se eleva para a compreensão da verdade”.