Plantando ancestrais no presente

O Prêmio Malê de Literatura 2019, organizado pela carioca Malê Editora, pretendia selecionar autores e autoras negras para compor uma coletânea de contos. Especializada em literatura negra, vi no concurso uma oportunidade de publicar algo que contivesse algumas das minhas implicações. Quando saiu o resultado, quase não aguentei a emoção, havia sido um dos 11 escritores selecionados.

O livro foi organizado pelo Vagner Amaro, que também é um dos diretores da Malê. Assertivo em suas escolhas, e zeloso em sua edição, reuniu contos que ora se inserem nos traços biográficos, ora perfazem o cotidiano de homens e mulheres negras do Brasil. Para maior alegria da minha parte, vi que o livro continha o mesmo nome título do meu conto: Um pé de ancestralidade.

No meu conto, me baseio em fatos reais, o que torna a trama até mais aterradora do que eu desejaria. Vô Ilza é uma ialorixá, filha de Iroko que se vê impotente perante a sanha do progresso que não respeita as suas crenças. A história trata da intolerância religiosa, um dos mais graves problemas que assola o nosso país. Que esse tipo de fato, permaneça apenas como uma ficção no futuro.

São várias as escritoras selecionadas, trazendo em muitos momentos as escrevivências de mulheres negras e pardas. A maior parte do autores e autoras são da área de humanas, o que dá uma dimensão de alteridade ainda maior. Suas experiências preenchem as páginas, seja as vividas ou ancestralizadas. Dentre esses escritores, nordestinos assim como eu, descentralizando as narrativas.

Bell Puã, escritora e rapper, parodia uma música popular em Mama África é mar solteira. Traz os dilemas de uma mãe solteira, ou dita solo, tudo de forma poética e visceral. Casas-grandes e consultórios, de Antonio Ferreira, é um quadro em constante exposição do racismo. Essa forma de opressão cancerígena que não encontra barreiras em nenhum lugar do mundo.

A Revolta, da autora Bioncinha do Brasil, narra os desejos e a impermanência, o leitor ou leitora pode preencher sua mente com a imagem que quiser de Revolta. Melancolia ensolarada do autor Diego Soares, retrata a existência bamboleante de um alcoólatra. Dêner B. Lopes em Conto de Fazya, se utiliza da metalinguagem para quebrar as expectativas dos leitores com o que chamo de brusquidão narrativa.

Minha conterrânea Yasmin Morais apresenta Dona Maria de Lourdes, representação de mulheres ao mesmo tempo, ser reencontro e ancestral presente. Thayná Alves em sua Vida prisão desvela a imagem da marginalização da juventude negra, sofrendo com o desamparo e a fome. Saída quatro de Marilia Pereira é um soco no estômago da nossa sociedade, quando aos olhos dela, o negro é o primeiro culpado.

Cartão de visita, escrito por Domingos Alves de Almeida, conta a história de Akylloan, jovem negro beneficiado pelas políticas públicas, mas que mesmo assim tem suas dificuldades a enfrentar. Vive em meio as feridas do Brasil, sempre expostas. Por fim, temos Zainne Lima da Silva, em Cognitivo comportamental, a autora vai narrando a história de uma mulher parda enfrentando as dores e o prazer de sua libido.

O livro tem 64 páginas, os erros de revisão são quase inexistentes. Só achei estranho no conto da Zainne os diálogos começarem com letras minúsculas e o excesso de reticências. A fonte é muito gostosa de ler e está em bom tamanho. Capa e contracapa colorida e ilustrada. O livro tem orelhas com foto e nomes dos autores e autoras, além de conter um espaço na obra para a biografia de todos nós.

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Caliel Alves
Enviado por Caliel Alves em 03/01/2022
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