Um detetive oculto

Terminei no último sábado (05.02.2022) o livro "Carnacki: Detetive do oculto", de Willian Hope Hodgson, segundo volume da coleção "Clássicos de visagens e malassombro", publicado pela Editora Corvus.

Fruto de um finaciamento coletivo bem-sucedido via Catarse, o volume trouxe pela primeira vez ao Brasil, numa edição única, os primeiros seis contos de Hodgson com seu detetive Carnacki. Embora valha destacar que não há muitos outros mais além destes.

Considerado uma referência no gênero de terror, lhe sendo atribuído o papel de influência em famosos, como H. P. Lovecraft, o livro traz contos bem escritos e criativos, em que o detetive Carnacki investiga alegados casos de assombrações.

As histórias são contadas sempre em primeira pessoa, pelo próprio Carnacki, em sua casa, para os mesmos colegas, convidados para jantares que ocorrem imediatamente antes dos relatos.

Eu gostei da qualidade do texto e da criatividade das assombrações apresentadas, entretanto, concluí que a opção de Hodgson pela narração em primeira pessoa, ainda que muito funcional para criar a atmosfera de mistério e fantasmagoria, para fins de apresentar uma atuação detetivesca, não funciona assim tão bem.

O fato de Carnaki agir sempre sozinho acabou destacando a importância do artifício narrativo do parceiro do detetive (o conhecido "caro Watson") no desenvolvido e apresentação do caso ao leitor. Um recurso que permite a apresentação, pouco a pouco, de explicações, análises, outros pontos de vista e a discussões sobre conclusões e teorias, enquanto ocorre o aprofundamento analítico de um caso sob escrutínio sistemático de um investigador.Uma forma também de se ir apresentando indícios, provas e permitir que o leitor crie sua própria teoria para solucionar o caso.

Inclusive, fosse eu Hodgson, teria utilizado os colegas convidados a ouvir os casos, como os parceiros. Sendo vários, Carnacki poderia levar a cada história aquele deles que mais se adequasse a cada cenário, permitindo que as histórias fossem mais bem desenvolvidas e podendo contar em cada caso com diferentes personalidades de parceiro.

No geral, o livro é agradável, leve (mesmo sendo um terror) e de rápida leitura. Apresentando um detetive que lembra, mesmo que indiretamente, um pouco os trabalhos dos Irmãos Winchester, da série de Supernatural.

Vale destacar que há uma grande obra adicional, em pastiche, feita por fãs do autor em que estes trazem outras histórias de Carnacki. Um resultado natural do personagem citar dezenas de casos para os quais não há contos oficiais. O autor, basicamente, convidou a todos para participar de seu universo trazendo contribuições.

A seguir, minha opinião com relação a cada conto (conforme registrei no dia da leitura):

"A passagem do monstro"

É bem escrito, entretanto, esteve mais para um relato de terror do que de detetive. Na "investigação" Carnacki tomou alguns cuidados, mas nada de excepcional.

"A casa entre os loureiros"

Termina com uma solução aceitável e contrária às expectativas, o que é uma boa surpresa. Ainda assim, a solução se dá por descrição de observação direta e não por uma dedução detetivesca típica a um Sherlock Holmes, por exemplo.

"O quarto sibilante".

Desta vez, Carnacki usou mais recursos detetivescos, mas ainda sinto que tem pouco controle sobre o caso, agindo de forma reativa.

"O quarto sibilante"

Apresenta uma abordagem interessante. Mas Carnacki é bem reativo e sua solução para o problema não é das mais práticas.

"O cavalo do invisível"

Uma história parcialmente de terror. Um caso em que há a combinação de outro mundo e um pilatra deste.

"O investigador da última casa"

Segue receita similar ao anterior.

"A coisa invisível".

Antes tarde do que nunca, Carnacki finalmente utiliza um processo mais dedutivo e observativo para elucidar seu caso. Sendo menos reativo e mais proativo.

Pena ser o último conto oficial do autor, pelo menos dos publicados em vida.

Hora de ver se os fãs superam ou não o mestre, por meio dos pastiches. Já adquiri os livros "No 472 CHEYNE WALK: CARNACKI, THE UNTOLD STORIES", de A. F. (Chico) Kidd, Rick Kennett e "CARNACKI: The New Adventures", de Sam Gafford. Fiquei tentado, inclusive, a puxando como inspiração algum dos títulos destes casos citados en passant pelo personagem, escrever meu próprio pastiche. Veremos.